por Luis Fernando Verissimo

A anti-Palocci

Dizem que a Dilma mandou ligar para a casa do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e da sua mulher Gleisi para fazer o convite para chefiar sua Casa Civil. Qual dos dois seria o convidado?

— O que atender — disse Dilma.
Outros dizem que a decisão já estava tomada. Paulo Bernardo era cotado para ser o escolhido, mas tinha a contagem de cromossomos errada. Dilma queria alguém o mais diferente do Palocci possível. Ou seja, loira e bonitinha. Paulo Bernardo é um articulador político experimentado e orientará sua mulher nessa área, o que significa que algumas das mais importantes confabulações da República serão feitas na mesa de café do casal. Frases como “Passe o pão” poderão adquirir significados até agora insuspeitados.
Cresce a presença feminina no gabinete da Dilma e é possível que até o fim do seu mandato só sobre, como homem, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, que passaria a participar das reuniões do Ministério em uniforme de campanha, por precaução.
COMPARAÇÕES
Uma das vantagens de envelhecer (ainda estou procurando as outras) é que cresce, por assim dizer, o nosso estoque de termos de comparação. Por exemplo: quem acompanha o futebol há muito tempo tem mais parâmetros para concordar ou não que Ronaldo foi o maior jogador brasileiro de todos os tempos, depois do Pelé.
O que não dá para aceitar é que tirem o Pelé do páreo, alegando que o futebol do seu tempo era outro e que história antiga não vale, como fazem certos exagerados. Está certo, para quem não o viu jogar, o Pelé já deixou de ser história e virou mito — mesmo que um mito bem documentado — e os mitos não costumam servir de parâmetros para mortais.
Eu vi jogar o Pelé (não, não é verdade que também vi o Friedenreich) e posso atestar que: 
1. ele já pegou o futebol duro, de pegada no calcanhar, que enfrentam os atacantes de hoje;
2. o mito corresponde à realidade do que ele fazia em campo; 
3. ele era mais completo do que o Ronaldo.
Nada contra as homenagens ao Ronaldo, um centroavante extraordinário que merece todas as festas. Mas sem comparações impensadas.

Para minha namoradamada

Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?
Fernando Pessoa

Os protestos começaram

Não demorou muito para aparecer o reverso da medalha. Os aeroviários estão em greve protestando contra a privatização dos aeroportos do Rio, São Paulo e Brasília. Mais do que isso, reagindo á hipótese da privatização de outros aeroportos. Alertam para a primeira conseqüência, demissões em massa, assim que empresas privadas assumirem. A fixação exclusiva no lucro sacrificará o sentido social do trabalho, além, é claro, de exigir dos que conservarem os  empregos esforço acima de sua capacidade. Vão transformar os aeroportos privatizados em feiras livres,  abrindo espaços inexistentes para todo tipo  de atividades comerciais, prejudicando os  passageiros já tratados como gado pela falta de instalações condizentes.

O governo prometeu  que não estenderia as privatizações a outros aeroportos, mas garantir, ninguém garante...
por Carlos Chagas

Estragos na tucanagem, lições para o PT

O tucanato paulista privatizou a principal empresa fornecedora de energia elétrica do Estado há 23 anos (hoje AES Eletropaulo). Uma cláusula do contrato previa que os novos donos teriam dez anos para realizar investimentos e agregar mais 15% (400 MW) à capacidade de fornecimento. O prazo venceu em 2007. O governador era José Serra. Ungido pela mídia por supostos atributos de ‘grande gestor’, como o nome mais qualificado para suceder o Presidente Lula — opinião diversa da maioria do eleitorado como se viu — Serra não cobrou, não fiscalizou, não tomou nenhuma providência diante da ruptura de contrato num serviço essencial. As interrupções de energia tem sido cada vez mais freqüentes em SP nos últimos anos. Cada vez mais lenta tem se mostrado a normalização do serviço. Reportagem da Folha deste sábado — que naturalmente omite o nome do candidato da derrota conservadora em 2010 – informa que após a última pane, na 3º feira, a retomada do fornecimento demorou 60 horas em alguns locais. O sucessor de Serra e seu desafeto, Geraldo Alckmin, garante que agora vai ‘investigar’ as razões do colapso em marcha. No momento em que o governo federal oficializa a concessão de importantes aeroportos nacionais à iniciativa privada — em nome da eficiência e porque o Estado não dispõe de R$ 5 bi a R$ 6 bi para investir no setor, embora tenha reservado R$ 57 bi aos rentistas da dívida pública no 1º quadrimestre – o colapso elétrico em SP encerra lições oportunas. E, convenhamos, ecumênicas.

Oração

O que a Bíblia fala sobre a oração

Análises equivocadas sobre ida de Ideli para Relações Institucionais

Não é verdade que a indicação da ex-senadora Ideli Salvatti como ministra das Relações Institucionais desagrada ou seria contra a vontade do PT. Nem o diretório e nem a comissão executiva nacionais, muito menos o presidente nacional do partido, deputado Rui Falcão, apoiaram qualquer nome legitimamente examinado ou proposto por lideranças, parlamentares, correntes e setores do PT, seja o do líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), sejam outros que surgiram.
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Pelo contrário, tenho certeza absoluta de que a ministra Ideli Salvatti, militante e dirigente do PT, tem e terá o apoio de todo o partido, de sua direção e militância, para exercer o cargo e as responsabilidades que a presidenta Dilma Rousseff lhe atribuiu.

Mais do que isso: Ideli tem experiência e capacidade para o cargo. Na Assembléia Legislativa de Santa Catarina e no Senado ela já as comprovou como líder do PT e depois do governo. Deu conta do recado tranquila e eficientemente. Perguntem ao presidente Lula, aos senadores do PT e aos nossos aliados, com quem ela tem uma relação excelente.
Preconceito

Fora o preconceito e as avaliações - que, na verdade, são mais desejos - que cercam a ida da ministra para as Relações Institucionais, é bom lembrar que o atual ministro da Saúde, Alexandre Padilha, não era deputado ou senador, não era dirigente nacional do PT e nunca exerceu cargos eletivos.

Foi, no entanto, um dos melhores ministros da Articulação Política quando lhe coube a missão de suceder nomes como os de Aldo Rabelo, Tarso Genro, Jaques Wagner, Mares Guia e José Múcio, o que não era fácil. Mas, ele deu conta do recado. Assim será com Ideli Salvatti, forjada nas lutas sindicais, políticas, eleitorais, e como dirigente e parlamentar do PT.

Como dirigente nacional do PT e senadora líder de nossa bancada e do governo, ela já deu provas de que sabe e muito bem lidar com crises, divisões, divergência, de que é capaz de articular e buscar consensos, dialogar com a oposição e unificar a base.

Ideli conhece o governo e suas propostas


A nova ministra conhece o governo e suas propostas. Além disso, terá o apoio dos líderes do governo na Câmara e no Senado e dos líderes dos partidos da base governista começando pela bancada do PT na Câmara, que seguramente saberá tirar lições da atual crise para se unificar em torno da nova ministra.

Este é o desejo da militância e da direção nacional petista. E mais do que isso, é uma exigência para o apoio que a  nossa presidenta espera de nós do PT.

Sintomas de hiperpresidencialismo

Os fatos políticos recentes podem indicar que estamos caminhando perigosamente para um sistema político que se aproxima muito do hiperpresidencialismo, caracterizado pelo excesso de poderes concedidos ao Executivo, o que pode levar à deterioração da democracia, ou até mesmo à sua destruição.
Esse fenômeno pós-moderno está se alastrando pela América Latina e atinge algumas partes do mundo, como a Rússia.
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de aceitar que a decisão sobre a extradição do ex-terrorista italiano Cesare Batistti coubesse ao presidente Lula, mesmo sem que os termos do tratado fossem obedecidos, na prática deu poderes discricionários ao chefe do Executivo, poderes que já haviam sido negados em reunião anterior do mesmo Supremo.
Também a escolha das principais assessoras diretas da Presidência ter recaído sobre políticas pouco afeitas à negociação, que assumem como principal tarefa fazer com que a vontade do Executivo seja acatada pelo Legislativo, indica uma tentativa de utilizar a maioria esmagadora que forma a base parlamentar do governo para, simplesmente, referendar a vontade do Executivo.
O sistema presidencialista oferece ao chefe do Executivo muitas alternativas legais para contornar o Poder Legislativo, e os presidentes têm mais flexibilidade para montar seus ministérios.
Enquanto no parlamentarismo os governos são organizados essencialmente pelos componentes dos partidos que formam sua base parlamentar, no presidencialismo é possível escolher ministros de acordo com critérios próprios, e até mesmo levando em conta apenas as relações pessoais.
Por isso, diz-se que uma das virtudes que devem ser evitadas, ao se montar uma equipe de governo, quando se deseja governar democraticamente, é, paradoxalmente, a lealdade do escolhido.
Essa lealdade leva a que pessoas não qualificadas, mas leais ao presidente da República, assumam postos importantes no governo com a única certeza de que não se voltarão contra quem os escolheu.
Há quem defina o hiperpresidencialismo como uma ditadura disfarçada, cuja fronteira para a ditadura de fato é a liberdade de imprensa, que geralmente não existe em países que já adotam esse sistema de governo, como na Venezuela e na Rússia.
A partir do caso da Rússia, os estudiosos dos sistemas de governo dizem que a fragmentação partidária pode levar a que o Executivo estimule uma maioria circunstancial que favoreça a aprovação de sistemas autoritários.
O mesmo fenômeno que acontece na América Latina, com governos se utilizando dos mecanismos democráticos para aprovar leis que lhes conferem superpoderes, colocando o Executivo acima dos outros poderes, fazendo com que o sistema democrático perca sua característica de contrapesos.
Foi o que aconteceu na sessão em que o Supremo acatou uma decisão presidencial claramente fora dos parâmetros legais que regem a extradição pelo tratado assinado entre Itália e Brasil.
Na avaliação do ministro do Supremo Gilmar Mendes, está se criando um modelo de presidencialismo imperial, com o STF submetido à Presidência da República.
Baseando-se no tratado de extradição, como determinou o Supremo, a Advocacia Geral da União (AGU) utilizou, para sustentar a decisão de manter Battisti no país, o seu artigo 3, que diz que é suficiente o presidente ter "razões ponderáveis para supor que a pessoa reclamada será submetida a atos de perseguição e discriminação por motivo de raça, religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política, condição social ou pessoal; ou que sua situação possa ser agravada por um dos elementos antes mencionados".
O refúgio concedido inicialmente pelo Ministério da Justiça com base nessa mesma argumentação fora indeferido pelo STF, que, num primeiro julgamento, decidiu que não havia perseguição política nem outra justificativa para sua concessão.
A palavra-chave no julgamento foi e continua sendo "discricionário". Os ministros que votaram a favor de que cabia ao presidente da República a decisão final sobre a extradição consideraram que ele tinha poderes "discricionários" para decidir.
Dias depois, questionado pelo governo italiano por uma questão de ordem, o então ministro Eros Grau admitiu que seu voto não dava poderes "discricionários" ao presidente da República, mas limitava sua decisão ao tratado de extradição existente.
Ao insistir em não extraditar Battisti alegando as mesmas razões que o Supremo já havia rejeitado, o então presidente Lula agiu como se tivesse poderes discricionários, e, ao aceitar sua decisão esta semana, o Supremo chancelou esse entendimento, que fora rejeitado.
Outro assunto diretamente ligado à autonomia dos poderes do Estado deve ser discutido esta semana: a proposta do senador Aécio Neves, que altera a apreciação das medidas provisórias pelo Congresso, subordinando na prática as medidas provisórias — que se transformaram em um instrumento do hiperpresidencialismo — à decisão do Congresso.
A ideia central da proposta é que as medidas provisórias somente terão força de lei depois de serem consideradas admitidas pelo Congresso Nacional, dentro dos critérios de relevância e urgência hoje existentes.
Caso contrário, a matéria passaria automaticamente a tramitar como projeto de lei em regime de urgência constitucional.
A admissibilidade será apreciada por comissão mista permanente de deputados e senadores, em processo sumário, com recurso para o plenário do Congresso ou, nos períodos de recesso, pela Comissão Representativa.
A presidente Dilma já se manifestou contrária à medida, orientando sua aliança partidária a rejeitá-la. Singelamente, teria comentado: "Logo na minha vez querem me tirar um instrumento fundamental de governabilidade".
Há, no entanto, na própria base governista, uma tendência a aprovar a mudança, que dá ao Congresso maior autonomia.
Será mais uma oportunidade para estancar o avanço do Executivo sobre o Legislativo, ou confirmar nossa caminhada rumo ao hiperpresidencialismo.
Merval Pereira