Análise internacional, de Ciro Gomes

Sudetos, Ferdinandos e Crimeia


Uma ordem internacional multipolar, na qual a Rússia e a China ombreiam-se com os EUA e a Europa, pode ser a consequência positiva deste momento
A ordem internacional vigente em pleno século XXI ainda é, a despeito de todo o avanço do ser humano, assentada na força e na violência. Os valores do direito, da Justiça, da solução pacífica de conflitos e do respeito à autodeterminação dos povos são ainda muito mais retórica do que prática efetiva no concerto mundial. É lamentável constatar tal realidade, mas imperativo conhecê-la para não tomarmos lado apressadamente nas grandes questões que caracterizam o atual momento. Aprendi essa lição quando torcia com entusiasmo juvenil pela queda do xá Reza Pahlevi e sua substituição pelo aiatolá Khomeini. Não estou propriamente arrependido, mas desde então aprendi que em relações internacionais, definitivamente, o céu não é perto.
É indisfarçável que os atuais movimentos relacionados à Ucrânia, Rússia, potências ocidentais capitaneadas pela América do Norte e à silenciosa, porém iminente, China têm gerado grande tensão de repercussão global. Fala-se em medo de guerra em todas as rodas do mundo.
Depois de Hiroshima e Nagasaki, sabe-se, uma conflagração mundial tornou-se uma improbabilidade grande, embora a mera possibilidade seja aterradora e a necessidade de um esforço global pela paz, um imperativo moral de toda a comunidade internacional. Dito isso, algumas coisas precisam ser aclaradas em relação ao problema ucraniano-russo. Ninguém aí é inocente ou merece defesa incondicional, mas é fora de dúvida que a razão central do conflito é o expansionismo do Ocidente.
Não é simplesmente possível ou mesmo imaginável que a Rússia possa conviver passivamente com, digamos, uma Ucrânia filiada à Otan, a organização militar que une os norte-americanos aos europeus ocidentais. E isso seria uma consequência quase natural do alinhamento da Ucrânia à Comunidade Econômica Europeia.
Cinismos diplomáticos à parte, retórica de preocupação com a ordem jurídica ou com a sorte das populações (várias etnias, línguas e culturas) nada mais são, penso eu, do que a cortina de fumaça para esse jogo de interesses econômicos (petróleo e gás) e, especialmente no caso, de Defesa.
Felizmente, os tempos são outros, mas em 1962 os mísseis que a extinta União Soviética pretendeu implantar em Cuba era clara tentativa de equilíbrio em relação à plataforma de ogivas norte-americanas baseada na Turquia. Retórica à parte, Kennedy e Kruchev cederam e as duas plataformas foram desativadas ou não implantadas. O mundo ganhou.
Putin está à altura de Kruchev ou o supera. Temo que Obama (outro entusiasmo meu que se desfez com pouco tempo) esteja muito longe de Kennedy.
Outro dado a destacar: desde o fim da Guerra Fria, a ordem internacional monopolar pela primeira oportunidade está sob contestação. É bom para a humanidade, penso eu.
A política externa recente dos Estados Unidos tem mostrado a necessidade aguda de empoderamento de fóruns mais coletivos e plurais. É só ver o desmantelo geral das coisas no Iraque e Afeganistão, onde a guerra unilateral foi a iniciativa, mas também na instabilidade ou completa anarquia que se sucedeu às pouco transparentes intervenções americanas na sequência do que se convencionou chamar  de Primavera Árabe: Egito e Líbia, por exemplo. É na Síria que reestreia a Rússia de Putin: impede outra intervenção militar unilateral dos EUA (claramente fadada ao atoleiro também) e obtém importante vitória diplomática ao desmantelar o aparato de armas químicas do ditador Bashar al-Assad. Para bem dizer, até os israelenses mais conservadores estão inquietos com os movimentos recentes do Departamento de Estado norte-americano nas negociações com o Irã, sem que a questão palestina avance um milímetro.
Uma ordem internacional multipolar, com a Rússia e a China ombreadas com a Europa e a América do Norte, pode ser a consequência positiva deste momento. Dessa forma, nenhuma memória da anexação dos Sudetos por Hitler ou a morte do príncipe Ferdinando da Prússia, estopins formais da Segunda e da Primeira Guerras Mundiais, remeteriam ao episódio da Crimeia anexada de hoje.

Nós estaremos todos mortos

[...] em breve.
Foto por flickr.com/missmass
Foto por flickr.com/missmass
Lembretes diários assim ajudam a sustentar a perspectiva da morte e direcionar a vida ao essencial. Afinal, não é muito inteligente esperar por um câncer para nos lembrar do que vale a pena.
Do mesmo modo que destila a vida, o olho da morte pode melhorar os relacionamentos. Para abri-lo, vamos observar o que acontece em um velório caricato.
Todos começam a conversar sobre sua conexão com o falecido. O filho fala do pai para o sócio, que descreve o empresário que só ele via. A namorada surpreende a ex-mulher com histórias que não parecem vir de seu ex-marido. O amigo do judô dá risada com o amigo da dança de salão. A diretora de uma ONG revela como ele a ajudou secretamente por décadas. Só conhecemos uma pessoa quando ela morre. Mas talvez possamos antecipar o processo.
O que vemos quando olhamos para esposas, namorados, amigos, filhas, funcionários?
O outro surge 100% como a identidade que foi construída pela relação. Começamos a enxergá-lo de um jeito e, em pouco tempo, não mais desconfiamos de que ele seja muito mais do que nos aparece, de que outros o ativem de outro modo, de que ele encarne diferentes risadas, olhares, gestos. A cegueira se evidencia quando o flagramos em outro mundo, reencontrando um amigo de infância ou palestrando. É como se fosse outra pessoa!
Nunca abraçamos alguém por inteiro — e nem deveríamos tentar. Sua esposa não é sua esposa. Seu namorado nunca foi nem nunca será seu namorado: ele é um homem que está vivendo com você. Conectar-se com essa pessoa livre, não apenas com suas identidades, é o melhor jeito de aprofundar a relação.
Conhecer o outro muitas vezes significa congelar o outro. Se você acha que ela não gosta ou nunca faria tal coisa, espere pelo próximo namorado… Para realmente conhecer alguém, é precisodesconhecê-lo, relacionar-se com o espaço onde surgem suas faces e histórias. Liberar o outro de quem ele é.
Impedimos as pequenas mortes e renascimentos quando silenciosamente, sem saber, exigimos que o outro encarne de novo e de novo o personagem com o qual estamos acostumados. Desejamos surpresas ao mesmo tempo em que as dificultamos. Ao controlar, tentamos garantir que a relação dure, que não sejamos abandonados, que o outro não seja assim tão livre:
“Mude, mas somente dentro das mudanças que eu espero.”
Podemos deixar os outros morrerem mais antes da última morte. Conhecê-los é alimentar sua imprevisibilidade, descobrir não tanto quem a pessoa foi ou é, mas quem não é, quem pode ser.
* Texto publicado na revista Vida Simples em de setembro 2011.
** Estamos concentrando num só lugar pessoas, práticas sugeridas, projetos, artigos de aprofundamento, conversas e experimentos coletivos focados em transformar nossa vida (corpo, mente, trabalho, dinheiro, relacionamentos…). Você está convidado.
Este post é resultado de nossas práticas, diálogos e treinamentos na Cabana PdH. Quer entrar no Dojo?
Gustavo Gitti
Professor de TaKeTiNa, autor do Não2Não1, colunista da revista Vida Simples e coordenador do lugar (ex-Cabana). Interessado na transformação causada pelo ritmo e pelo silêncio. | www.gustavogitti.com

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    "Você vê fotografia deles em vários lugares. Não vê em nenhuma favela, por exemplo. Por que não? A gente não vê essa marca de nenhum deles. A gente vê com a Fiesp, com a Firjan, com a associação dos bancos, com o agronegócio", reclama Maia. Para ele, o PSDB está "patinando ali naquela centro-elite brasileira, do Sudeste –a sudestina".
    No encontro que teve com Aécio, uma parte dessas críticas foram apresentadas de maneira direta. "Faça também essas reuniões [com a elite], mas não só elas. Aí a [colunista da Folha] Mônica Bergamo faz uma matéria dizendo quem estava presente na reunião, que foi servido salgadinho. Isso não dá em nada. Dá para a coluna dela, prestígio. Para o candidato, não dá um voto".
    Estrategista político, Maia diz ver um ruído no ressurgimento do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na linha de frente da campanha eleitoral dos tucanos. "Eles tinham que ter coragem de fazer uma pesquisa para saber se a impopularidade de Fernando Henrique continua a mesma. Se ele dá voto ou se ele tira. Tem que saber. Para saber se o Aécio tem que ter um mentor guardado, oculto, ou se tem que ter um mentor na linha de frente".
    Estudioso de novos meios de comunicação, Maia reclama da forma como os partidos atuam na internet. "O site do PSDB... O que que traz o site? O que o blog do PSDB agrega? Eu recebo mensagens. Estou no cadastro deles. Eu me mobilizaria em função daquelas informações que eu recebo? Zero, nada".
    Se continuar atuando como fez até agora, Aécio não ganha a eleição? "Ah, não. Não tem maioria", responde. "Eu tenho 68 anos. Não tenho mais idade de entrar numa eleição achando que algumas coisas estão erradas e ficar calado".
    O ex-prefeito do Rio acha que ainda dá tempo para a oposição se reposicionar. Uma das estratégias defendidas por Maia é aumentar o nível de críticas ao governo de Dilma Rousseff, algo que ele já diz enxergar um pouco nos últimos dias. "O Eduardo Campos acelerou o discurso. Intensificou a marca. Ainda não tenho convicção de que ele tenha fôlego para crescer. Se eu tiver razão –posso não ter, né?–, eu acho que aí favorece Dilma vencer no primeiro turno".
    Um fenômeno que pode prejudicar a oposição neste ano é o desencanto com a política por parte do eleitorado. "Há uma probabilidade de o 'não voto' crescer nesta eleição. Chamo de 'não voto' o seguinte: abstenção, branco, nulo, não sabe, não respondeu. Há uma probabilidade de esse não voto se aproximar de 40%. Quem perde? A Dilma não perde –tem o voto do Nordeste, do interior, que tem uma máquina grande. Isso pode gerar um primeiro turno. Se essa massa de 'não voto' crescer, ela pode ganhar no primeiro turno com 40%", especula.
    Sobre a estratégia tucana de contratar 9.000 militantes digitais, como revelou a coluna "Painel", da Folha, Maia classifica essa iniciativa de "antirrede social". Para ele, "essa forçação de agências, de marketing de guerrilha e internet é um fracasso completo".
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    Para minimizar o fato de o DEM não indicar o candidato a vice-presidente na chapa do PSDB, Maia sugere uma compensação pragmática. Por exemplo, exigir que os tucanos ajudem demistas a se elegerem deputados federais em alguns Estados. A meta do partido é tentar chegar neste ano ao mesmo número de representantes eleitos em 2010 –foram 43, mas agora só restam 26, pois a sigla foi canibalizada por novas legendas.
    A seguir, trechos da entrevista realizada no último dia 27, em Brasília:

    Bela mensagem

    Senador Cristovam Buarque fala o que quer...escuta o que não quer

    [...] "o Twitter está cheio de corruptos ou de ingênuos" @Sen_Cristovam

    Réplica de um twitteiro:
    O senhor não é ingênuo. Portanto esse seu twitter é a confissão de que é corrupto. Que era um tucano enrustido eu já sabia...
    Quer dizer: 
    Além de queda, coice. 
    Triste!