A hora da decisão
Marco Aurélio Mello vai relatar ação que pede unificação de ações contra Dilma e Temer
Golpe outra vez?
Chegamos a mais uma encruzilhada. Vem de longe a motivação mais profunda que aí nos põe: democracia não é para qualquer um, e o Brasil não tem aptidão para vivê-la. É historicamente inapto, como provam suas poucas e vãs tentativas.
A democracia exige certo refinamento. Sua difícil construção exige, para os passos iniciais que jamais completamos, algum desenvolvimento mental da minoritária camada da sociedade que detém os instrumentos de direção do todo; e, para levá-lo a resultados razoáveis, alguma qualidade moral, a que podemos até chamar de caráter, dessa camada.A ridícula industrialização do Brasil só se iniciou de fato mais de 450 anos depois da chegada dos mal denominados colonizadores. Assim espelha bem a combinação de avareza e preguiça, mental e física, da classe que sempre preferiu, e prefere ainda, amontoar patrimônio a ter de trabalhar no possível investimento em produção, em crescimento, em inovação.Daí os monstros de concreto que são nossas cidades, destino imobiliário dos resultados com a fácil exploração de mão de obra na lerdeza da agricultura e da pecuária, na mineração, no açúcar e no café. Depois, o máximo da modernidade, nas ações de uma Bolsa cujo número insignificante de empresas figurantes atesta a outra insignificância, a do próprio empresariado brasileiro.
Estamos na décima situação de golpe, consumado ou não, só no tempo de minha vida (e não sou o recordista nem entre os que escrevem na Folha). Apenas uma teve raízes fora da minoritária camada que dirige o todo. Foi a de 1935, quando Prestes precipitou uma quartelada desastrosa, que levou ao retorno absoluto do velho poder. Na décima, já seria para ter me acostumado. Nem de longe.É no mínimo indecente que um processo de impeachment seja conduzido por quem e como é conduzido, já desde o seu primeiro ato como chantagem e vingança.
Ganhamos um personagem: Temer o vilão
Rodrigo Viana - Decisão será por margem estreita, e governo só terá votos pra barrar golpe com estados nordestinos no fim da sessão
Alerta: haverá uma primeira impressão de vitória avassaladora do impeachment. Quando os deputados de São Paulo (décima quinta unidade da federação, na ordem prevista por Cunha) votarem, a oposição provavelmente estará ganhando por 75% a 25%. Só então é que entrarão em cena estados nordestinos onde se projeta que o governo levará vantagem: Maranhão, Ceará e Bahia. Nesse momento final é que devem surgir os votos definitivos contra o golpe.
Governadores chegam a Brasília, se unem a Lula e criam "onda a favor" do governo
De sexta para sábado, deputados do PP e do PSB começaram a mudar de voto, muito em razão do desembarque de governadores aliados na capital federal
Por Wilson Lima, para Revista Brasileiros
A entrada de governadores da região Nordeste e a intensificação das negociações comandadas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criaram uma espécie de "onda a favor" do governo federal. Desde quando nomes como o dos governadores Flávio Dino (PCdoB-MA), Rui Costa (PT-BA), Wellington Dias (PT-PI) e Ricardo Coutinho (PSB-PB) chegaram a Brasília para tentar convencer deputados a votar contra o impeachment, alguns votos já foram revertidos.
Dentro do PP, o governo alega que conseguiu obter pelo menos 12 votos a partir da influência do deputado Flávio Dino em parceria com o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), um dos aliados remanescentes do governo federal. Os deputados do PP, entretanto, alegam que Fonte e Dino não vão conseguir entregar os 12 votos. Um deles é certo: o do vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (MA), que declarou voto contra o impeachment um dia após ter se manifestado a favor da saída da presidenta da República.
No caso específico do maranhense, a negociação envolveu a promessa de apoio por parte do governo do Maranhão para que ele lance uma candidatura ao Senado em 2018. O deputado também recebeu a indicação de que poderia assumir o Ministério da Integração Nacional, conforme interlocutores do deputado.
Outro cenário que começa a ser revertido pelo governo, segundo aliados do Planalto, é a adesão do PSB ao impeachment. Lula tem convencido aliados do PSB a não apoiar o afastamento de Dilma e pelo menos dois votos da bancada socialista já foram revertidos: Júlio Delgado (MG) e José Reinaldo (MA).
Os governadores também estão pedindo a parlamentares de seus Estados que se ausentem da votação de domingo (18). A estratégia é clara: criar dificuldades para a oposição obter 342 votos a favor do impeachment. Até o momento, dizem interlocutores do governo, a tática tem dado certo. De todas as sessões de debate já realizadas pela Câmara no processo de impeachment, a com o maior quórum foi a da noite de ontem (15), que contou com a presença de 490 parlamentares. Na manhã deste sábado (16), a sessão registrou a presença de 286 deputados.
Em defesa de Dilma, por Paulo Nogueira
Há um clichê sobre Dilma que deve ser rebatido.
Muita gente diz ser contra o impeachment, embora Dilma seja ruim, péssima, incompetente etc.
Falta reflexão a este tipo de consideração.
Dilma sequer teve a chance de ser uma má governanta. Nem saíra o resultado da eleição e ela começou a ser sabotada brutalmente.
Uma aliança imediata entre Aécio e Cunha no Congresso inviabilizou qualquer iniciativa de Dilma.
A mídia se dedicou a desestabilizá-la desde antes da vitória nas urnas. Na véspera da eleição, a Veja deu uma capa que afirmava que um delator dissera Dilma e Lula sabiam de tudo no escândalo da Petrobras.
Era mentira, era crime jornalístico, ficaria demonstrado quando se soube do teor da delação invocada pela Veja.
Mas a revista saiu impune deste que pode ser classificado como o marco zero no processo de desestabilização do governo pela imprensa.
A Globo com suas múltiplas mídias logo passou também a fazer uma guerra aberta contra Dilma.
O Jornal Nacional se transformou numa Veja eletrônica. Protestos contra o governo e pelo impeachment começaram a ser promovidos descaradamente pela Globo. O objetivo era dar a impressão – falsa, como se vê hoje – de que o país estava unido contra o governo.
A cobertura das operações da Lava Jato foi um capítulo à parte na tentativa da Globo e o restante da mídia em derrubar Dilma.
A crise econômica mundial foi ignorada. Os problemas nacionais foram tratados como se fossem uma coisa apenas do Brasil. Éramos, segundo a imprensa, patinhos feios em meio a cisnes maravilhosos em todo o mundo.
A pergunta que faço, diante de tudo isso, é: como governar?
Não dá. Simplesmente não dá. Já é difícil administrar um país quando você não é boicotado todos os dias e todas as horas. Quando é, fica impossível.
Qualquer pessoa que tenha ocupado uma posição executiva numa empresa sabe do que estou falando. Você não consegue fazer nada, numa companhia, se a seu redor conspiram incessantemente contra você.
Acabou acontecendo uma coisa patética. Os golpistas paralisaram o país, e não se pejaram em colocar a culpa da paralisação em Dilma. Foi o triunfo do cinismo. Eu imobilizo você. E depois o acuso de não se mexer.
Steve Jobs não conseguiria administrar o Brasil nas circunstâncias enfrentadas por Dilma no segundo mandato.
Se fôssemos um time de futebol, Guardiola fracassaria se submetido a uma situação como a de Dilma.
Repito: ela sequer teve a chance de ser ruim no segundo mandato.
Isso tudo quer dizer o seguinte.
Não é apenas injustiça acusar Dilma de inépcia. É ignorância.