Raymundo Costa – VALOR
Deu tudo errado na coreografia de campanha ensaiada por José Serra. Pelos cálculos do PSDB, o tucano chegaria ao horário eleitoral gratuito à frente da candidata do PT, Dilma Rousseff. Três dos quatro institutos de pesquisa mais conhecidos já apontam a petista à frente – o Datafolha registra empate técnico, mas também a melhoria de Dilma e a queda de Serra em todas as demais variáveis, do voto feminino à rejeição do eleitor. Na prática, o tucano entra no período de propaganda de rádio e televisão com uma preocupação mais imediata: manter o que tem e evitar que Dilma liquide as eleições já no primeiro turno.
Justiça seja feita, Serra e seu marqueteiro, Luiz Gonzales, sempre disseram que a campanha seria decidida no período de propaganda eleitoral. Mas é sintomático o modo como o PSDB passou a ser referir ao segundo turno. “No segundo turno ela (Dilma) vai ter que se expor muito. E a exposição queima mais que a luz do sol”, diz um serrista da copa e cozinha. É quase um reconhecimento de que o PT teve sucesso na estratégia de evitar os debates desde que Dilma consolidou uma posição confortável nas pesquisas. Serra jogava num confronto direto que Dilma contornou enquanto acumulava experiência nos “simulados” do comitê e nas sabatinas.
O primeiro debate entre os candidatos será realizado depois de amanhã na TV Bandeirantes. À esta altura da campanha, não será surpresa para ninguém se Dilma for declarada vencedora. Como assim, se Serra é mais experiente e preparado? O candidato do PSDB mais que ninguém sabe que “vence” o debate quem está à frente nas pesquisas. Serra liderava as sondagens de opinião com folga quando decidiu deixar o governo de São Paulo para se candidatar e quando desenhou sua estratégia de campanha. Não lidera mais. Na realidade, já não lidera com folga há algum tempo, mas o candidato insiste em cometer erros “testados” em outras campanhas dele mesmo.
Este é o caso do discurso de Serra sobre a Bolívia, o Irã e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – as Farcs, um problema que já se apresentara à campanha presidencial de 2002, que Serra perdeu para Lula. Todas as pesquisas feitas à época mostraram que eram assuntos distante das pessoas e do interesse só dos eleitores já convertidos à causa tucana.
Serra começou bem sua segunda tentativa para chegar à Presidência da República. Na pré-convenção PSDB-DEM-PPS havia um clima emotivo que lembrava antigas manifestações do PT na oposição. A oposição chegou a pensar que dispunha de um discurso para enfrentar e desalojar o PT do Palácio do Planalto. As coisas começaram a dar errado já a partir da convenção para a oficialização do nome de Serra, realizada dias depois em Salvador. O DEM esperava ao menos conversar com o candidato sobre a candidatura a vice, mas foi ignorado. Logo na Bahia, um dos feudos do ex-PFL, a sigla antiga do DEM.
Em meio a tudo isso, a espera por Aécio Neves até o último dia do prazo legal foi de uma ingenuidade inadmissível em políticos com a experiência dos tucanos – ou talvez políticos imobilizados pelo cisma partidário É certo que Aécio fez jogo dúbio. Mas pelo menos desde dezembro, quando enviou uma carta ao presidente do PSDB, Sérgio Guerra, estava claro que ele não aceitaria a vice de Serra. Aécio saiu de férias e pediu para os tucanos não decidirem nada na sua ausência. O PSDB queria acreditar que era um sinal codificado de que ele queria a vice. O resto da novela é conhecido. Sabe-se como Serra teve de engolir o Democratas, que esnobara, como companheiro de chapa.
Além de chegar ao horário eleitoral atrás ou em queda nas pesquisas, Serra perdeu vantagens comparativas, como a inexperiência de Dilma (ela já divide o sucesso do governo) e a maneira nada ética com que o presidente Lula se atirou na construção de uma candidatura saída do nada.
O fato de Lula reiteradas vezes transgredir a legislação eleitoral para antecipar a campanha de Dilma Rousseff não justificava que Serra tocasse no mesmo diapasão. O tucano rejeitou todas as tentativas do PT de dizer que nada fez no governo, em termos éticos, que os tucanos não tenham feito antes. Foram várias as ocasiões em que ele rejeitou essa comparação. O PSDB talvez possa argumentar que se não tivesse usado os programas partidários, como fez o PT, Lula teria passado o rolo compressor sobre a candidatura Serra. Pode ser, mas Serra perdeu o discurso.
Nada justifica a ação Lula, que há três anos trabalha para viabilizar uma candidatura à sua sucessão ancorado na máquina pública e na transgressão sistemática da legislação eleitoral. O senador José Sarney calcula que, qualquer que seja o presidente, um candidato apoiado pelo governo federal entra numa eleição com algo entre 15% e 20% dos votos. Era o que ele prometia a Ulysses Guimarães, nas eleições de 1989, mesmo com seu governo ao rés do chão – Ulysses recusou e acabou na sétima posição, com 4,43% dos votos, mas preservou a biografia. Lula, além da popularidade nas nuvens, empenhou o governo na campanha de Dilma, quase ao ponto de permitir o questionamento da legitimidade da eleição.
Os crentes sempre devaneiam uma carta oculta. Pode ser que Serra vire o jogo a partir do dia 17, mas o fato é que sua campanha é ziguezagueante. Todos os candidatos sabem que o horário nobre do noticioso da televisão pode ser mais importante que os debates (”ganha” quem está na frente, a menos que cometa um erro colossal) e o horário eleitoral gratuito. O governo pauta naturalmente a mídia. Logo, a candidatura da oposição precisa ter uma agenda capaz de levar para o horário nobre problemas que afetem o dia a dia das pessoas. A agenda de Serra não tem um rumo.
Não é da prática do marqueteiro da campanha do tucano, mas no momento em que passa a se preocupar com o segundo turno, o risco é Serra ceder ao apelo fácil de elevar o tom da campanha. Alckmin fez isso em 2006. Não deu certo.
L3R ? 3NT40 CL1K N0 4NÚNC10 QU3 T3 1NT3R3SS4 ! 4GR4D3Ç0 !
Nenhum comentário:
Postar um comentário