Numa democracia todos são inocentes - até que se prove o contrário -


[...] desde que: os réus não o sejam petistas, não é mesmo ínfimos mininistros? 
"Somos Todos Salafrários?
Editorial do Estadão, na sexta-feira, fez observações duras sobre o comportamento de Joaquim Barbosa, o ministro relator do julgamento do mensalão.
Observou que “desde as primeiras manifestações de inconformismo com o parecer  do revisor Ricardo Lewandovski” a atuação de Joaquim Barbosa “destoa do que se espera de um membro da mais alta Corte de Justiça do país.”
O jornal, o mais influente nos meios jurídicos, explica que, em vez de “serenidade” o ministro “como que se esmera em levar um espetáculo de nervos `a flor da pele, intolerância e desqualificação dos colegas.”
Lembrando que Joaquim Barbosa exibiu um sorriso debochado diante de um colega que declarava  discordâncias –parciais — em relação a um de seus votos, o jornal lamenta o “desdém estampado na face do relator” e registra a queixa de Marco Aurélio  Melo: “não admito que Vossa Excelência suponha que todos aqui sejam salafrários e só Vossa Excelência seja uma vestal.”
Acho que em algumas situações o STF tem agido como se fosse possível supor “que todos aqui sejam salafrários”.
Exigir passaportes de quem ainda não foi condenado definitivamente – o julgamento não acabou, gente! – é uma decisão desnecessária. O mesmo vale para a decisão de incluir os réus na lista de procurados.
São medidas com amparo legal. Mas a questão não é essa.
Estamos tratando de pessoas que jamais se recusaram se a atender a um chamado da Justiça.
Se hoje os brasileiros podem defender seus direitos no Supremo – e não submeter-se a coronéis e generais da Justiça Militar – é porque se travou uma luta por isso.  No banco dos réus, hoje, encontramos vários lutadores que participaram  da democratização do país.
Quando se recusaram a obedecer a lei, não eram elas que estavam erradas mas a Justiça, inclusive o Supremo da época, que, vergonhosamente, se curvou à  ditadura, omitiu-se diante da tortura e da perseguição política, deixando a Justiça Militar tratar de crimes considerados políticos.
Quem considera que o STF é exemplo para o país, poderia se perguntar: depois de  torcer abertamente para que o julgamento influenciasse as eleições para prefeito, agora se quer que os réus sejam hostilizados quando saem à rua?
Queremos humilhação? Vamos ampliar aquele teatro, estimulado artificialmente pelos adversários, como se sabe, de agressividade e ofensas? Eu acho indecoroso lhes dar o tratamento de criminosos comuns, de bandidos.
Sabe por que? Porque eles não são. Têm projeto para o país, defendem ideias, já lutaram de forma  corajosa por elas. Pode-se falar o que se quiser  dessa turma. Mas não há  prova de enriquecimento suspeito de Dirceu nem de Genoíno. Nem de Delúbio Soares, nem de João Paulo Cunha. Nem de Henrique Pizzolato, condenado como maior responsável pelo desvio de recursos do Visanet.
E é porque têm ideias e projetos que  essas pessoas foram levados a julgamentos no STF e não para  um juiz de primeira instância.
E é só porque este projeto tem apoio da maioria da população que este julgamento tem importância, não sai dos telejornais nem das manchetes. A causa é política.  Pretende-se deixar o Supremo julgar estas pessoas, quando este é um direito da população.
E é um julgamento político, vamos combinar. Pretende-se usá-lo como exemplo.
E é pelo receio de que o exemplo se repita, e condenações sem provas, sem demonstrações inquestionáveis de culpa dos réus, que mesmo quem apoia as decisões  do STF começa a ficar preocupado. Por que?
Porque é injusto. E teme-se que a injustiça desta decisão contamine as próximas decisões.
Imagine se o mensalão mineiro obedecer ao mesmo ritual, da lei do “sei que só podia ser dessa forma”, do “não é plausível” e assim por diante. Vamos ter de voltar a 2000, quando, seguindo a CPI dos Correios, o dinheirinho do PSDB começou a sair do Visanet.
Vamos ter de chegar lá e apontar quem era o responsável por liberar a grana que, conforme escreve  Lucas Figueiredo, no livro O Operador, chegou a 47 milhões de reais apenas no mandato de Aécio Neves no governo de Minas Gerais.
É assim que se vai fazer a campanha presidencial da grande esperança anti-Dilma  em 2014? Parece que não, né, meus amigos.
É certo que há uma visão política por trás disso. Essa visão é seletiva e ajudou a deixar o mensalão PSDB-MG num tribunal de primeira instância, medida que favorece os réus.
Essa visão é acima de tudo distorcida e tem levado a criminalização da atividade política. Confunde aliança política com “compra de votos” e “pagamento de propina.” E estamos condenando sem serenidade, no grito, como se todos fossem “salafrários.”
As provas são fracas. O domínio do fato é um argumento de quem não tem prova individual. Você pode até achar uma jurisprudência válida. Você pode até achar que “não é possível” que Dirceu não soubesse, nem Genoíno.
Mas a Folha de hoje publica uma entrevista com um dos autores da teoria do domínio do fato. Basta ler para concluir que, falando em tese, ele deixa claro que é preciso mais do que se mostrou no julgamento.
Mas não vamos esquecer que o domínio do fato referia-se a uma hierarquia de tipo militar, onde funciona a lei de obediência devida, onde o soldado que desobedece a cadeia de comando pode ir a julgamento. É disso que estamos falando? De um bando de manés que o Dirceu dominava, todo poderoso?
Que Genoíno comandava porque acabara de virar presidente do PT e tinha de assinar documentos em nome do partido? De generais e soldados?
Alguém ali era menor de idade, não fora vacinado? Alguém não sabia ler ou escrever? Não tinha vontade própria?
Outro ponto é que faltam testemunhas para sustentar a tese da acusação. O mensalão que “todo mundo sabe que existia” continua mais invisível do que se pensa.
Roberto Jefferson é volúvel como prima donna de ópera.
Faltam até heróis neste caso.
Sabe aquela publicitária tratada como heroína por determinados órgãos de imprensa, porque denunciou os desvios no Visanet? Pois é. Embora tenha sido mencionada no tribunal por Roberto Gurgel e também por Joaquim Barbosa, a  Polícia Federal encontrou 25 000 reais em sua conta, depositados por uma agência subcontratada pela DNA que é de… Marcos Valério. Teve um outro, o câmara que filmou a denuncia dos correios. O cara trabalhava para o bicheiro Cachoeira.
Coisinhas mequetrefes, né…
A acusação de que o mensalão “está na cara” é complicada quando se lê uma resolução do Tribunal de Contas da União que sustenta o contrário e diz que as despesas fecham. Por esta resolução, não houve desvio.
Você precisa achar que “todo mundo é salafrário” para acreditar em outra coisa. O texto está ali, fundamenta o que diz e assim por diante.  E lembra que testemunhas que dizem o contrário de são inimigas notórias de quem acusam.
Falamos em “desvio de dinheiro público”mas não temos uma conta básica. Assim: quanto saiu dos cofres públicos, quando foi entregue para quem deveria receber — agencias de publicidade, meios de comunicação que veiculam anuncios — e quanto se diz que foi desviado. Há estimativas que, às  vezes, apenas são o nome elegante de “chute.”
O fato é que não sabemos, de verdade, qual o tamanho disso que se chama de “mensalão.”
É curioso que, mesmo com estimativas, o Supremo fale em pedir aos réus que devolvam o dinheiro desviado. Mas como, se não se sabe, exatamente, o quanto foi. Devolver estimativa?
Então, conforme o TCU, não houve desvio. Você pode até contestar essa visão mas não é uma questão de opinião, somente. Precisamos mostrar os dados, os números, as datas.  Não posso entrar no banco  e dizer que o dinheiro sumiu de minha conta sem mostrar os saldos e extratos, concorda? E o banco tem de mostrar para onde foi o dinheiro que eu disse que estava lá, certo?
Nós sabemos que os ministros do TCU são indicados por razões  políticas e muitos deles são ex-deputados, ex-ministros. Até posso achar que é “todo mundo salafrário” mas não se pode tomar uma decisão com base nessa opinião sem tomar uma providência – como denunciar os supostos salafrários na Justiça, concorda? Vamos cassar os ministros que sustentam a lisura dos contratos?
Sei que você  pode discordar  do que estou dizendo.  Tudo bem. É seu direito. Concorda? Também.
Eu só acho que desde Voltaire, um dos pioneiros do iluminismo, posso não concordar com nada do que dizeis mas defenderei até a morte o direito de fazê-lo.
O nome disso é democracia.
E é em nome disso que não entendo por que o relator Joaquim Barbosa declarou-se ofendido com uma crítica de José Dirceu ao julgamento. Dirceu falou em populismo jurídico.
Barbosa considerou isso uma “afronta.”  É engraçado. Embora o populismo tenha virado xingamento depois de 1964, existem cientistas políticos renomados que dizem que é um sistema de ação político válido, que envolve, claro, o argentino Peron, o turco Kemal Ataturk e muitos outros.
Mas essa é outra discussão. O que importa, aqui, é lembrar que juiz julga e fala pelos autos, mesmo quando o julgamento é televisionado. Não pode ficar ofendido.  Ou melhor, pode. É humano.
Mas não pode manifestar isso num julgamento. Não pode ter uma opinião pessoal. Não pode falar que gosta de um partido, ou que tem desprezo por outro. Tem de ser inteiramente impessoal, e por isso usa uma toga negra. Seu símbolo é uma balança, os olhos vendados.
Um juiz pode até ficar indignado com os métodos que se faz política no Brasil desde os tempos de Pedro Alvares Cabral.
Mas não pode enxergar corrupção por trás de toda aliança política que não entende nem consegue explicar. Não pode achar que todo pacto entre partidos é feito de roubo e de propina. Porque é esta visão que domina o julgamento. E ela é errada.
Vou me candidatar ao troféu de frasista do domingo  ao lembrar que se não houvesse divergência nem traição nunca haveria aliança  em política.
É só perguntar à velha guarda do PMDB o que ele achou da aliança do Tancredo Neves com o Sarney e do abandono das diretas-já.
Aos tucanos, o que eles acharam do acordo com ACM para eleger Fernando Henrique Cardoso.  Até dona Ruth se enfureceu.
Aos petistas, o que acharam dos novos-amigos que apareceram em 2002, a começar por um empresário que ficou vice, o PTB do Jefferson, da Carta ao Povo Brasileiro e  assim por diante…
Se todo mundo pensasse igual  não era preciso fazer aliança.
Aliança se faz com adversários e aliados distantes. Se não fossem, entravam para o partido, certo?
Alianças envolvem partidos diferentes e, as vezes, muito diferentes. Podem ser um desastre ou uma maravilha, mas são legítimas como instrumento de governo.  Claro que, pensando como o PCO, o PSTU, a LER, o MNN, é possível achar que não dá para fazer aliança com quem é salafrário, categoria que na visão dessa turma inclui mais ou menos 200% dos políticos – aqueles que estão em atividade e todos os outros que ainda não entraram na profissão.
Alianças se compra com dinheiro? Não. É suborno? Não.
Mas inclui dinheiro porque a política, desde a invenção do capitalismo e da sociedade burguesa,  é uma atividade que deixou de ser exclusiva da nobreza, chegou ao cidadão comum e se profissionalizou. O dinheiro pode sair do Estado, recursos que permitem um controle real e uma distribuição democrática.  Ou pode vir dos interesses privados, que assim colonizam o Estado conforme seus interesses. Os adversários da turma que está no banco dos réus sempre se opuseram a uma reforma que permitisse esse controle maior. Dá para imaginar por que.
Os “políticos-salafrários” só pensam numa coisa: ganhar a próxima eleição. A vida deles é assim. Contaram os votos, começam a pensar na campanha seguinte. É normal. Você pode achar muito oportunismo. Eu não. A democracia não para.
Por isso as verbas de campanha são sua preocupação permanente
Por isso, os mais velhos contam que o movimento democrático que derrubou a ditadura militar tinha uma caixinha clandestina que ajudou  a vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.  Era imoral? Não. Era ilegal? Devia ser.
Os grandes financiadores da luta no colégio eleitoral foram grandes empreiteiras.
Em 1964, quando até Juscelino foi humilhado por um IPM infamante,  se dizia que o mundo se dividia entre subversivos e corruptos.
Mas estávamos numa ditadura, quando se espera que seus adversários políticos sejam tratados como inimigos morais. Este recurso favorece decisões arbitrárias.
Numa democracia, todos são inocentes – até que se prove contrário."
Paulo Moreira leite

Crônica de A. Capibaribe Neto


Os últimos fantasmas

Estava ali, fazendo as malas dos fantasmas aos quais me apegara com unhas e dentes para que não fossem embora. Ou que fossem, como no filme Gosht, logo que conseguissem pelo menos fazer o que não haviam feito por mais de dez anos enquanto matéria, enquanto corpo, enquanto voz. Ruim é descobrir que por detrás de muitas culpas assumidas havia razões para os erros cometidos e exageradamente confessados. Finalmente, os fantasmas estavam prontos para seguir em direção à luz da porta de saída definitiva e ganhar seus merecidos descansos e paz eterna. Estava tudo pronto. Havia calma e serenidade na penumbra do quarto. Fotografias e bilhetes estavam rasgados, passados na máquina de picotar e já devidamente embalados e colocados nas mochilas dos fantasmas. Eram três: arrependimento, saudades e lembranças. 

Quem dirigia a carruagem que os conduziria a luz era uma mulher nua, chamada Verdade, mas que atendia também pelo nome de Realidade. 

Arrependimentos precisam de uma culpa; saudade de um nome que valha a pena e lembranças são as que deveríamos carregar pelo resto da vida. 

A Verdade precisa checar as mochilas. 

Ninguém viaja até à luz assim, de qualquer jeito. "Abram as mochilas!"E como ninguém discute com a autoridade da Verdade, assim foi feito. Nenhum item deixou de ser verificado. E os fantasmas ali, sem dizer nada. Alguns arrependimentos podiam embarcar. Eram verdadeiros, havia uma razão de ser neles porque faziam parte de tudo aquilo que uma pessoa faz numa fração de segundo e se arrepende pelo resto da vida, como atender a um pedido ridículo, feito pelo amor de Deus para um imbecil cair em tentação. Depois, quando chega o recibo das consequências, a dívida que nunca deveria ter sido contraída é apresentada numa conta quase impossível de pagar. Outros arrependimentos, já empacotados e prontos para seguir em direção à luz, não. "Arrependimento do quê? Neste item aqui?"- perguntou em tom debochativo a Verdade. "Deixa de ser bobo, seu tolo. No circo da vida muitas vezes é preciso que um olho seja a paga do olho arrancado e o dente quebrado que arranque o dente de quem o quebrou e preencha o lugar vazio na outra boca. Você estão pelo conjunto da obra..."- complementou a Verdade. 

Toda culpa tem seu tamanho. Não se pode aumentar o tamanho dela para mostrar um arrependimento maior. Também ele precisa ter seu tamanho exato e sem exagero na humildade com que seja vestido. 

Quanto às saudades, a Verdade disse que só se sente saudade de uma coisa que mereça ser guardada dentro do peito e do lado esquerdo. Saudades precisam de nome, sobrenome, origem, data de nascimento, filiação. Não se pode sentir saudade de um sentimento misturado, um sentimento que nasceu confuso, uma história que se manteve torta nem um desfecho cheio de dúvidas. Se uma saudade não está clara, não pode embarcar. E várias saudades desceram. Ficou uma, com a roupa da Lamentação pelo tempo perdido. "Ei, desça você também. Ninguém pode seguir para a luz com a maquiagem do interesse e as bijuterias da conveniência..."- falou com ar pesado a Verdade. E aí, foi a vez de checar as lembranças... 

A Verdade ali, sem deixar passar nada. "Hummm, essas são lembranças boas... Bem antigas, mas boas. Lembranças do começo quando se chamavam Paixão. Boas, boas. Pra sacola, podem se acomodar. Lembranças dos primeiros beijos, das primeiras entregas... Irresponsáveis, mas sinceras. Podem se acomodar também. É, as lembranças pode ir. As boas são em maior número que as ruins e a gente pode dar um jeito. Com os arrependimentos não condesso  Com as saudades muito menos. Não quero ouvir choro de lamentação pelo que não merece ser eternizado"- concluiu a Verdade e assumiu a boleia da carruagem negra. Dois cavalos de pelos reluzentes, saindo fogo pelas ventas se agitaram ao primeiro estalar do chicote de fios de ouro. Um tinha os pelos quase negros de tão castanho que eram, como seus olhos. O outro, pelos dourados e olhos verdes. Uma verdadeira multidão cercava o embarque dos fantasmas, e dentre os presentes, uma figura que nunca perdoa: 

A Vingança! Procurando esconder-se dentro do capuz onde esperou tantos anos, ria seu risinho de satisfação comendo seu bocado frio. Os fantasmas foram embora arrastando suas correntes, a multidão se dispersou, a Vingança aliviada se aquietou. Agora estava tudo quites. Aqui se fez aqui se pagou. As derradeiras luzes do lusco-fusco engoliram a carruagem e nunca mais se escutou dentro do castelo o choro do homem que criou fantasmas de coisas que nunca deveriam ter existido e os alimentou de ilusões até a chegada da Verdade, quando tiveram de ir embora. Para sempre. Agora, sim, para sempre, deixando um lugar modesto para uma paz necessária ao que muitas vezes precisou apenas de um abraço para sobreviver do outro lado de uma despedida. 

Blog do Charles Bakalarczyk: Todo mundo é salafrário?

Blog do Charles Bakalarczyk: Todo mundo é salafrário?: Por Moreira Leite Editorial do Estadão, na sexta-feira, fez observações duras sobre o comportamento de Joaquim Barbosa, o minist...

as verbas de campanha são sua preocupação permanente.

Por isso, os mais velhos contam que o movimento democrático que derrubou a ditadura militar tinha uma caixinha clandestina que ajudou a vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Era imoral? Não. Era ilegal? Devia ser.

Os grandes financiadores da luta no colégio eleitoral foram grandes empreiteiras.

Em 1964, quando até Juscelino foi humilhado por um IPM infamante, se dizia que o mundo se dividia entre subversivos e corruptos.

Mas estávamos numa ditadura, quando se espera que seus adversários políticos sejam tratados como inimigos morais. Este recurso favorece decisões arbitrárias.

Numa democracia, todos são inocentes – até que se prove contrário. 

Para ler mais, clique no link abaixo:
http://bakalarczyk.blogspot.com.br/2012/11/todo-mundo-e-salafrario.html

Crônica semanal de Luis Fernando Verissimo


Multidões

Em Lisboa e Londres você pode escolher a multidão que quer seguir: a que está indo para mais uma manifestação contra o governo e suas medidas de austeridade, ou a que está indo para o Bairro Alto de Lisboa e o Soho de Londres, para encher suas ruas, seus bares e seus restaurantes.

Claro que uma multidão não desautoriza a outra. Você pode mesmo aderir às duas sem se contradizer. Nem o movimento no Bairro Alto e no Soho (só para pegar dois exemplos que devem se repetir em outros países como a Espanha e até, imagino, a Grécia) desmente a crise, nem a crise impede as pessoas de se divertirem, até para não pensar muito nela.
E não se deve esquecer que boa parte das pessoas que pulam de tasca em tasca no Bairro Alto e transbordam dos pubs no Soho são turistas, em férias da realidade, qualquer realidade.
Seja como for, o Marciano Hipotético que descesse no meio dessas multidões teria dificuldade em fazer seu relatório sobre o que viu. Todo o mundo revoltado ou todo o mundo alienado? Ou, em linguagem de marciano, fifti-fifti?

Joaquim Barbosa é um canalha, afirma Vovó Briguilina

Martelada ininterruptamente no imaginário da população brasileira há 3 meses e 9 dias, e urdida com o talento, a cadencia e o timming político que em nada ficam a dever ao que seria o produto de um bureau profissional escolado na arte da novela e no ofício da comunição, a Ação Penal 470 enfrenta o seu making off.

Surgem evidências de que por trás da narrativa de esmero profissional e estratégia midiática transbordante de sintonia eleitoral há pilares trincados. E a palavra trincado aqui é uma cortesia dos bons modos.

O jornalista Raimundo Pereira já demonstrou em uma investigação de fôlego intitulada a ‘A vertigem do Supremo’ ( http://www.oretratodobrasil.com.br/) aquilo que o ministro da Justiça cogitou na edição de sábado do jornal O Globo. De forma igualmente cortês, José Eduardo Cardozo declarou que há dúvidas se o dinheiro do Fundo Visanet é recurso público de fato, requisito para o peculato consagrado na argumentação do relator.

Essa afirmação do Ministro da Justiça, encontra amparo num ofício que o BB enviou ao Relator da CPMI dos Correios, o Deputado Osmar Seraglio, comunicando e afirmando que o Fundo Visanet é privado, fato que jamais foi levado em consideração pelo MP e pelo Relator.

Raimundo Pereira demonstrou de forma meticulosa que:

a) o Visanet (atual Cielo) é uma empresa privada;

b) seu investidor âncora é uma multinacional (Visa International);

c) o maior sócio é o Banco Bradesco, em uma sociedade da qual participam outros 23 bancos brasileiros, incluído o BB;

d) o BB, sócio minoritário nessa sociedade, nunca aportou dinheiro para a Visanet ou para o Fundo de Investimentos Visanet, não sendo portanto seu dono, ao contrário do que insistem as togas da Ação Penal 470;

e) é falsa a tese de que os R$ 73,8 milhões pagos pelo Fundo Visanet à agencia de publicidade DNA, de Marcos Valério, não resultou em contrapartida de serviços prestados.

“Os autos da Ação Penal 470 contêm um mar de evidências de que a DNA de Valério realizou os trabalhos pelos quais recebeu os 73,8 milhões de reais”, informa Raimundo Pereira.

Está nos autos, assim como é público que uma auditoria implacável, feita pelo próprio Banco do Brasil, revirou as contas do Fundo Visanet sem registrar irregularidades.

O conjunto retira o mastro que sustenta a rota de longo curso da criminalização do PT, ancorada na seguinte bússola: que o dinheiro em questão era público -portanto, o ilícito não se resume ao caixa dois de campanha que nivela todos os partidos ; que foi apropriado pelo PT em triangulação com a DNA; que os serviços a ele relacionados nunca foram prestados; que os empréstimos dos bancos mineiros não existiram de fato, sendo apenas um simulacro para ‘esquentar’ a apropriação dos recursos públicos pelo caixa petista.

Se o Visanet, ao contrário, é uma empresa privada, se pertence ao Grupo Visa International, se tem no BB apenas um dos seus sócios no país e se os serviços contratados à DNA foram entregues, então a brocha está segurando a toga no ar.

O conjunto só não despenca graças ao sopro de sustentação assegurado pelos possantes pulmões do dispositivo midiático conservador. Estes não apenas ignoram as inconsistência da relatoria e as elipses que afrontam os autos, mas lançam o manto da suspeição macartista sobre todas as vozes que se erguem em sentido contrário.

Nos EUA dos anos 50, bastava Joseph McCarthy dizer ‘comunista’ –todos se calavam; hoje a mídia carimba: ‘mensaleiros’. E o temor do linchamento midiático faz o resto.

O pretenso outono do PT decretado pelos interesses aglutinados em torno desse perverso mimetismo pode ter atingido um ponto de saturação.

Há questões de gravidade adicional que não devem mais ser silenciadas.

Elas arguem não apenas a interpretação enviesada dos autos, mas escancaram algo que pela insistência em se manter oculto sugere a deliberada, escandalosa e acintosa sonegação de informações que, tudo indica, ‘atrapalhariam’ a coesão narrativa do relator e o furor condenatório da mídia que lhe serve de abrigo legitimador.

A persistência dessas omissões constituirá desvio de gravidade suficiente para sancionar quem enxerga no julgamento em curso as tinturas de um tribunal de exceção.

Fatos:

a) as mesmas operações realizadas através do Fundo Visanet no âmbito do Banco do Brasil, idênticas na sistemática mas todavia superiores no valor, foram registradas nos anos 2001 e 2002. Governava o país então o tucano Fernando Henrique Cardoso;

b) a liberação dos recursos do Fundo Visanet para a DNA só poderia ser feita mediante solicitação, por escrito, do GESTOR DO FUNDO, na época, representado pelo sr. Léo Batista dos Santos, nomeado pela Diretoria de Varejo, cujos integrantes foram indicados ainda na gestão FHC, conforme farta documentação existente nos autos da ação 470;

c) no voto do Ministro Relator fica cristalizado que os documentos comprobatórios dos ditos “desvios dos recursos “ do BB, que levaram à condenação do réu Henrique Pizzolato, teriam se dado a partir de quatro notas técnicas internas;

d) Esses documentos são assinados por dois Gerentes de Marketing e Varejo e por dois Diretores de Marketing e Varejo, sendo as assinaturas da área de Varejo (responsável pelos Cartões de Crédito e Gestor do Fundo) emitidas sempre pelas pessoas de Léo Batista ou Douglas Macedo;

e) Frise-se que essas notas técnicas internas, não são documentos hábeis para liberação de recursos. Não há como deixar de mencionar que um outro Gerente Executivo de Marketing, o sr. Claudio Vasconcelos, é a terceira pessoa que assina as notas técnicas ;

f) o relator Joaquim Barbosa excluiu esses três outros participantes das notas técnicas internas de sua descarga condenatória. A eles reservou um processo que corre em segredo de Justiça e no qual o sr. Claudio Vasconcelos teve seus sigilos bancário, fiscal e telefônico quebrados pelo Juiz da causa.Trata-se de um processo indissociável da Ação Penal 470, mas cuja existência é omitida nos autos.Um processo sobre o qual os demais ministros do Supremo Tribunal Federal nada sabem. Um processo que a imprensa ignora. Um processo cuja transparência pode mudar os rumos do julgamento em curso;

g) o único dos quatros assinantes das notas técnicas internas denunciado pelo relator Joaquim Barbosa, que o manipula como se fosse o lastro operacional do ‘esquema’ atribuído ao PT, é o ex-diretor de marketing do BB, Henrique Pizzolato.

h) o que distingue Pizzolato dos demais? Ele é petista.

i) a narrativa esfericamente blindada de Joaquim Barbosa, ingerida sem água por colunistas ‘isentos’, ao que parece não se sustenta se Pizzolato for alinhado aos demais e se os demais foram nivelados a ele. Daí a ocultação escandalosa do processo em segredo de justiça que Joaquim Barbosa recusa-se a quebrar, embora requerida há mais de dez dias pelo advogado de Pizzolato.

O relator poderá justificar o arbítrio com a alegação de que Pizzolato recebeu em sua casa dois envelopes enviado por Valério com R$ 326 mil. O ex-diretor de marketing do BB alega ter sido neste caso apenas o portador dos envelopes, que para ele continham documentos a serem entregues ao PT do Rio, mas que posteriormente se confirmou traziam dinheiro para o caixa de campanha.

Pode-se duvidar da palavra de Pizzolato. Há que se considerar, todavia, que ele de fato não detinha poderes para facilitar ou favorecer a empresa de Marcos Valério junto ao Fundo Visanet, conforme a documentação referida.

Por que, então, seria ele o corrompido ?

Pizzolato não tinha os poderes a ele atribuídos pelo relator; não participou individualmente de nenhuma decisão; apenas a ocultação dos demais diretores do comitê permite distorcer a verdade impondo-lhe práticas e responsabilidades fantasiosas, impossíveis de serem comprovadas dentro ou fora dos autos.

Insista-se que só há um fator que distingue Pizzolato e o privilegia na argumentação condenatória do relator: ele era petista; os demais membros do comitê de marketing eram egressos de nomeações feitas durante o governo Fernando Henrique Cardoso.

Tirá-los do esconderijo judicial ao qual foram encaminhados por Joaquim Barbosa poderá, talvez, fazer ruir toda a alvenaria estrutural do julgamento.

E mais que isso: colocar em xeque as emissões de tintura macartista com as quais a mídia tem amparado, vocalizado e orientado o conjunto da obra.

Saul Leblon

Paulo Coelho: ao maior de todos


Atravessando a Avenida Copacabana - Eu tinha editado, com meus próprios recursos, um livro chamado "Os Arquivos do Inferno". Todos nós sabemos o quanto é difícil publicar um trabalho, mas existe algo ainda mais complicado: fazer com que ele seja colocado nas livrarias. Todas as semanas minha mulher ia visitar os livreiros em um lado da cidade, e eu ia para outra região fazer a mesma coisa.


Foi assim que, com exemplares de meu livro debaixo do braço, ela ia atravessando a Avenida Copacabana, e eis que Jorge Amado e Zélia Gattai estão do outro lado da calçada! Sem pensar muito, ela os abordou e disse que o marido era escritor. Jorge e Zélia (que provavelmente deviam escutar isso todos os dias) a trataram com o maior carinho, convidaram para um café, pediram um exemplar, e terminaram desejando que tudo corresse bem com minha carreira literária.

"Você é louca!" eu disse, quando ela voltou para casa. "Não vê que ele é o mais importante escritor brasileiro?"

"Justamente por isso", respondeu ela. "Quem chega aonde ele chegou, precisa ter o coração puro." O recorte no envelope

As palavras de Christina não podiam ser mais acertadas: o coração puro. E Jorge, o escritor brasileiro mais conhecido no exterior, era (e é) a grande referência do que acontecia em nossa literatura.

Um belo dia, porém, "O Alquimista", escrito por outro brasileiro, entra na lista dos mais vendidos da França, e em poucas semanas chega ao primeiro lugar.

Dias depois, recebo pelo correio um recorte da lista, junto com uma carta afetuosa sua, me cumprimentando pelo feito. Jamais entraria, no coração puro de Jorge Amado, sentimentos como o ciúme.

Alguns jornalistas - brasileiros e estrangeiros - começam a provocá-lo, fazendo perguntas maldosas. Jorge, em nenhum instante, se deixa levar pelo lado fácil da crítica destrutiva, e passa a ser meu defensor em um momento difícil para mim, já que a maior parte dos comentários sobre meu trabalho era muito dura.

PiGocracia, PijuGracia e PSTF são lama do mesmo barro

PiGocracia é o regime político que não rejeita a ditadura (é “um mal necessário”), é exercido pela opinião pública (familiares dos empresários do PiG) e seu orgão deliberativo não eleito, de natureza judiciária, legislativa e executiva, o P-STF

A PIGocracia é muito encontradiça na América Latina, particularmente no seu litoral leste. Atualmente, vem sendo dizimado a golpes de Lei, republicanismo e democracia , no sul da região (Argentina).
Paulo Henrique Amorim