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Artigo dominical de Marcos Coimbra


A Antecipação da Sucessão

Um dos traços mais significativos da vida política brasileira em 2012 foi a intensidade do efeito que nela exerceu a próxima eleição presidencial. Quase tudo de importante que aconteceu a teve como referência.

Dilma nem chegou à metade do mandato, seu governo ainda tem um longo caminho pela frente e, para o cidadão comum, a sucessão está longínqua. Mas o sistema político passou o ano obcecado por ela.

Especialmente as oposições.

Os partidos oposicionistas e seus aliados se viram forçados a disputar, em 2012, o primeiro round da eleição de 2014. Percebendo, com base em avaliações internas e pesquisas disponíveis desde o início do ano, que o vento soprava contra seus projetos, resolveram começar a trabalhar na sucessão presidencial desde cedo.

A principal estratégia foi desconstruir a imagem do PT através do julgamento do mensalão, dando-lhe toda a exposição possível. E o sincronizaram com as eleições municipais, de forma a que os eleitores chegassem às urnas maximamente atingidos por ele.

Só os muito ingênuos viram como coincidência que José Dirceu fosse condenado faltando uma semana para o pleito. Naquele momento, bem como na eleição inteira, o que fizeram foi criar um clima de opinião para interferir na escolha do eleitorado.

Queriam matar dois coelhos com uma só cajadada: enfraquecer os candidatos do governo a prefeito e vereador; desgastar o partido para a eleição a seguir. A oposição sairia fortalecida e com a sustentação municipal recomposta, com melhores condições de ampliar a bancada na Câmara dos Deputados e fazer bom papel na eleição presidencial.

Os resultados da eleição municipal e as pesquisas deste fim de ano a respeito das intenções de voto em 2014 mostram que isso não funcionou. Pelo menos, por enquanto.

A pesquisa mais recente foi feita pelo Datafolha, no dia 13 de dezembro, ouvidas 2588 pessoas em todo o País.

Em que pese o esforço dos comentaristas de encontrar problemas para Dilma e Lula, foi muito favorável a ambos. A começar por sua folgada liderança em todos os cenários.

Dilma varia de 57%, quando é confrontada com Marina Silva (que tem 18%) e Aécio Neves (com 14%), a 53%, quando entra na lista Joaquim Barbosa (que alcança 9%). Na hipótese de Eduardo Campos ser o quarto nome, ao invés de Barbosa, ela fica com 54% e o pernambucano com 4%.

Lula está na frente, com 56%, no único em que aparece, no qual estão Marina Silva (13%), Joaquim Barbosa (10%) e Aécio Neves (9%). É aquele em que Dilma obteve 53%.

São resultados semelhantes a outros disponíveis. Em abril deste ano, em pesquisa da Vox Populi, Dilma alcançava 57%, Marina 16% e Aécio 12%, quase exatamente os números do Datafolha. Em julho, segundo a CNT, ela obtinha 59% e Aécio 15%, em uma lista sem Marina e com Eduardo Campos (que ficava com 6%).

Em relação a esses levantamentos, Lula cai, passando de 69% (Vox Populi) ou 70% (CNT), aos 56% atuais do Datafolha. Não são listas comparáveis, mas parece ter havido, de fato, uma queda na intenção de voto no ex-presidente.

O relevante na pesquisa de agora é a manutenção da larga vantagem dos candidatos petistas. Traduzindo os resultados no chamado “voto válido”, ambos ficam sempre acima dos 60% e chegam a 64%. O que quer dizer que estão perto de ter, sozinhos, o dobro da soma dos outros.

Bom para os dois. E mau para os demais.

Menos ruim para Marina Silva, que permanece em patamar respeitável, entre 15% e 20%, superior a candidatos com mais bagagem política, como Aécio e Eduardo Campos.

É possível que o Datafolha tenha querido respeitar a precária saúde eleitoral de Serra, não o incluindo nas listas. Mas o que fez foi manter viva a crença de que só o paulista tem condições de brigar com o PT.

Chegamos, assim, ao final de 2012, com perspectivas inalteradas para a eleição de daqui a dois anos. A crer nas pesquisas, o enorme estardalhaço feito para afetá-la foi inútil.

Como está no título de uma comédia de William Shakespeare, pensando na eleição, foi Muito Barulho por Nada.

Artigo dominical de Marcos Coimbra


É Preciso Salvar a Oposição
2012 ainda não terminou, mas já se pode dizer que não foi um bom ano para a oposição. Certamente, não para a oposição institucionalizada, que disputa o jogo político e se expõe às suas incertezas.
Isso é mal para ela, especialmente por estar sendo outro ano desfavorável, depois de vários negativos.
Acresça-se a isso que suas perspectivas de curto e médio prazos também não são alvissareiras.
Passado complicado, presente difícil, futuro incerto.
Tudo isso poderia ser preocupante apenas para ela. Mas o problema, para o País, é que suas agruras deixam inquieta e açodada a outra parte da oposição.  
Em todos os países democráticos, existe uma oposição fora dos partidos e estranha ao mundo oficial da política. Ela é constituída por entidades de diferentes tipos: grupos de pressão, movimentos sociais e de opinião, associações de interesse, às vezes por sindicatos patronais ou de trabalhadores.  
Também pelas parcela mobilizada do eleitorado identificado com os partidos oposicionistas, nas elites, classes médias e no povo.     
O “lulopetismo” é o inimigo declarado das oposições extra-partidárias e informais de hoje em dia. Elas assim batizaram o fenômeno político mais importante deste começo de século XXI no Brasil, o crescimento e consolidação de um partido de origem popular, que chegou ao poder, organizou uma ampla coalizão, mostrou-se competente para governar e, por isso, tem chance de lá permanecer por muito tempo.
Enquanto esteve na oposição, o PT tinha suas “bases”, que iam para as ruas e se manifestavam. O governismo da época morria de medo de seus “tentáculos”: a CUT, o MST e assim por diante.
Mas nada de parecido ao que conhecemos hoje existia: quando a oposição era de esquerda, não havia uma “grande imprensa” para auxiliá-la. O PT e seus aliados dispunham, no máximo, de simpatizantes nas redações de alguns veículos da indústria da comunicação ou de pequenas tribunas na imprensa alternativa. 
O oposicionismo petista tampouco possuía uma articulação empresarial e institucional significativa. Contavam-se nos dedos os empresários maiores, os integrantes do Judiciário, os poderosos que simpatizavam com a esquerda – e os que o faziam eram ridicularizados por seus pares, como se ser petista, para gente de “alto nível”, fosse risível.
A atual oposição extra-partidária detesta o “lulopetismo”.
Os anti-lulopetistas radicais - na opinião pública, nas instituições, nos grupos de pressão e na imprensa - não poupam a tibieza que enxergam nos partidos de oposição. E não confiam em sua capacidade de derrotar o adversário.
Por mais que tenham procurado motivos para se alegrar com a eleição municipal, não há como apagar o que aconteceu em São Paulo. Ou negar que foi a terceira eleição seguida em que a oposição perdeu tamanho.
Por mais fichas que tenham colocado na aposta de que o julgamento do mensalão teria impacto destrutivo, por mais que achassem que o “lulopetismo” sairia dele golpeado de morte, o fato é que os prognósticos para a eleição de 2014 continuam largamente favoráveis ao PT.
Aonde a impaciência e a frustração levarão essas pessoas? 
Se fôssemos os Estados Unidos ou outros países democráticos estáveis, a resposta seria fácil. Mas não somos.
O Brasil precisa de uma oposição partidária e institucionalizada sólida. Sem ela, nunca estaremos livres dos que se acham capazes de “resolver a bagunça”, “acabar com a corrupção” e “limpar a política”. No bem bom, dispensando-se de conquistar um só voto.

Artigo semanal de Marcos Coimbra

Doses Inexplicáveis

Para quem não é jurista, um dos aspectos mais estranhos do julgamento do mensalão é a tal dosimetria.
Quando passaram a discuti-la e aplicar a cada condenado a pena que entendiam cabível, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciaram uma etapa que o cidadão comum tem dificuldade de entender. 
A dosimetria seria uma ciência exata? Aquelas cujos postulados e resultados se expressam na enésima casa decimal? Em que cada milímetro faz diferença e um grama muda tudo?
Para quem está acostumado com as disciplinas que estudam a sociedade e o comportamento dos indivíduos, tamanha precisão não faz sentido. Equivale a supor que as pessoas e seus atos podem ser transformados em fórmulas matemáticas.    
Que sentido real pode haver em uma pena de dezenas de anos, alguns meses e “cinco dias”? O que a fração expressa?
Ficar detido por dez, vinte, trinta, quarenta anos não é punição abundantemente suficiente? O que representam os meses e dias adicionais?
No fundo, tanta precisão serve apenas para fazer parecer que a dosimetria é impessoal, que consiste na aplicação neutra de regras científicas. Que o cálculo do tempo de castigo não decorre do arbítrio do julgador. 
Mas não é apenas na aritmética que a dosimetria do STF é surpreendente.
Os réus até agora condenados receberam penas completamente fora da tradição jurídica brasileira. A começar pelos integrantes do “núcleo publicitário”, aos quais couberam as mais severas.
Qual o sentido de mandar para a cadeia por um período de 20 anos, no mínimo, pessoas que não cometeram qualquer crime de sangue, que não colocaram em perigo  a vida de ninguém, que não representam risco para a ordem pública, com antecedentes comparáveis aos de qualquer pessoa até 2005?
Que foram julgados em primeira e última instância simultaneamente, em nome de uma decisão discutível que estendeu a eles o foro privilegiado? Que, por isso, perderam o direito ao recurso?    
A ideia de que os ilícitos que cometeram são tão graves quanto os que levam assassinos cruéis para as grades é despropositada. É falsa a noção de que “roubaram o dinheiro que iria para hospitais, escolas e creches” e que isso seria motivo bastante para emprisioná-los.   
Nem com malabarismos é possível afirmar que o esquema de arrecadação irregular de que participaram “tirou o leite da boca das criancinhas pobres”. É só olhar os autos do processo.
Resta o argumento de que penas dessa magnitude têm “função pedagógica” e desencorajariam outros das mesmas práticas.   
Primeiro, nada ensina que a hipótese seja verdadeira, como ilustram os casos de regimes  autoritários como o chinês, que estabelece a pena de morte para crimes de colarinho branco e se defronta com problemas cada vez mais graves em relação a eles.
Em segundo lugar, porque o excesso punitivo pode ser tão deseducador quanto a impunidade. 
As prisões desproporcionais dos envolvidos no “mensalão” apenas mostram que alguns são punidos, enquanto a vasta maioria dos que fazem coisas iguais fica livre. O tamanho do castigo confirma a excepcionalidade. 
É como se alguém tivesse que ser punido com excesso para garantir que tudo continue como antes.  
Mas a duração das penas talvez tenha outra explicação. 
Em alemão, existe uma palavra que poderíamos importar: Schadenfeude. Quer dizer sentir prazer com a dor alheia, ficar contente com o castigo do outro. E mais alegre se sofrer muito.    
Os germanistas do STF devem conhecer a frase de Schopenhauer: “Sentir inveja é humano, saborear esse sentimento é diabólico”.
O Tribunal ainda tem tempo de se corrigir. 

Artigo semanal de Marcos Coimbra


O PSDB e seus Dilemas, por Marcos Coimbra

O PSDB precisa aprender com seu passado.
Ou, como reza a sabedoria popular, não conseguirá evitar a repetição de antigos erros.
Está reagindo a outra eleição complicada como fez em relação à anterior. O que sugere que não tirou daquela experiência as lições necessárias.
Seu primeiro equívoco é tentar tapar o sol com a peneira. E acreditar que, assim fazendo, apaga a luz.
Nas eleições municipais de outubro, o partido se saiu mal. Encolheu no número de prefeituras, perdeu vereadores, reduziu sua participação no comando dos principais municípios.
Valorizar vitórias no Norte e em capitais menores do Nordeste é uma parca compensação para o desempenho medíocre nas grandes metrópoles. Nas capitais do Sul e do Sudeste em que teve candidato próprio, perdeu em todas - em algumas ficando do tamanho de nanicos.
A derrota em São Paulo é do porte da maior cidade do País.
Ninguém gosta de admitir fracassos, mas fingir que não existem é péssimo. Com limões azedos, só se fazem limonadas amargas.
Uma das coisas que mais atrapalham a auto-crítica dos tucanos são os amigos. De tanto querer confortá-los, os comentaristas e analistas da “grande imprensa” acabam por dificultar a reflexão que deveriam fazer.
(Logo após a eleição, ainda sob o impacto dos números de Fernando Haddad, um jornal conservador carioca estampou em manchete que os resultados em Manaus e Belém “enchiam de ânimo” o PSDB. Para o bem do partido, tomara que não seja verdade.)
O fato é que o ano termina, para ele, com a perspectiva de um mau desempenho na próxima eleição legislativa. Pior que o da última, que tinha sido ruim.
Também como em 2010, o PSDB sai da eleição falando em “renovação”. Seus principais líderes, a começar por Fernando Henrique Cardoso, dizem-se convictos de que o partido precisa “sangue novo”.
O problema é que os tucanos, pelo menos de uns anos para cá, revelam acreditar mais na conversa de renovação que na sua prática. Gostam de defendê-la, mas, na hora H, refugam.
Há maior exemplo que o ocorrido em São Paulo, quando o partido abortou um processo de prévias partidárias - cujo conteúdo fundamental era a renovação pela base -, para insistir no que de mais antigo tinha a oferecer à cidade?
Pensando bem, foi igualmente por não confiar na renovação que Serra tinha sido candidato a presidente em 2010. De tanto temer o risco de perder com algo novo - como seria a candidatura de Aécio -, o PSDB preferiu a falsa segurança do conhecido.
Assim fazendo, deixou escapar a chance de construir um nome nacional para 2014. Que ainda não tem – pois o senador por Minas Gerais continua a ter pouca visibilidade junto à grande maioria do eleitorado.
Enganam-se os mal informados que creditam o sucesso do PT ao que seria seu maquiavelismo. Os que, por ingenuidade ou má fé, dizem que o “lulopetismo” dá certo às custas de complôs bem tramados.
A dificuldade do PSDB enfrentar seus dilemas é uma das razões do PT ser o que é.

Artigo semanal de Marcos Coimbra


O terceiro turno da eleição municipal começou antes mesmo de o segundo terminar. Enquanto os eleitores ainda votavam, a disputa pelo troféu do “grande vencedor” já estava em curso.
Políticos, lideranças partidárias, observadores e comentaristas entraram em campo desde a manhã de domingo, apresentando sua interpretação do “sentido da eleição” e decretando quais eram, a seu ver, os ganhadores e os perdedores.
Em política, como em várias coisas na vida, às vezes importa mais a versão que o fato. Adequadamente embalada, a narrativa sobre o ocorrido pode até prevalecer sobre o que efetivamente se passou.
É possível ganhar e ser derrotado, assim como perder e posar como vencedor. Depende, no fundo, de quão alto se bate o bumbo na propagação da versão que sobrepuja as outras.
Não que seja decisivo esse terceiro turno. No final da eleição municipal de 2008, por exemplo, a mídia se encheu de análises que afirmavam que o PMDB havia se tornado a “noiva cobiçada” na disputa presidencial seguinte.
Falso. O partido já era, desde a eleição legislativa de 2006, desejado como parceiro por petistas e tucanos, fundamentalmente por ter eleito a maior bancada na Câmara e ter vasto tempo de televisão. Não era por ter muitos prefeitos em cidades pequenas e algumas capitais que queriam se casar com ele.
Todos sabem que isso conta pouco na hora de ganhar a eleição para o Planalto. Pela simples razão que a maioria dos eleitores não acha relevante ouvir o prefeito quando escolhe o candidato a presidente.
Para as oposições e os setores da sociedade - e da imprensa - mais hostis ao que chamam lulopetismo, o terceiro turno da eleição recém concluída está sendo complicado.
De um lado, precisam reduzir o significado do desempenho objetivo de Lula e do PT, especialmente em função do resultado em São Paulo. De outro, têm que produzir “vencedores”, nem que seja às custas de alguma prestidigitação.
O fato é as eleições foram ruins para as oposições. Em especial, para o PSDB.
De 2004 para cá, o total de prefeitos que elegeu, junto com o DEM e o PPS, caiu quase à metade. O número de vereadores diminuiu - apesar do aumento de vagas. Suas bases municipais, tão necessárias para a eleição legislativa, estão se esgarçando ano após ano.
O PSBD não fez, em 2012, o prefeito de nenhuma das 7 capitais das regiões Sul e Sudeste – sequer apresentou candidato em 3 e foi derrotado em 4. No segundo turno, ganhou apenas 5 prefeituras nas 34 cidades dessas regiões que o realizaram.
Saiu-se bem na região Norte e em algumas capitais menores do Nordeste.
Em São Paulo, foi derrotado na capital e viu o PT vencer em 7 das 10 maiores cidades do estado.
Na tentativa de desqualificar a vitória de Fernando Haddad, começou a circular, desde a semana passada, a tese de que é de Serra a responsabilidade exclusiva pela debacle. Que, em outras palavras, o único derrotado foi ele.
Dizer, no entanto, que “A culpa é do Serra!” – como até Kassab se apressa em declarar – expressa apenas parte da verdade.
O que foi julgado e reprovado o ultrapassa: um discurso, uma proposta de governo, uma “turma”. O eleitorado da cidade rejeitou mais que um indivíduo.
Os problemas do PSDB preocupam a democracia. Quando a oposição legítima se enfraquece, abre-se o caminho para toda sorte de fantasia extra-política. É nesse vazio que viceja o golpismo.
Quem perde a esperança de vencer na urna faz de tudo para levar o jogo para o tapetão.

O povo não dá a menor bola para o que pensam os “formadores de opinião”


As eleições de 2012 estão sendo uma desagradável surpresa para a maioria dos analistas da “grande imprensa”. Quase tudo que esperavam que fossem, elas teimam em não ser.
Ficaram atordoados com os resultados de 7 de outubro. Devem ficar ainda mais com os que, provavelmente, teremos no segundo turno.  
Prepararam a opinião pública para a vitória de Serra em São Paulo. Quando, em fevereiro, o PSDB paulista implodiu o processo de prévias partidárias, fizeram crer que um lance de gênio acabara de ser jogado. Para sua alegria, Serra aceitara ser candidato.
Quem leu os “grandes jornais” da época deve se recordar do tom quase reverencial com que a candidatura foi saudada. Fernando Haddad, o novo poste fabricado por Lula, iria ver com quantos paus se faz uma canoa. Teria que lidar com o grão-mestre tucano.
Já tinham antecipado dias difíceis para os candidatos petistas com a doença do ex-presidente. Era, no entanto, apenas o desejo de que ele não tivesse condições de participar da campanha.
Quando Lula entrou em campo para melhorar as condições de disputa de seu candidato em São Paulo, ampliando o tempo de televisão de Haddad mesmo que às custas de uma coligação com Paulo Maluf, nossos argutos observadores decretaram que cometera um erro colossal. Que sepultava ali as chances de seu indicado.
Hoje, percebe-se que acertou no cálculo de que o verdadeiro campeão em rejeição na cidade é Serra e não Maluf. 
Mas a grande aposta que não deu certo é a que fizeram a respeito do impacto do julgamento do “mensalão” nas eleições. Imaginaram que seria dinamite puro. Revelou-se um tiro de festim.
As urnas não evidenciaram a esperada derrota petista. E não é isso que aguardamos para domingo.
Ao contrário, as eleições de 2012 estão se mostrando muito positivas para Lula, Dilma e o PT. Foi o partido que mais cresceu entre os maiores no número de prefeituras, de vereadores, na presença em cidades grandes. Confirmando a vitória em São Paulo e nas capitais em que tem candidatos na liderança, está prestes a conseguir seu melhor desempenho em eleições municipais desde a fundação.
O inesperado dessa performance está levando esses comentaristas a interpretações equivocadas. Cujo intuito é diminuir o significado do resultado do PT.
A primeira é que o “grande vitorioso” destas eleições seria o PSB e seu presidente, o governador Eduardo Campos.
Com todo o respeito, é difícil incluir o PSB entre os grandes. Ganhou 435 prefeituras (no primeiro turno), metade das quais em cinco estados do Nordeste, mais de um quarto em Pernambuco e no Piauí. Como partido, permanece regional, acolhendo, no restante do Brasil, algumas lideranças que lá estão como poderiam estar em qualquer outro.
É do PSB o prefeito reeleito de Belo Horizonte. Mas ninguém que conheça a política da cidade atribui a essa filiação qualquer relevância na reeleição de Marcio Lacerda.
Resta a vitória de Geraldo Julio, no Recife, um feito para Eduardo Campos. O caso é que vencer na capital de seu estado está longe de ser um resultado espetacular para um governador competente.
A segunda versão equivocada é que “ninguém ganhou”, pois a alienação eleitoral é que teria sido a marca das eleições deste ano. Que as abstenções, somadas aos brancos e nulos, é que seriam as vedetes.
Não é verdade. Em algumas capitais, de fato houve um aumento expressivo desse agregado em relação a 2008. Como em São Paulo, em que foi de 24% para 31%.
Na média das dez maiores cidades brasileiras, no entanto, a alienação total aumentou pouco no período, indo de 23,5%  para 26%. Na verdade, ela cresceu mais entre 2004 (quando era de 19,5%) e 2008, que de então para cá.
Ou seja: nem PSB, nem alienação, o maior vitorioso está sendo o PT. Se Haddad vencer, uma chave de ouro para Lula. Justo quando decretaram que enfraqueceria. 
Mais uma vez, o que se vê é que  o povo não dá a menor pelota para o que pensam os “formadores de opinião”. 
Marco Coimbra

Eleição 2012: última semana

por Marcos Coimbra

Termina no próximo domingo a eleição municipal de 2012. Em 50 cidades, os eleitores voltam às urnas para votar em um dos candidatos a prefeito que disputam o segundo turno.
Entre essas, na maior cidade brasileira e outras 16 capitais estaduais.
Foram as eleições mais conturbadas desde a redemocratização. Por decisão sem fundamento técnico, o Supremo Tribunal Federal (STF) resolveu fazer o julgamento do “mensalão” exatamente no meio do período eleitoral.
O ápice dessa “coincidência” ocorre ao longo desta semana, que os ministros consideram adequada para terminá-lo.  
Para não atrapalhar a viagem ao exterior do Relator - certamente de importância fundamental para o País -, vão deliberar a respeito das penas aos condenados nas vésperas da eleição. Em tempo de preparar as manchetes dos últimos dias.
E ainda há quem se preocupe em silenciar os carros de som nessa hora, para que não perturbem os eleitores enquanto refletem sobre sua decisão final!
Parece que o Judiciário não se incomoda que o julgamento interfira na eleição. Como disse o Procurador-Geral da República em inacreditável pronunciamento, acha até “salutar”.
Os principais veículos da indústria de comunicação dedicaram ao julgamento uma cobertura privilegiada. Na televisão, no rádio, na internet, nos jornais e revistas, foi, seguramente, maior que aquela que a eleição recebeu.
Só os muito ingênuos acreditariam que a grande imprensa foi movida por objetivos morais, que estava genuinamente preocupada com as questões éticas suscitadas pelo “mensalão”. Basta conhecê-la minimamente, saber quem são seus proprietários, articulistas e comentaristas, para não ter essa ilusão.
E lembrar seu comportamento no passado, quando fatos tão graves quanto os de agora - ou mais - aconteceram sob seu olhar complacente.
Como mostra nossa história moderna - desde o ciclo Vargas aos dias de hoje, passando pelo golpe militar de 1964 e a ditadura -, a grande imprensa brasileira escolhe lado e não hesita em defendê-lo. Tem amigos e adversários.
A uns agrada, aos outros ataca.  
No julgamento do “mensalão”, a discussão ética sempre foi, para ela, secundária. O  que interessava era seu potencial de utilização política.
Seria engraçado imaginar uma situação inversa, na qual os denunciados não fossem “lulopetistas” e sim representantes dos partidos que hoje estão na oposição. Se o STF fizesse como faz agora, não mereceria o coro de elogios que ouve, não seria tratado como bastião da moralidade.
Seus ministros, ao invés de receber tratamento de heróis, estariam sendo achincalhados.
Especialmente os indicados por Lula e Dilma. Pobres deles! Cada voto que emitissem contra um oposicionista seria suspeito (o que ajuda a entender porque, no caso concreto, exatamente esses se sintam no dever de ser punitivos ao máximo).    
Nunca foi tão apropriada a teoria de que a eleição municipal é a ante-sala da presidencial. Não para a maioria do eleitorado, que não pensa assim. Mas para a oposição - nos partidos políticos, na mídia, no Judiciário, na sociedade.
Fizeram tudo que podiam para transformar as eleições em uma derrota para Lula e o PT. Imaginaram que os dois sairiam delas menores, derrotados nos principais embates. E que, assim, chegariam à eleição que interessa, a presidencial de 2014, enfraquecidos.
Não foi isso que ocorreu nos confrontos que terminaram no dia 7 de outubro. Pelo contrário. Se as pesquisas de agora forem confirmadas, não é isso que ocorrerá no próximo domingo.
Goste-se ou não do ex-presidente e de seu partido, é um fato. E contra fatos, não há argumentos. 

Nas labaredas do Inferno


[...]A ansiedade dos ministros do Supremo Tribunal Federal perante o julgamento do “mensalão” é compreensível. 
Receberam da Procuradoria-Geral da República uma denúncia que os especialistas consideram mais frágil que a que foi feita contra Fernando Collor.
E aquela foi tão inepta que caiu por terra na primeira análise!
O fulcro da acusação é uma palavra inventada por um personagem famoso pela falta de seriedade. Nada, nem uma única evidência foi produzida em sete anos de investigações que demonstrasse que funcionou no Congresso Nacional, entre 2004 e 2005, um esquema de compra de votos para aprovar medidas de interesse do governo Lula.
O que torna a existência da “quadrilha do mensalão” uma fantasia.
Quem duvidar, que leia a denúncia e verifique com seus olhos se ela aponta as votações e os votos que teriam sido negociados (o número do inquérito é 2245 e está disponível no site da PGR,http://noticias.pgr.mpf.gov.br)
Mas nem a fragilidade da denúncia, nem sua falta de sentido, estiveram em discussão em algum momento.
Quando chegou ao Supremo, o julgamento já estava concluído. O veredicto havia sido dado e transitado em julgado.
Exercendo o papel auto-assumido de vanguarda da oposição ao “lulopetismo”, os proprietários e funcionários da grande indústria de comunicação tinham o script pronto. E ai de quem o contrariasse!
O que não quer dizer que o argumento mais forte que usassem fosse o porrete. Uma dosagem equilibrada de ameaça e adulação é sempre mais eficaz.
Se os ministros fizessem o que ela queria, as portas do Paraíso se abririam para eles. Se teimassem em discutir coisas menores - como provas, depoimentos e outros detalhes - a fogueira começaria a arder.
Há alguns meses, o ministro Luiz Fux publicou um livro. Como toda obra técnica, de interesse restrito. Seu título bastaria para afugentar os leigos: “Jurisdição Constitucional”.
O lançamento no Rio de Janeiro, cidade natal do autor, mereceu tratamento vip da TV Globo. Com direito a matéria de 1m30seg nos telejornais da emissora, tempo reservado a assuntos relevantes.
Talvez alguém se perguntasse o porquê do salamaleque. Mas é fácil entendê-lo. 
Quem não gosta de ser bem tratado? Quem não aprecia saber que sua família e seus amigos acabam de vê-lo na televisão? Quem não fica feliz quando recebe um cafuné?
O Paraíso é assim, cheio de carinhos. E quem pode proporcioná-lo pode o oposto. Como dizia Augusto dos Anjos: “A mão que afaga é a mesma que apedreja”. 
Se fôssemos como os Estados Unidos, onde os juízes da Suprema Corte são figuras inacessíveis, quase desconhecidas do grande público, seria uma coisa. Mas não somos. Aqui, nossos ministros adoram o reconhecimento e não hesitam em se revelar. Amam os holofotes. 
Uns fazem saber que andam de motocicleta, outros que são exímios músicos, alguns se apresentam como poliglotas. Identificamos seus times de futebol, os restaurantes que frequentam. Às vezes, até seus negócios e os ambientes inadequados que frequentam. 
Do julgamento do “mensalão”, poderiam sair endeusados, merecendo estátuas e concedendo autógrafos. Bastava que cumprissem o papel que lhes estava reservado.
Ou achincalhados. Tornados vilões.
Cabia a eles escolher o caminho, o fácil ou o difícil.
No fundo, estão fazendo o que a maioria das pessoas faria na mesma situação. Talvez não o que se esperaria deles.
Mas, quem mandou esperar, conhecendo-os? 
Marcos Coimbra

Artigo semanal de Marcos Coimbra


As recentes pesquisas da Vox Populi, do Ibope e do Datafolha, realizadas nas principais capitais nos últimos dias, revelam um quadro que, em seus traços gerais, era previsível.

Incluindo os números de São Paulo, onde os três institutos apontaram cenário muito desfavorável a Serra. Só seus defensores mais extremados terão se surpreendido, pois as dificuldades que o tucano enfrentaria este ano eram óbvias.

As pesquisas confirmam características conhecidas das eleições municipais brasileiras e do funcionamento atual de nosso sistema político. Indicam coisas que sabíamos:
  • A força da reeleição: em todas as capitais em que os atuais prefeitos buscam a reeleição, eles lideram.

A maior vantagem está no Rio de Janeiro, onde Eduardo Paes (PMDB) tem ampla perspectiva de vitória no primeiro turno, apesar de 
enfrentar diversos adversários de biografia conhecida e respeitável.

Em Belo Horizonte e Curitiba, estão na dianteira os prefeitos Marcio Lacerda e Luciano Ducci, ambos do PSB. O mineiro tem um só concorrente de peso, Patrus Ananias, do PT. No Paraná, a situação é de empate triplo, entre ele, Ratinho Junior (PSC) e Gustavo Fruet (PDT).

São três casos de prefeitos que investiram pesadamente na propaganda de suas administrações ao longo do mandato. Não têm novidades a informar aos eleitores, mas fazem agora, usando a imensa mídia “gratuita”, uma personalização dos resultados de suas gestões.

As obras e programas que o cidadão conhecia como sendo da prefeitura são reapresentadas como de autoria do prefeito. Tudo de bom que aconteceu na cidade é mostrado como resultado de sua ação pessoal (e tudo de mau é suprimido).
Talvez nem todos vençam, mas isso ajuda a explicar sua performance.
  • 2- O declínio dos partidos de oposição: considerando o melancólico desempenho de Serra — que parece que sequer estará no segundo turno, para o qual são favoritos Celso Russomano (PRB) e Fernando Haddad (PT)—, os principais partidos de oposição só têm candidatos próprios bem posicionados em poucas cidades.

Desses, apenas ACM Neto (DEM), em Salvador, é considerado competitivo. Moroni Torgan, seu correligionário que disputa a eleição em Fortaleza, dá sinais de que, em breve, será ultrapassado por Elmano de Freitas (PT) e Roberto Cláudio (PSB) .
Se o quadro atual se confirmar, seria possível dizer que o PSDB terminará vencendo em Belo Horizonte e Curitiba, pois tanto Aécio e Anastasia quanto Beto Richa apoiam os líderes.

Pode ser verdade a curto prazo e, para Aécio, será ainda mais relevante, em face da derrocada de Serra. Mas, para o partido, é ruim atravessar mais uma eleição sem apresentar nomes para disputas futuras. Na política, como na moda, é preciso aproveitar as vitrines para mostrar os lançamentos da próxima temporada.

  • 3— A decisão ilusória: embora essas pesquisas indiquem níveis elevados de “definição de voto”, os profissionais do ramo, analisando outras — especialmente qualitativas —, percebem que as certezas dos eleitores são, a esta altura, provisórias.

As campanhas recém começaram e eles se veem alvo de uma comunicação maciça, tão grande que os deixa desconfiados.

O cidadão comum não se sente pressionado a resolver seu voto agora e nem acha que já tem informação suficiente para fazê-lo. Até a eleição, acredita ter tempo para conhecer melhor os concorrentes e se decidir com calma.

Curiosamente, há candidatos que hoje torcem para que os eleitores não mudem de ideia, com a mesma intensidade com que já torceram, em outras eleições, para que mudassem.

O cidadão comum não se sente pressionado a resolver seu voto agora nem acha que já tem informação suficiente para fazê-lo. Até a eleição, acredita ter tempo para conhecer melhor os concorrentes e se decidir com calma.

Artigo semanal de Marcos Coimbra


Ao contrário do que alguns temiam e outros desejavam, as eleições municipais estão entrando no último mês de campanha sem que sejam discerníveis efeitos do julgamento do “mensalão” em seu andamento.
O que já se esperava.
Em nossa história moderna, nenhuma eleição local foi significativamente afetada por acontecimentos nacionais, mesmo quando foram relevantes. Veja-se o que ocorreu em 1992, quando o eleitorado foi às urnas dias após o impeachment de Fernando Collor.
Aquele, que foi o mais traumático evento de nossa evolução política recente e o que mais mobilizou os sentimentos da população, em nada modificou os resultados esperados da eleição. Ganhou quem tinha que ganhar, perdeu quem estava fadado a ser derrotado.
No máximo, a turbulência engrossou o contingente dos deputados dispostos a condenar o ex-presidente na votação na Câmara, pois os que disputavam mandatos não quiseram aparecer na televisão o absolvendo, na contra-mão dos sentimentos populares. O que teve, no entanto, pequeno impacto no resultado.
A única eleição que foge à regra ajuda a entendê-la. Foi em 1985, quando, uma semana antes da eleição, morreram três pessoas em Volta Redonda pela ação de tropas do Exército, que dispersaram a bala uma manifestação dos operários da Companhia Siderúrgica Nacional.
Nos dias seguintes ao tiroteio, todas as pesquisas mostraram o rápido crescimento dos candidatos de esquerda. Era uma eleição especial - restrita às capitais e outras cidades que os militares consideravam de “segurança nacional” -, mas o sentimento se espalhou por todo o país.
Há quem explique a derrota de Fernando Henrique para Jânio Quadros, em São Paulo, pela performance inesperada de Eduardo Suplicy, assim como a arrancada do PT em Belo Horizonte, com Virgílio Guimarães, em função desse fator.
O certo é que o PT ganhou sua primeira eleição municipal em uma capital, elegendo a prefeita de Fortaleza, Maria Luíza Fontenelle, e contrariando todas as expectativas.
E hoje?
Se os eleitores foram votar em 1992 três dias depois do impeachment e já o tinham superado, se o sistema político amadureceu 27 anos depois de 1985, por que imaginar que o “julgamento do mensalão” viraria as eleições deste ano de ponta cabeça?
Nem às custas do enorme espaço que recebe na cobertura dos veículos ligados aos grandes grupos da indústria de comunicação. Apesar de seu esforço, a vasta maioria da opinião pública permanece distante e desatenta ao que se passa em Brasília.
Para ela, o “mensalão” é apenas mais um episódio, entre centenas, dos casos de irregularidades, corrupção, confusões e complicações que caracterizam o cotidiano da política brasileira. Nem mais grave, nem maior que outros. No que tem razão.
Considerando as cidades para as quais dispomos de dados, não parece haver sequer uma em que o “mensalão” esteja sendo discutido pelo eleitorado como algo relevante na decisão a respeito do melhor candidato a prefeito. O julgamento não entrou na agenda da eleição - pelo menos, por enquanto.
Nada mais natural que os candidatos do PT não queriam discuti-lo, mas por que os candidatos da oposição não tocam no assunto na propaganda eleitoral? Talvez por saber que pouco interessa ao eleitor, que espera vê-los discutindo as cidades e apresentando propostas.
Neste final de agosto, poucas mudanças significativas ocorreram nas intenções de voto nas grandes cidades.
Quase nada mudou em relação a julho.
Curiosamente, a única se deu no sentido inverso ao que se imaginava.
Até agora, é tucana a maior vítima destes tempos dominados pela obsessão da mídia com o julgamento. Em São Paulo, José Serra enfrenta o mais sofrido inferno astral de sua carreira.
Mas não é por causa do “mensalão”.

Artigo semanal de Marcos Coimbra


A força dos prefeitos
O debate sobre os efeitos da eleição municipal na política nacional tem tomado um rumo mais realista. Velhas ideias equivocadas estão sendo aposentadas.

Ainda existem aqueles que insistem em enxergar a escolha de prefeitos e vereadores como uma preliminar da eleição presidencial. São os que acham que nosso sistema político é igual ao americano e pensam que elas são equivalentes a uma coisa que existe por lá, as midterm elections, que acontecem a meio caminho entre as eleições presidenciais - para renovar parte do Congresso e dois terços dos governos estaduais, e que costumam antecipar os sentimentos do eleitorado em relação à sucessão na Casa Branca.
A analogia não faz sentido e nossa experiência desde a redemocratização o demonstra. A vitória de nenhum de nossos presidentes decorreu do desempenho de seu partido nas eleições locais anteriores.
Isso vale no atacado e no varejo. Ser o campeão na quantidade de prefeitos não quer dizer nada na hora de contar os votos para presidente. Que o diga o PMDB, que conquista esse troféu a todo ano e que, quando resolveu ter candidato próprio, amargou derrotas acachapantes.
Consciente de que de pouco adianta ter uma tonelada de prefeitos, desde 2002 se contenta com o papel de coadjuvante, fornecendo o vice a quem imagina que vai vencer (nem sempre acertando, mas com ótimo retorno). 
Tampouco é importante, do ponto de vista eleitoral, conquistar as grandes cidades ou a maior de todas. Ganhar ou perder a prefeitura de São Paulo é fundamental para quem lá atua, mas, na política nacional, é puramente simbólico. Quem duvidar que se lembre de 1996: Celso Pitta se sagrou prefeito, Maluf teve uma espetacular vitória e nada mudou na vida política brasileira.

A maioria dos analistas se deu conta que as eleições locais são decisivas por outra razão: nelas, os partidos melhoram ou pioram suas possibilidades de eleger representantes no Legislativo. Muito especialmente, o número de deputados que mandam para a Câmara em Brasília.
O tamanho das bancadas é o primeiro critério que determina o acesso dos partidos aos cargos de comando do Legislativo, desde a Presidência do Senado e da Câmara, à chefia de suas comissões importantes. Parlamentares eleitos por legendas pequenas só chegam aos postos relevantes se tiverem muito prestígio pessoal – e o apoio das maiores.
Leia a íntegra em A Força dos Prefeitos

As denúncias contra Fernando Pimentel

Na campanha que uma parte da mídia faz contra o ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, temos de tudo: pouca informação, muita especulação, reportagem preguiçosa e descaso com os limites éticos do jornalismo. E o velho argumento de que os fins justificam os meios.
Esses veículos se voltaram contra Pimentel no dia seguinte ao da saída do ex-ministro do Trabalho. Pode ter sido coincidência, mas é pouco provável. O que parece é que queriam manter a “crise ministerial” na primeira página. 
Uma das maneiras de consegui-la é misturar gregos e troianos, alhos e bugalhos. Deliberadamente, o “caso Pimentel” foi confundido com outros, diferentes em aspectos fundamentais. Ele virou “mais um” ministro do governo Dilma “envolvido em irregularidades”. 
O mais extraordinário, em seu caso, é que ninguém lhe faz qualquer denúncia concreta. Não há sequer suspeita de que tenha agido de forma errada como ministro ou permitido que alguém fizesse algo condenável no seu ministério. 
Não se beneficiou do cargo para obter vantagens. Não canalizou recursos públicos para finalidades ilegais ou criticáveis. Não roubou nem deixou roubar. 
Sua “irregularidade” teria sido criar uma empresa de consultoria econômica quando deixou a prefeitura de Belo Horizonte, e que funcionou entre 2009 e outubro de 2010. Uma empresa igual a milhares de outras, com faturamento apenas médio.
Para mantê-lo em cheque, o acusam de ter feito, através dela, “tráfico de influência”, sem conseguir aduzir qualquer evidência, minimamente palpável, para corroborá-la. Passaram a questioná-lo no tom inquisitorial reservado, nas delegacias de polícia, a quem é flagrado em delito: “Tudo que você disser será usado contra você”.
Quem imagina que Pimentel saiu da prefeitura, no final de 2008, cheio de “poder presente” e forte de expectativa de “poder futuro”, desconhece a política mineira. Tem, além disso, péssima memória. 
Para ele, 2009 começou mal e só melhorou no final. Nas condições em que aconteceu, a vitória de Marcio Lacerda foi muito menor do que esperava. Seu grupo perdeu espaço e ficou mais fraco dentro do PT. Ganhou a eleição para o diretório estadual em processo complicado e por margem estreita. 
Em abril, Dilma recebeu o diagnóstico de câncer. Embora não parecesse grave, as chances de que fosse presidente — algo em que poucos, então, apostavam —, ficaram ainda mais incertas. 
Quem contratou a consultoria de Pimentel, nesse período, podia querer várias coisas, mas não estava investindo em um “facilitador” em posição privilegiada. Aqueles que imaginam que “traficasse influência” não o conhecem e não sabem o que estava acontecendo. 
Supor que uma instituição como a Fiemg — a principal cliente da empresa de Pimentel, que, sozinha, representou cerca de 50% de suas receitas — o tivesse procurado para isso não tem ideia do que ela é. Ignora sua capacidade de encaminhar os pleitos da indústria mineira sem ter de recorrer a métodos desse tipo. 
(A Fiesp tem, em seus quadros, diversos ex-ministros e autoridades do governo Fernando Henrique. Estaria investindo em “facilitadores futuros”? Ou apenas entende que são pessoas de grande contribuição e que é seu papel mantê-las na ativa?)
Inventar que a empresa de Pimentel foi contratada por uma firma de Pernambuco por “manobra” do governador Eduardo Campos, “em retribuição” a seu apoio a um candidato do PSB na eleição de Belo Horizonte, é apenas um exemplo das especulações que andamos ouvindo nos últimos dias. Pareceriam cômicas, se o episódio não fosse lamentável. 
Confundir-se com datas (achando, no caso de outro cliente de Pimentel, que um recebimento que aconteceu depois explica um pagamento feito antes), calcular os preços de obras com aritmética de escola primária (sem levar em conta custos de infraestrutura), ignorar os mecanismos de licitação de uma prefeitura como a de Belo Horizonte, não apurar quem representava determinada empresa na época relevante, são sinais da pressa na reportagem.
Ou do desmazelo. 
Para não falar no uso de informações obtidas ilegalmente. Toda a “denúncia” está assentada na mais condenável espionagem de uma empresa privada.
É possível concordar que existem situações especiais que autorizam a imprensa a ir além da “legalidade formal”. Esse, no entanto, não é o caso, quando determinados veículos apenas não gostam de um governo e seus integrantes.

de Marcos Coimbra
presidente do Vox Populi

O Brasil dito pela escória

Passamos um pedaço da semana ocupados com um assunto menos importante que parece. Foi suscitado pelo correspondente do jornal espanhol El País, em artigo em que discorria sobre sua dificuldade de entender por que os brasileiros não ficam “indignados” com o Brasil. Em especial, por que não saem às ruas para protestar contra a falta de ética e a corrupção.
O texto foi republicado por O Globo, três semanas depois de ter saído na Espanha. Parece que a direção do jornal carioca ficou indignada com a falta de repercussão do texto original. Resolveu traduzi-lo e mandou fazer reportagem de capa a respeito do tema.
O autor, Juan Arias, deve ter ficado satisfeito com a deferência de seus colegas. Voltou à discussão na terça feira, dessa feita em matéria intitulada “A imprensa se converte no paladino contra a corrupção no Brasil”. Titulo tão surpreendente para quem conhece as corporações da mídia brasileira que só pode ser explicado como retribuição ao destaque que recebera.
Suas ideias foram encaixadas no modelo de interpretação de nossa realidade que é típico das redações dos grandes jornais. Nele, tudo é explicado a partir de uma premissa: os males do Brasil são culpa de Lula e do PT.
É fácil interpretar nossa realidade política e social sabendo, de antemão, a resposta a todas as perguntas. Qualquer coisa pode ser assim compreendida, incluindo a “apatia da sociedade” que não se indigna e não reage contra tudo de errado que existe.
Como afirmou o editorial de O Globo: “O fenômeno da inapetência política diante do assalto aos cofres abastecidos pelos pesados impostos pagos pelo contribuinte tem múltiplas raízes. A mais profunda deriva da bem-sucedida execução de um projeto de cooptação com dinheiro público...(através de organizações) convertidas em correias de transmissão do lulopetismo”.
O engraçado no raciocínio é que a “raiz profunda” da pequena disposição contestatória da população teria nascido outro dia. Se foi obra do “lulopetismo”, é de imaginar que, antes que Lula chegasse ao poder, o problema inexistisse.
Na visão singela do editorialista, talvez fossemos, até 2002, uma sociedade de ampla participação popular, onde o povo vigiava os políticos e só tínhamos a corrupção que passava despercebida. Foi quando veio Lula e estragou tudo.
Não parece que Juan Arias concordaria com uma tese tão superficial. Seu texto não atribuía ao “lulopetismo” a responsabilidade pela situação que o deixava perplexo. O que discutia eram os traços gerais de nosso sistema político, em nada circunscritos a um partido ou governante. A “indignação” que cobrava não seria do povo contra o governo federal, mas também o Congresso, a política nos estados e nos municípios.
O texto tratava Dilma de maneira peculiar. Para ele, “(...) curiosamente, a mais irritada com o ataque dos políticos aos cofres públicos parece ser a primeira presidente mulher”. Ou seja, apesar da lamentada ausência do “povo nas ruas”, ela seria “indignada” o suficiente para não aceitar a corrupção e estaria dando mostras disso no modo como enfrentou os casos Palocci e Alfredo Nascimento.
Nem se precisa dizer que essa avaliação esteve totalmente ausente nas repercussões do texto no Globo. Admiti-la implicaria abrir mão do modelo em que o “lulopetismo” é o grande culpado.
O assunto acabou fazendo um percurso curioso. Primeiro, um correspondente estrangeiro escreveu um artigo com o olhar característico de quem vê de fora nossos problemas. Daí, achando que era instrumental, um jornal local o importou, adaptando-o à sua visão.
Foi buscar lá fora argumentos que referendavam suas ideias e lhes davam certo ar cosmopolita, mesmo algumas que o texto inicial não subscrevia. Terminou como se o El País condenasse o “lulopetismo”.
Não era isso, mas quem se importa? Em redações como a desse jornal, a única coisa relevante é combater.
por Marcos Coimbra