Os ladrões e o dinheiro

As vítimas é que serão condenadas

- O título acima é meu, o do autor do texto está abaixo. É que de fato, na minha opinião essa é a verdade, o mais é dourar a pilula - 

A raposa e o galinheiro, por Nelson Marconi no seu Facebook
O governo enviou esta semana ao Congresso esta semana o projeto de lei que trata da autonomia do Banco Central (BC). Seus principais pontos são a impossibilidade de demissão do presidente do BC pelo Presidente da República (apenas pelo Senado), excetuando-se os casos usuais de improbidade, etc, a definição de um mandato para o presidente do BC que não coincida com o do Presidente da República, e a impossibilidade de responsabilização dos diretores do BC pelos erros na condução da política monetária e cambial e na regulação do mercado financeiro. O projeto pode parecer, à primeira vista, o supra sumo da modernidade, mas não é bem assim, muito pelo contrário. É, inclusive, semelhante ao que foi instituído para as agências reguladoras no passado que, como sabemos, parece que não têm funcionado muito bem. Com um agravante – trata de um assunto que a população não conhece e impacta todos sem distinção – a política monetária. Vou explicar a seguir.
Existe um regime de metas de inflação no Brasil segundo o qual, uma vez definida essa meta, o Banco Central deve operar a chamada política monetária para levar as pessoas, empresas e bancos a acreditarem que a inflação ficará em torno da meta fixada. Essa política monetária visa controlar, em última instância, a taxa de juros do mercado e a quantidade de crédito na economia. Se a taxa de juros sobe, o impacto sobre o nível de atividade e emprego é negativo e, assim, o BC espera que as pressões de empresas e trabalhadores por aumentos de preços e salários sejam menores. Ninguém gosta de falar isso, mas quando o Banco Central quer reduzir a inflação, acaba provocando desemprego. E quando quer estimular o nível de atividade, também consegue, reduzindo a taxa de juros. Além disso, a sua política de juros consegue controlar a taxa de câmbio, exercendo impacto tanto sobre os preços como o setor produtivo nacional. É, portanto, um instrumento de política econômica poderosíssimo.
Hoje, o BC já dispõe de autonomia suficiente para praticar a política monetária necessária para tentar cumprir a função que lhe é atribuída – levar a inflação a ficar dentro da meta. Existem uma série de regras que disciplinam a sua ação. Faltam, na verdade, mecanismos maiores de transparência e responsabilização pela atuação de seus dirigentes. Qual é, portanto, o objetivo deste projeto? Um deles é esse último – reduzir a possibilidade de responsabilizá-los. O outro é ainda pior – retirar a prerrogativa do Presidente da República de nomear um Presidente do Banco Central e seus diretores em seu início de mandato e demiti-lo se achar necessário. Justamente daqueles que vão gerir um assunto tão importante como a política monetária, instrumento fundamental tanto da política de crescimento econômico como de controle da inflação.
No fundo, os defensores do projeto estão afirmando o seguinte: o Presidente da República e os ministros da área econômica são incompetentes para gerir a política econômica, portanto uma parte dessa política deve ser “insulada”, isso é, protegida das más influências da política strictu sensu, e a forma de fazê-lo é entregar a condução da política monetária aos que entendem do riscado e protegê-los das influências externas. Alguém tem dúvidas sobre quem seriam aqueles que entendem do riscado, na visão dos defensores da ideia? Os profissionais do mercado financeiro, logicamente. Seriam aqueles que teriam uma visão técnica e neutra do ponto de vista político…. como se emprego, crescimento e inflação não fossem assuntos totalmente afeitos aos interesses dos diversos grupos da sociedade e não afetassem a toda a população. Inclusive aos interesses do mercado financeiro.
Como, só para agravar, o mercado financeiro é altamente concentrado no Brasil – vejam tabela abaixo, publicada pelo próprio BC, que mostra como os ativos são concentrados em cinco instituições e como isso piorou nos últimos anos -, quem vocês acham que indicaria os dirigentes e desenharia a política monetária do país? É o típico caso da raposa cuidando do galinheiro.
Na verdade, os mecanismos de transparência, controle e responsabilização das atividades do BC, como em qualquer sociedade que se queira moderna e democrática, deveriam ser ampliados, e não reduzidos, como quer o projeto. Países mais avançados não se descuidam destes mecanismos. Vejam os exemplos na Austrália e Nova Zelândia, por exemplo, países que os liberais adoram festejar. O Conselho Monetário Nacional, que define a meta de inflação, a ser perseguida pelo BC, deveria ser ampliado – hoje é composto apenas pelos Ministros da Fazenda, Planejamento e do Banco Central. Os empresários do setor produtivo e trabalhadores também deveriam participar da discussão em torno dessa definição. É o oposto do que propõe o governo.
Esse assunto é muito sério, extremamente importante para a sociedade e urge que a população entenda os efeitos desse projeto de lei sobre todos. Não é fácil, e é nossa tarefa explicar isso. Temos que debate-lo e estressá-lo muito. Do contrário, as pessoas vão achar que é uma questão meramente técnica e o mercado financeiro vai, fácil fácil, aprova-lo no Congresso, o que será muito prejudicial para o país e todos que estão interessados em seu crescimento. Os bancos estão cuidando dos interesses deles. Temos que cuidar dos interesses da nação. Certamente não são os mesmos.
*Economista desenvolvimentista, mestre e doutor em economia pela FGV-SP, professor da FGV.
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Crônica dominical

A revolução das baratas

No dia em que a barata Gene viu sua mãe ser brutalmente assassinada por um chinelo, decidiu que era hora da revolução começar

Havia décadas que as baratas pensavam em realizar um grande levante. Estavam cansadas do ódio peculiar que os seres humanos sentiam por elas, figurando como o inseto mais repulsivo do planeta Terra. Injustiçadas, odiadas, temidas. Mal podiam surgir em um ambiente, e o pânico se instalava por completo. Fêmeas e machos subindo aos gritos em cadeiras. Mas sempre havia 2 ou 3 algozes, psicopatas, empunhando chinelos e listas telefônicas, olhos vermelhos injetados, a boca espumando, ansiosos pela carnificina. E se as baratas não fossem rápidas o suficiente, jazeriam mortas, as patas para cima. Seu poderoso casco de quitina não seria forte o bastante para lhes salvar a vida.
E Gene era a líder da revolução baratística. Tinha uma inteligência incrível, uma memória invejável e uma estratégica mente militar. O assassinato da mãe diante dos seus olhos, alguns meses antes, fizera despertar o que lhe faltava para liderar a revolução: o ódio. O plano estava parcialmente definido, mas era preciso esperar o momento certo. Sua melhor amiga, Salete, sempre se postava como a temerosa:
– Mas estamos realmente prontas?
– Nunca antes estivemos tão prontas. – A voz de Gene trepidava com sua raiva incontida. – Em breve, teremos nossa vingança. Os humanos pagarão cada gota de hemolinfa derramada.
– Não sei, não. Tem coisa errada, Gene. Os números não batem.
– Como assim? Salete mostrou um esboço.
– Em nosso último censo militar, ficou constatado que somos 85 baratas para cada humano. Agora, pense comigo: a maioria dos humanos não tem mais do que dois ou três filhotes. E muitas das fêmeas deles nem se reproduzem. Mas nossas fêmeas, em apenas 150 dias, chegam botar 320 ovos. A proporção não bate, Gene. Deveríamos ser milhares ou milhões de baratas para cada humano. Onde estão as outras?
– Você não sabe onde elas estão?
– Não.
– Estão mortas, Salete – arrematou, séria. – A diferença na sua estatística é o número de irmãs assassinadas injustamente. Sentenciadas à morte por chineladas e sufocamento venenoso, enquanto os algozes gritam “nojenta”, “maldita”, “desgraçada”. Houve um silêncio entre as duas amigas. A verdade calou qualquer argumento.
Revolução das baratasNaquele mesmo dia, uma notícia se espalhou entre as baratas. Ninguém sabe como, mas as baratas tomaram conhecimento de que, no próximo mês, os humanos em todo o planeta dormiriam durante uma hora, simultaneamente. Era a oportunidade que Gene tanto esperava. Salete desconfiou:
– Como assim?
– É a nossa chance, Salete.
– Por que os humanos vão dormir todos ao mesmo tempo?
– Você deveria estar me perguntando sobre nossa estratégia de ataque.
– É só que me parece estranho.
– Faremos um ataque simultâneo, em todo o mundo. Atacaremos os humanos enquanto estiverem dormindo.
– Vamos comê-los?
– Não, minha querida. Pelo menos, não enquanto estiverem vivos. Isso os acordaria.
– Então, o que vamos fazer?
– Vamos sufocá-los.
– Como?
– Vamos entrar em suas bocas, e invadir suas vias respiratórias.
– Mas…
– Um ataque em massa. Dezenas de baratas saltando sobre a boca de cada humano. Eles não terão chance de qualquer reação.
– Isso significa que…?
– Sim. Algumas terão de se sacrificar. Mas seus nomes ficarão registrados na história. Figurarão na literatura como as baratas que conquistaram a liberdade para suas filhas e irmãs.
O plano estava traçado. Gene enviou baratas mensageiras para que avisassem cada um dos exércitos alocados em despensas, esgotos, sótãos, porões, e até nas matas. As baratas em todo o planeta precisavam saber. Todas elas deveriam sair dos seus esconderijos e lutar pela liberdade. A história propagada pelos humanos de que, para cada barata avistada existem mil escondidas, mudaria. Naquela noite, os humanos veriam todas elas, mas desta vez, seriam elas a ter os olhos injetados, e a boca espumando de ódio. E exatamente um mês depois, a guerra teve início.
Gene saiu pelo ralo do banheiro seguida por seu posto avançado de 249 baratas. Era meia-noite. Encaminharam-se lentamente para os quartos dos humanos, ansiosas pelo ataque final. Em questão de menos de uma hora, a raça humana estaria extinta da face da Terra. Chinelos e inseticidas nunca mais seriam produzidos.
Gene ainda salivava de ódio, quando ouviu um estranho zumbido. Ergueu lentamente a cabeça. Logo acima, parcialmente camuflada pela escuridão, viu uma figura familiar: o general Tod, uma vespa-joia. Ele estava a frente do que pareciam 3 ou 4 centenas de vespas e marimbondos.
O coração de Gene saltou-lhe à boca. Seu cérebro começou a juntar as peças e tudo se encaixou. Salete tinha razão. O sono coletivo dos humanos não podia ser verdade. O boato havia sido um embuste criado pelas vespas, as maiores inimigas das baratas, depois dos humanos. Em um relance, Gene já podia ver seus corpos sendo arrastados para buracos e servindo de alimento para larvas de vespas.
Gene virou-se para seu exército e, quase sem voz, gritou:
– É uma cilada… Fujaaaaam!
Mas era tarde demais. Ao grito de comando do General Tod e dos outros milhares de generais vespas de emboscada em todo o mundo, o ataque histórico das vespas contras as baratas começou. Vários anos depois, os jornais ainda noticiariam o misterioso desaparecimento de todas as baratas do planeta terra. A culpa, para todos os efeitos, recairia sobre o aquecimento global.
de Juliano Martins
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Consumo do brasileiro tem queda recorde




Brasil 247 – Sem dinheiro, sem crédito, sem esperança no futuro e ameaçados por um desemprego cada vez maior, os brasileiros deixaram de consumir até itens básicos. "Pressionado pelo aumento do desemprego e da inflação da comida e também pela queda na renda, o consumo de alimentos, bebidas, produtos de higiene e limpeza dentro da casa dos brasileiros sofreu um baque neste início de ano. Em janeiro e fevereiro, houve uma queda de 5,2% no número de unidades de itens básicos comprados pelas famílias em relação ao mesmo período de 2018, aponta pesquisa da consultoria Kantar. Foi a primeira retração para o período em cinco anos", informa reportagem publicada pela jornalista Marcia de Chiara, no jornal Estado de S. Paulo.
"Também foi a primeira vez desde o início da pesquisa, em 2014, que houve recuo nas compras de todas as cestas de produtos, com retrações importantes em produtos básicos e de difícil substituição. Entre os itens que mais contribuíram para a queda do consumo em unidades das respectivas cestas estão açúcar (alimentos), papel higiênico (higiene), leite de caixinha (lácteos), detergente em pó (limpeza) e cerveja (bebidas)", escreve ainda a jornalista.
"Fiquei chocada com o resultado. É uma queda bem forte que ocorreu em todas as classes sociais e regiões do País", afirma Giovanna Fisher, diretora da consultoria e responsável pela pesquisa.
Segundo a reportagem, a classe C foi a que mais retraiu o consumo. :O que chama também a atenção nos resultados é que, além de ir menos vezes às compras, a cada ida ao supermercado o consumidor levou uma quantidade menor de produtos para casa. Esse movimento traduzido em números significou uma queda de 2,2% na frequência de compras no bimestre em relação ao ano anterior e redução 5,7% no número de unidades adquiridas a cada compra", diz Marcia de Chiara.
Com esta política econômica de desempregar e diminuir a massa salarial do país, o que esperar? Que planta abacaxi e colhe manga? Só acreditando na ministra da agricultura de Bolsonaro.

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Destaque da semana: Bolsonaro proibiu o uso de 7 pronomes de tratamento


Estão banidos:
Vossa Excelência ou Excelentíssimo, Vossa Senhoria, Vossa Magnificência, doutor, ilustre ou ilustríssimo, digno ou digníssimo e respeitável. Categórico, o decreto anota: "O único pronome de tratamento utilizado na comunicação com agentes públicos federais é 'senhor' [ou 'senhora'], independentemente do nível hierárquico, da natureza do cargo ou da função ou da ocasião." Vale inclusive para o presidente.
(...)
Deve-se louvar o decreto de Bolsonaro. Não soluciona os problemas do país. Mas elimina o Brasil irreal que ofendia a inteligência coletiva num simples envelope, numa reles correspondência, num pronunciamento ordinário. O decreto de Bolsonaro deu novo sentido ao governo. Acabou o vale-tudo semântico. Num tributo à lógica, Bolsonaro decretou a existência de um governo isento de 'excelências'. A sinceridade é uma nobre virtude. 

Leia a postagem na íntegra Aqui
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Esperando por Isabel, por Elika Takimoto


Fui almoçar em um self service baratinho no Flamengo. Na entrada, uma menininha linda de uns sete anos me interceptou:

- Tia, me paga um prato de comida. Eu quero comida. Tô com fome. Quem vai negar um prato de comida para uma criança?
- Claro. Vamos, falei. Qual seu nome?
- Isabel, tia.
- Vamos lá, Isabel. Assim que entramos ela começou:
- Pode ser quentinha? É que eu preciso levar para meus irmãos também, tia.
- Quantos são?, perguntei.
- Muitos, tia. Respondeu ela olhando para as opções. Pode ser quentinha, tia?
- Claro. O que você quer que eu coloque aqui?
- Arroz, tia. Coloca muito arroz. Agora feijão, tia. Purê de batata. Mais purê. Macarrão, tia.
- Não quer legumes? Uma salada também? Não quer?, insisti como faço com meus filhos.
- Não, tia. Quero comida. Carne, tia. Pode colocar carne também?
A quentinha deu 40 reais de tanto peso. Geralmente pago menos que 15 no meu prato. Entreguei para Isabel com uma garrafa de refrigerante que ela havia escolhido. Isabel pegou tudo e saiu correndo.
Fiz meu prato e sentei para almoçar com calma.
Em poucos minutos, vi Isabel mais uma vez com outra tia apontando o que queria colocar na quentinha. Lá saiu Isabel apressada com outra marmita...
Logo depois, veio Isabel segurando a mão de um tio de novo. O tio olha para ela carinhosamente e coloca tudo o que Isabel quer.
Nessa hora eu estava pagando e resolvi seguir Isabel. Ela foi ali para a praça do Largo do Machado. Havia várias pessoas com cobertores sujos, roupas rasgadas, sentadas no chão e deitadas em cima de papelão esperando por Isabel.
Isabel não mentiu. Ela dava comida para “seus irmãos”.
Tão pequena e já carrega a responsabilidade de um Estado e a pressa - daqueles que entendem a necessidade - de alimentar um Brasil.
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Mais uma prova que Lava Jato é uma operação a serviço dos EUA


Pouco antes da Lava Jato (Rio de Janeiro), o juiz (?) Marcelo Bretas fez curso no Doj e FBI

As relações entre o Judiciário brasileiro e o Departamento de Justiça resultou na Lava Jato, conforme já mostramos aqui, inclusive mencionando documentos do Wikileaks.
Dezesseis 2015 havia indícios claros dessa cooperação e da maneira como juízes e procuradores do Paraná se valeram do álibi do combate à corrupção para destruir a engenharia nacional, especialmente as empresas que competiam com grupos americanos na América Latina e África.
No Rio, a Lava Jato teve igualmente um viés econômico nítido, que não pode ser atribuído unicamente à ignorância e exibicionismo de procuradores e juiz despreparados. A maneira como investiram contra o BNDES, contra o financiamento da exportação de serviços, seguiu a mesma lógica de desmonte da economia do grupo do Paraná.
Agora documentos divulgados mostram que o juiz Marcelo Bretas – o Sérgio Moro do Rio de Janeiro – participou de cursos nos Estados Unidos, inclusive no FBI, nas vésperas de estourar a Lava Jato no Rio de Janeiro.
De janeiro a março de 2105, Bretas frequentou o programa Visiting Foreign Judicial Fellows do Centro Judiciário Federal. Teria trabalhado em um artigo sobre o sistema legal dos EUA, e a maneira como equilibra as necessidades da aplicação da lei com os direitos individuais de privacidade. 
Pouco depois, explodia a Lava Jato carioca. 
https://www.fjc.gov/sites/default/files/2014/About_FJC_Portuguese_2007_Aug.pdf
http://www.stj.jus.br/internet_docs/vagaCNJ/2015_CNJ_JUIZ/MARCELO%20DA%20COSTA%20BRETAS_EDITADO.pdf 
do GGN
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Esse lugar desconhecido, o coração, por Orlando Souza

O homem é fascinado pelo desconhecido.
A paixão do homem pelo que não conhece remonta todos os princípios.

É impressionante!

Quase sempre, o desconhecido fica ao fundo, no fundo.
O desconhecido mora longe. Pode - ou não - às vezes está distante. 

Remotamente.
Como Europa.

Não o continente.
Falo da Europa, uma das 79 luas de Júpiter.
Júpiter é o maior planeta do sistema solar, separado por incríveis 628.800.000 quilômetros do nosso Planeta.
É no "ventre" de Europa que dorme um esplêndido oceano no fundo de uma crosta de gelo.

Daí que o homem, delirantemente "viaja" pelas lonjuras de Europa.

 Quem vê, é capaz de imaginar que o fato de ter avistado a inexplorada lua de Júpiter tivesse sacramentado a sede de descoberta do insaciável homem, pondo nela um ponto final.

Com a nossa Lua, que tem um guerreiro por inquilino, também foi suscitada a ideia de que, ao ocupá-la, a humanidade atingira seus limites.
Afinal, falou-se que o céu era o limite. E eu quase acreditei que era.

Não era. Pelo menos não o único limite. Ou até poderia ter sido.
Não é mais!

O foco agora tem mais profundidade e é bem mais desconhecido ainda.
O limite agora é o fundo, máximo, absoluto e literal. 

Do mar.

Conhecer as abissais distâncias fincadas nas crateras oceânicas onde abunda a estupidez de uma escuridão só comparada ao negrume do céu que encobre Netuno.

Para chegar lá é necessário escalar um Monte Everest de cabeça para baixo e descer 8,850 quilômetros até os confins de uma fenda feita na rocha.
 A rachadura de Marianas, situada ao sul do Oceano Pacífico, com 70 quilômetros de largura e outros 2.500 de extensão.

 A Crônica da Semana propora-se na sua nascente, explorar outro universo, que não o espacial ou sideral, nem o marinho ou oceânico.
Não que isso não seja apaixonante, mas este fazedor de crônica sonhou em descortinar os mistérios de uma terra onde até aqui ninguém conseguiu ainda pisar. Um lugar cujo fundo é misteriosamente desconhecido.

Que lugar é esse e saber se verdadeiramente existe e, existindo, em que parte do universo está localizado é – parafraseando os poetas – mister para escritores, médicos, advogados, filósofos e cientistas...
�Eureka!
Esse lugar é o coração!

Mais do que as crateras abissais do mar e as inimagináveis galáxias e sistemas solares de sóis distantes e desconhecidos, há sim, um mundo – um mundo em mim, chamado coração – que é só meu e somente a mim cabe explorar o seu inacessível território, o terreno solitário das minhas emoções, das minhas forças e das minhas virtudes, dos meus vícios e dos meus defeitos.

A mim e somente a mim foi reservado o direito de imergir em mim mesmo e de expressar o que sou em essência.
Porque o meu coração é, a depender da minha disponibilidade e decisão, um habitat de indecifrável mistério pessoal.

Eu sempre tive a percepção de que, se existe um lugar que ninguém conhece, esse lugar não é a rachadura de Marinas nem as depressões lunares ou coisa do tipo. O lugar menos explorado e mais desconhecido é, sem dúvida, o coração.

Estou convencido de que o fundo mais fundo é o fundo do coração.

Meu coração é um lugar que só eu posso conhecer, que só eu posso dizer à humanidade como é.

Nós podemos até amar algo ou alguém, afinal, disseram que só amamos o que conhecemos, talquey?

Todavia, eu sinto informar que, a despeito de toda evolução filosófica e científica, o homem segue sendo incapaz de detectar o que se passa no íntimo de uma pessoa – da que ele mama, inclusive.

O coração é um lugar fabuloso e controverso, misterioso e apaixonante em cujas "terras" ninguém jamais ousou botar os pés.

Não há quem o conheça.

Ainda que nós estejamos juntos no ônibus e na mesma poltrona, dividindo a mesma sala no trabalho.
Eu não te conhecerei nem nada poderei conjecturar em pensamento ainda que a partir de tuas reações mais naturais.

Não importa que chores comigo ou agracie-me com o teu melhor sorriso...  Seja tu voluntária, espontânea ou coagida... é-me absolutamente impossível a certeza de que é aquilo que se passa no teu interior.

Sendo que, se ninguém mais pode sentir por nós, que não haja quem possa falar as palavras que estão na nossa boca, é mais que uma necessidade, é um dever, uma questão de honra dos outros saber quem somos.

Há quem pressuponha ser nossa obrigação – nós podemos e devemos – dizer ao mundo a que viemos. É nossa obrigação moral, isso!

A gente sempre pode dizer algo distinto daquilo que realmente pensa, sente ou crê o coração. Você deve saber.

Enquanto cientistas criam lentes espetaculares para capturar vistas espetacularmente distantes no Cosmo e inventam cápsulas marinhas para "ancorar" no ponto mais profundo da Terra, um mundo imenso e pulsante espera ser explorado do lado de dentro de nós.
Aqui dentro do peito.

A Ciência e até a ficção científica, esta talvez em maior escala, tem se voltado para outros fundos que não o do coração, mas o dos oceanos, por exemplo. 

Faz tempo que se percebe que o fundo dos mares forma um ambiente nada inóspito com uma biodiversidade no mínimo igual à da terra.

A estimativa é de 10 a 100 milhões o total de espécies submarinas que vivem no anonimato do fundo dos mares.
 
Só para efeito de comparação, o fundo dom mar é tão desconhecido que de cada seis pessoas que pisaram na Lua, apenas uma o visitou.

Vejam vocês, quanta ignorância, a nossa!
 
Que a Lua é uma rocha coberta de poeira composta de ferro em seu núcleo. Que a Lua reflete a luz do Sol. Sabemos!

Que Europa é uma lua – um satélite que gravita ao redor de Júpiter. Que Europa é uma rocha grávida de um mar ultra gelado. Sabemos!

Que 71% da terra é coberta por água. Sabemos!

Que quase toda superfície marinha está mergulhada em águas abissais, a mais de 3 mil metros de profundidade. Sabemos!

Que cerca de 95% do fundo dos oceanos nunca foi tocado pelo homem. E que menos de 1% foi pesquisado biologicamente. Sabemos!

Que o último buraco negro fotografado foi chamado de "monstro" pelos cientistas, mede cerca de 50 milhões de anos-luz da Terra e tem 40 bilhões de quilômetros de diâmetro – o que dá mais ou menos 3 milhões de vezes o tamanho de nosso planeta. Sabemos!  
 
Sabemos de quase tudo, né mesmo?

Ainda que de muito, saibamos tão pouco, ainda.
 
Pena que – se é que não devamos festejar tal fato – pena que do coração do outro não saibamos quase nada.

Se é que isto seja verdade, acalma aí o teu coração e mantém no buraco negro do peito os teus mistérios e segredos. 
 
O coração é e haverá de ser por outros incontáveis anos, o que sempre foi:

Um lugar desconhecido.
 
(OrlandoDeSouza)