Saul Leblon - cinco derrotas e um lance decisivo

Da ampliação da democracia depende a sorte das famílias assalariadas, a repartição da renda e a cota de sacrifícios em um novo ciclo de crescimento.

Muitas vezes, a janela mais panorâmica de uma época não se materializa no indispensável esforço conceitual para descortinar a sua essência, mas em um evento simbólico catalisador.

O passo seguinte da história brasileira carece ainda dessa síntese que contenha as linhas de passagem para um novo ciclo de desenvolvimento.

A simplificação analítica, o simplismo ideológico são incompatíveis com essa sinapse entre o velho e o novo, projetando-se mais por aquilo que dissipam do que pelo que agregam.

Nenhum polo do espectro político está imune a essas armadilhas. Mas até pela supremacia do seu poder emissor é o conservadorismo que tem liderado o atropelo da tentativa e erro nesse embate.

Durante meses, por exemplo, o imperativo 'não vai ter Copa' –e tudo aquilo que ele encerra de denuncismo derrotista - reinou soberano na mídia como uma metáfora esperta do 'não vai ter Dilma'.

Quando os fatos desmentiram a pretensa equiparação do Brasil a um Titanic - a Copa ,independente da seleção, é um sucesso de público, de infraestrutura e de qualidade esportiva - partiu-se para algo mais explícito.

O camarote vip do Itaú –o banco central do conservadorismo – entrou em cena para mostrar os sentimentos profundos da elite em relação ao país.

Repercutiu, mas não pegou.

Embora o martelete midiático tenha disseminado a bandeira do antipetismo bélico, a ponto de hoje contagiar setores populares, como admite --e sobretudo adverte-- o ministro Gilberto Carvalho, o fato é que esse trunfo conservador não reúne a energia necessária para inaugurar uma nova época.

A grosseria dos finos exala, antes, seu despreparo para as tarefas do futuro.

Não quaisquer tarefas.

O país se depara com uma transição de ciclo econômico marcada por uma correlação de forças instável, desprovida de aderência institucional , ademais de submetida à determinação de um capitalismo global avesso a outro ordenamento que não o vale tudo dos mercados.

Um desaforo tosco é o que de mais eloquente as 'classes altas' tem a dizer sobre a sua capacitação para lidar com esse supermercado de encruzilhadas históricas.

Não é o único senão.

Nas últimas horas ruiu também a simbologia conservadora da retidão heroica e antipetista, atribuída à figura de Joaquim Barbosa.

Na última 3ª feira, o presidente do STF jogou a toalha respingada de ressentimentos, ao abandonar a execução da AP 470.

Não sem antes grunhir, em alemão, o menosprezo pelas questões mais gerais da construção da cidadania no país.

'Es ist mir ganz egal' , sentenciou sobre as cotas reclamadas por negros e índios no Judiciário.

'Para mim é indiferente; não estou nem aí'.

Esse, o herói dos savonarolas de biografia inflamável.

Seria apenas o epitáfio de um bonapartismo destemperado, não fosse, sobretudo, a versão germânica da indiferença social.

A mesma inscrita no jogral dos que se avocam à parte e acima daquilo que distingue uma nação de um ajuntamento humano: a pactuação democrática de valores e projetos que selam um destino compartilhado.

O particularismo black bloc enfrenta agora seu novo revés no terreno da inflação. Seja pela eficácia destrutiva da maior taxa de juro do planeta (em termos nominais o juro brasileiro só perde para o da Nigéria), seja pelo espraiamento das anomalias climáticas no mercado de alimentos, o fato é que os principais índices de inflação desabam.

E com eles a bandeira 'popular' de Aécio e assemelhados.

Mas há uma variável ainda mais adversa ao conservadorismo no plano da economia política.

O fato de o país viver um quadro de pleno emprego dá ao campo progressista um trunfo inestimável na negociação de um novo ciclo de crescimento.

Uma coisa é negociar com trabalhadores espremidos em filas de desempregados vendendo-se a qualquer preço. Outra, faze-lo em um mercado em que a demanda por mão-de-obra cresceu mais que a população economicamente ativa nos últimos anos.

O conjunto fragiliza um certo fatalismo com devotos dos dois lados da polaridade política, que encara as eleições como uma formalidade incapaz de alterar o calendário do arrocho, com o qual o país teria um encontro marcado após as eleições.

Tudo se passa, desse ponto de vista, como se houvesse uma concertación não escrita à moda chilena que tornaria irrelevante o titular da Presidência, diante dos limites impostos pela subordinação do Estado aos imperativos dos mercados local e global.

É essa, um pouco, a aposta da candidatura Campos, que se oferece à praça e à banca como a cola ambivalente capaz de dissolver os dois lados da disputa em um tertius eficiente e confiável.

O fato de ter fracassado até agora não implica o êxito efetivo do campo progressista em se libertar da indiferenciação que rebaixa o papel da democracia na definição do futuro.

Os desafios desse percurso não podem ser subestimados.

De modo muito grosseiro, trata-se de modular um estirão de ganhos de produtividade (daí a importância de se fortalecer seu principal núcleo irradiador, a indústria, ademais da infraestrutura e da educação) que financie novos degraus de acesso à cidadania plena.

A força e o consentimento necessários para conduzir esse ciclo --em uma chave que não seja a do arrocho-- requisitam um salto de discernimento e organização social que assegure o mais amplo debate sobre metas, prazos, compromissos, concessões, conquistas e salvaguardas.

Não se trata, portanto, apenas de sobreviver à convalescência do modelo neoliberal.

O que está em jogo é erguer linhas de passagem para um futuro alternativo à lógica do cada um por si, derivada de determinações históricas devastadoras que se irradiam da supremacia global das finanças desreguladas, para todas as dimensões da vida, da economia e da sociabilidade em nosso tempo.

A dificuldade de se iniciar esse salto advém, em primeiro lugar, da inexistência de um espaço democrático de debate em que os interesses da sociedade deixem de figurar apenas como um acorde dissonante no monólogo da restauração neoliberal.

Cada um por si, e os mercados por cima de todos, ou a árdua construção de um democracia social negociada?

É em torno dessa disjuntiva que se abre a janela mais panorâmica da encruzilhada brasileira nos dias que correm.

Da ampliação da democracia participativa depende o futuro dos direitos trabalhistas, a sorte das famílias assalariadas, a repartição da renda e a cota de sacrifícios entre as classes sociais na definição de um novo ciclo de crescimento.

É essa moldura histórica que magnifica a importância da Política Nacional de Participação Social anunciada agora pelo governo.

Para que contemple as grandes escolhas do nosso tempo, porém, é crucial que o governo não se satisfaça em tê-la apenas como um aceno de participação ou um ornamento da democracia.

Os desafios são imensos. Maior, porém, é a responsabilidade do discernimento que sabe onde estão as respostas e tem o dever de validá-las.

Ministro Barroso sofre pressão na AP - 470

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

A pressão sobre o ministro Luiz Roberto Barroso, novo relator da AP 470, obedece a uma finalidade óbvia: eternizar o ambiente de perseguição política que Joaquim Barbosa construiu em torno de José Dirceu, José Genoíno e demais condenados pelo STF. Sentindo-se em posição de orfandade, agora que se forma uma nova maioria no tribunal, aliados de Joaquim procuram chantagear o novo relator.

Critica-se Barroso por ter lembrado que quem está preso tem pressa – quando essa afirmação merece elogios, não só pelo aspecto humanitário, mas também por revelar uma compreensão adequada da natureza do Direito. No caso da AP 470, a crítica expressa uma incoerência de envergonhar. As mesmas vozes que passaram meses cobrando “celeridade” da Justiça, aceitando atropelos diversos em direitos e prerrogativas dos réus -- inclusive a manutenção do sigilo sobre o inquérito 2474 com o argumento que ele poderia contribuir para atrasar a decisão -- agora têm coragem de criticar Barroso porque ele prometeu rapidez aos condenados.

Discursos festivos à parte, é preciso cultivar um desprezo profundo pelo direito de homens e mulheres a viver em liberdade para não enxergar o caráter inaceitável de manter uma pessoa presa por 24 horas – ou mesmo uma hora, ou 15 minutos – de forma injusta ou arbitrária. 

O que se quer, é claro, não é defender a liberdade nem o direito das pessoas. A caminho da mais disputada eleição presidencial desde 2002, pretende-se manter o ambiente de espetáculo e castigo, com a convicção de que será útil nas urnas. O que se quer é impedir que críticas cada vez mais amplas sobre o julgamento, envolvendo vozes insuspeitas do judiciário e dos meios acadêmicos, despertem a curiosidade e a dúvida de cidadãos e eleitores. 

Em qualquer caso, não custa lembrar que, do ponto de vista da Justiça, a decisão já virá com atraso. 

Condenado ao regime semi-aberto, José Dirceu já completou sete meses em regime fechado, situação que contraria uma jurisprudência de mais de quinze anos da Justiça brasileira. José Genoíno só retornou a Papuda depois que sucessivas juntas médicas foram convocadas a produzir laudos e mais laudos até que se chegasse a um documento cuja finalidade real não tem a ver só com a medicina, mas com a polícia -- um atestado médico de grande utilidade para evitar denúncias de responsabilidade caso venha a ocorrer um acidente ou mesmo tragédia durante sua permanência na prisão. Não por acaso, o procurador-geral, Rodrigo Janot, já se manifestou a favor de Genoíno. 

Outros presos da AP 470 foram liberados e aprisionados de novo ao sabor de conveniências de momento, a partir de denuncias absurdas de privilégios e regalias que jamais foram comprovadas. 

São estes casos que Barroso irá examinar nos próximos dias, com a intenção de chegar a uma solução antes do recesso do Judiciário, que começa a 1 de julho. Preparando-se para deixar o STF numa saída que “não poderia ser menos gloriosa,” nas palavras de Merval Pereira, Joaquim Barbosa já recebeu o pedido de colocar o assunto em pauta, na quarta-feira. Poderá fazê-lo, ou não. A pauta é uma decisão do presidente, diz o estatuto do STF. Se não o fizer, levará Barroso a tomar a decisão de forma monocrática, o que é direito do relator. Não surgiram, até agora, razões jurídicas capazes de fundamentar uma decisão contra os réus.. 

Ao renunciar a posição de relator da AP 470 o ministro Joaquim Barbosa deu explicações que chamam atenção pelo absurdo. O ministro acusou os advogados dos réus de “agir politicamente.” Antes fosse verdade. 

Ao longo de todo julgamento a defesa optou por uma atuação de caráter técnico, de quem acreditava que a AP 470 seria um processo igual a todos os outros, com a preservação dos direitos e garantias assegurados aos milhares de brasileiros que, todos os dias, com motivos justificáveis ou não, são levados a prestar contas a Justiça. Os advogados cobraram fatos e provas robustas e, na medida em que eles nunca foram apresentados, apostavam na absolvição da maioria de seus clientes. Não estavam aptos para enfrentar uma ofensiva de conjunto contra os réus. Não imaginaram que iram enfrentar uma força que pretendia arrancar condenações de qualquer maneira. 

Num dos momentos culminantes da fase final do espetáculo, quando o recém-chegado Barroso lembrou a denuncia de que as penas haviam sido agravadas artificialmente para permitir condenações em regime fechado, o próprio Barbosa confirmou ao vivo e a cores que havia sido assim mesmo – e ninguém interrompeu o debate, nem pediu maiores explicações, nem achou que era muito estranho nem cobrou nada. 

Quem agiu politicamente, no início, no meio e no fim, foi a acusação. A partir da noção de que o país precisava de “exemplos” para deter a corrupção do sistema político, aceitou-se abolir garantias importantes para a defesa dos réus. Negou-se o direito a um segundo grau de jurisdição a toda pessoa que não tem prerrogativa de foro, condição que atingia 90% dos acusados. Durante o julgamento, ocorrido em 2012, um ano eleitoral, os ministros permitiram-se fazer críticas de caráter político ao Partido dos Trabalhadores, chegando a denunciar que pretendia eternizar-se no poder graças a um sistema financeiro de “compra de votos” que “conspurcava” a vontade do eleitor. Contrariando documentos disponíveis nos autos, ministros falavam em desvio de dinheiro publico -- sem que fosse possível apontar um único centavo retirado dos cofres do Banco do Brasil, onde, conforme a acusação, ocorriam as falcatruas. 

Derrotado nos embargos infringentes, a atuação recente de Joaquim Barbosa não passou de uma tentativa de revogar, na prática, os benefícios a que os réus teriam direito depois que o plenário do STF retirou a condenação por quadrilha. Mais uma forma de “agir politicamente.”

É neste ambiente que Luiz Roberto Barroso terá a responsabilidade de fazer Justiça.

A Linha (Lula) a Agulha (Dirceu)

A agulha passa por vários estágios de sofrimento até aprender sua função: o forno abrasador da metalúrgica, o frio intenso da água em que é temperada, o peso esmagador da prensa que a faz atingir sua forma ideal.
A partir daí, precisa estar sempre dura, brilhante, e afiada. Depois de todo este aprendizado, ela encontra sua razão de viver: a linha.
E faz o possível para ajudá-la: enfrenta os tecidos mais resistentes, abre os buracos nos locais certos. Mas, quando termina seu trabalho, a misteriosa mão da costureira torna a colocá-la em uma caixa escura; depois de tanto esforço, sua recompensa é a solidão.
Com a linha, entretanto, a história é diferente: a partir deste momento, passa a ir a todos os bailes e festas.
by Machado de Assis

Sobre a Daspu, o Putas Dei e o respeito que merecemos

Eu estava procurando alumas garotas de programa pra comentar como ficaria o mercado delas durante a Copa. Dezenas de garotas desligaram o telefone na minha cara. Há um medo grande em se assumir puta, em colocar um nome qualquer e em falar como puta, porque puta não tem voz. Tem corpo, mas não tem voz.
Ao contrário de quase todas as outras, a Naty Harper, quis se fazer ouvir e me convidou para o desfile da Daspu. O assunto da Copa ficou pra trás. Sexta feira, 13, era a comemoração do dia das Prostitutas, o Puta Dei. E o desfile não era apenas uma passarela montada pra mostrar novas tendência de roupas curtas e provocantes. O desfile é uma forma de se mostrar prostituta sem vergonha de ser puta.
Quando a apresentadora anuncia o desfile, não se vê aquela fila de mulheres andando em linha reta. Entram todos juntos, mulheres, homens, putas, artistas… A ordem é quebrar a ordem. Quem quis, tirou a roupa. Quem quis, dançou o funk. Quem quis, se divertiu. Eu tive vontade de deixar minha câmera com alguém e ir lá em cima dançar e reforçar o orgulho de liberdade que se via brilhando nas calcinhas, camisetas e seios nus.
Quem fundou a Daspu foi Gabriela Leite, filha, mãe, avó e puta. Uma mulher que não teve medo de dar as caras, que lutou até o último dia da sua vida pelo reconhecimento da profissão. Quem conheceu Gabriela, me falou dela com um brilho no olho. Betânia Melo, puta feliz, conta que sua vida nunca mais foi a mesma depois de Gabriela, que foi com ela que aprendeu a ter orgulho da profissão, parou de se esconder e entrou na briga pelo reconhecimento.
SONY DSC
A falta de respeito e a falta de direitos das putas cruzou comigo na rua, a caminho do desfile. Eu estava ali na Luz, perto da estação Julio Prestes, uma velha área de prostituição. Parei num posto policial pra pedir informação e vi uma senhora de seus 50 anos reclamando pro policial. Ela contava que tinha combinado o programa com o cliente, fez conforme o combinado e logo em seguida ele saiu sem pagar. A mulher ainda ficou com a dívida do motel.
O policial concordava como quem não quer contrariar um louco. Mas não havia o que fazer. Ela não era uma mulher de bem que fora assaltada, ela era um puta. Essas mulheres não tem direitos, é como se ao colocar-se na esquina à procura de clientes, elas abrissem mão de tudo que lhe cabe: a dignidade, a integridade física, e o reconhecimento pelo trabalho feito.
Naquela noite, com as meninas das Daspu, eu aprendi muitas coisas, uma delas é que a puta não vende o corpo. Ela presta serviços sexuais. Essa mudança de vocabulário representa muito porque assegura à mulher que é profissional do sexo, o poder sobre o próprio corpo.
Mesmo que o cara pague, ela ainda é dona do seu corpo e tem poder sobre ele. Ela é uma profissional como qualquer outra e tem direitos. Afinal, trabalhadores não sexuais, como eu, também submetem o corpo a um tipo de serviço, seja ele intelectual ou braçal, para receber o ordenado no final do mês.
O Puta Dei mostra que puta é tão mulher como todas as outras, tão trabalhadora como todas as outras. Betânia fala pra mim, com o queixo pra cima e um sorriso no rosto, que a única diferença é que “nós [prostitutas] temos o ganho que nós mesmas fazemos, nós negociamos o nosso salário. Se você está em um escritório ou em um outro espaço, você não tem toda a liberdade que você tem na prostituição”.
SONY DSC
Quando o time da Daspu sobe no palco pra mostrar sua cara, elas querem reconhecimento, respeito. Naquele momento o verde e amarelo que elas vestiam era o simbolo da briga pelo direito de ser parte do Brasil na Copa.
No Rio, principalmente, o governo tirou garotas de programas do seu local de trabalho e prendeu algumas mulheres, como se o trabalho delas fosse um crime. Não é. Tráfico de pessoas é crime, abuso de menores é crime. Prostituição, não. Quando a mídia e as pessoas criticam o turismo sexual, elas colocam a prostituição no mesmo pacote do abuso sexual. As meninas brigam pelo reconhecimento da profissão, justamente para que elas possam sair dessa margem, desse espaço sempre ligado a crimes, tráfico e abusos.
Enquanto se maquiavam e penteavam os cabelos umas das outras, elas e eles proclamavam seu direito de se prostituir sem  recriminação. “Somos maiores de idade, donas do nosso corpo, e não estamos prejudicando ninguém ao nos prostituir. Temos direito de lucrar como qualquer outro prestador de serviço. Nos deixem trabalhar”. Esse é o resumo de muitas falas.
“Por que a gente é sempre vista como a coitada ou como a pessoa que esta ali pra destruir a sociedade, pra incomodar?” Betânia fala com a ânsia de quem não aguenta mais ficar na sarjeta imaginária das pessoas. As prostitutas foram as primeiras mulheres no mundo a conquistar a independência feminina financeira, a pagar suas próprias contas. Enchendo a boca, a Betânia fala da sua revolta quando ouve as pessoas falarem das prostitutas como coitadas, ou como mulheres prostituídas, que não tiveram outra escolha. “Quem fala isso não é Puta. Meu bem, se você não tá dentro da profissão, então não conta”.
Naquela noite, eu conheci mulheres que tiveram opção. Uma das que estavam lá era Lola Benvenutti, estudante de letras na Universidade Estadual de São Carlos, optou pela prostituição por livre e espontânea vontade e hoje é um dos grandes nomes do mercado.
SONY DSC
Conversando com a Naty, aquela que me chamou pro desfile, ela me conta que se formou em jornalismo, trabalhava com noticias automobilísticas. Naty me apresentou pro seu namorado, “hoje ele veio”. E ainda me falou da sua filha de 14 anos, que sabe da sua profissão e que não tem problemas com isso. “Se for bom pra mim, ta bom pra ela… Tem dia que fica cheio de amiga dela lá em casa me perguntando sobre as coisas.”
“É tudo mulher igual, é tudo mãe, é tudo filha. Tem que parar com isso de achar que é diferente.”Karina Buhr estava no camarim conversando com a gente e, para ela, essa é a mensagem que tem que ficar.
Gabriela já dizia “a prostituta não é uma vagabunda ou então o resultado do capitalismo selvagem, mas sim a linha direta de uma sociedade que morre de medo de mostrar sua sexualidade e consequentemente se sente profundamente ameaçada quanto uma prostituta mostra seu rosto. Como um dia eu mostrei o meu rosto de prostituta, todos ficaram chocados pois perceberam que não era diferente do de outras mulheres.”
Eu confesso que não li o livro de Gabriela Leite Filha, mãe, avó e puta. Mas agora a vontade é inevitável, depois de tantas pessoas falando de Gabriela com o peito erguido, com o orgulho de se saberem privilegiado por terem conhecido essa mulher que lutou tanto pra que a profissão finalmente seja reconhecida no papel e nas ruas.
Ah… Gabriela também não foi puta por falta de opção, ela cursava sociologia na USP e trabalhava em escritório quando largou tudo para viver do próprio corpo.
Mas infelizmente, estando lá, naquele evento incrível, eu senti o que me disse a Naty – que ninguém enxergava o problema delas. Lá, com toda a estrutura, não tinha ninguém de nenhum veículo de mídia. Só eu.
No dia seguinte, muitos veículos soltaram a notícia do acontecimento do desfile, com fotos de arquivo que nem sequer eram do lugar ou do dia do evento. Para o resto das revistas, sites e jornais, o assunto não tinha importância. Pra mim tinha. Talvez  por eu ser uma Gabriela, assim como a Gabriela Leite, assim como a Gabriela Natalia (nome verdadeiro da Lola), veja importância nisso que elas tem pra dizer.
Se eu precisasse resumir em uma frase tudo isso, eu diria apenas que é preciso parar de usar “puta” para ofender, porque essa palavra é um dos melhores adjetivos. “Ela é uma puta mulher, e merece um puta respeito”.
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
SONY DSC
Gabriella Feola

Estudante de jornalismo da USP, apaixonada por músicas latinas, acredita que 'sexo' deveria ser uma editoria, assim como esporte.


Outros artigos escritos por 

O desabafo de Trajano

E eis que José Trajano, da ESPN Brasil, viralizou.

Um vídeo em que ele cita quatro colunistas que instigam ódio circula freneticamente pela internet nestes dias.

Ele enxergou, com razão, uma relação espiritual entre os que xingaram Dilma no estádio e os colunistas que mencionou.

Trajano falou de Demetrio Magnolli, Augusto Nunes, Mainardi e Reinaldo Azevedo, mas poderia falar de muitos outros.

Outro dia li uma expressão do Nobel de Economia Paul Krugman e pensei exatamente no tipo de jornalista da pequena lista de Trajano.

São os “sicários da plutocracia”. São pagos, às vezes muito bem pagos, apenas para defender os interesses de seus patrões.

Os Marinhos, ou os Frias, ou os Civitas, ou os Mesquitas, não podem, eles mesmos, assinar artigos em defesa de suas próprias causas. Então contratam pessoas como as de que Trajano trata.

Muitos leitores, em sua ingenuidade desumana, vêem alguma coragem nos “sicários da plutocracia”.

É o oposto. Ao se alinhar aos poderosos – aqueles que fizeram o Brasil ser um dos campeões mundiais da desigualdade – eles têm toda a proteção que o dinheiro é capaz de oferecer.

Não correm risco de ficar sem emprego, por exemplo. Podem cometer erros grosseiros de avaliação, de prognóstico, de estilo, do que for.

Mesmo assim, estarão seguros porque cumprem o papel de voz dos que podem muito.

Vi em Trajano um desabafo, uma explosão, e entendo por duas razões.

Primeiro, Trajano sempre foi explosivo, temperamental. É um traço seu desde sempre, bem como a paixão pelo Ameriquinha.

Depois, Trajano ecoou um sentimento que representa o espírito do tempo.

Há um cansaço generalizado, uma irritação crescente com os “sicários da plutocracia”. Não apenas pela soberba vazia, pela arrogância de quem sabe que terá microfone em qualquer circunstância, não apenas pela vilania constante.

Mas pela compreensão de que eles representam um obstáculo brutal ao avanço social brasileiro.

Eles estão na linha de frente da resistência a um Brasil menos desigual.

Eles surgem em circunstâncias especiais. Seu papel é minar, perante a opinião pública, administrações populares.

O maior da espécie, Carlos Lacerda, se notabilizou ao levar GV ao suicídio e Jango à deposição.

Eles sumiram nas décadas que se seguiram ao Golpe de 64, por serem desnecessários. O Estado – com os incríveis privilégios e mamatas à base de dinheiro público — estava ocupado pela plutocracia. Já não tinham serventia.
Voltaram quando Lula ganhou, a despeito de todas as concessões petistas fixadas na Carta aos Brasileiros.

Voltaram com o PT, assim como voltariam com qualquer outros partido que representasse ameaça às vantagens de séculos, como livre acesso aos cofres do BNDES e outras coisas do gênero.

Neste sentido, é bom entender que não é algo contra o PT e sim contra o risco, real ou imaginário, do fim das regalias.

Você pode identificar claramente o processo de retorno dos sicários.

O primeiro deles foi Diogo Mainardi, na Veja. Logo depois, também na Veja, mas na internet, apareceu Reinaldo Azevedo.

Não eram conhecidos na elite dos jornalistas, mas ganharam um espaço privilegiado porque se dispuseram a fazer a propaganda, disfarçada de jornalismo, das causas de quem quer que o Brasil continue do jeito que sempre foi.

Aos poucos foram chegando outros, e hoje são muitos.

É um processo curioso: quanto menos votos têm os representantes da plutocracia, mais colunistas da direita vão aparecendo. É como se houvesse a esperança de, uma hora, aparecer um novo Lacerda e resolver o problema.

Mas a sociedade brasileira está cansada de tanta desigualdade, e é difícil acreditar que as lorotas dos sicários vão ter algum resultado parecido com o que houve em 54 ou 64.

O Brasil merece ser uma sociedade nórdica, escandinava, em que ninguém seja melhor ou pior que ninguém por causa do dinheiro, e na qual não haja os abismos de opulência e de miséria.

Os sicários aos quais Trajano se referiu simbolizam o oposto de tudo que escrevi acima.

Desta vez, ao contrário de 54 e 64, não triunfarão – até porque a internet deu voz a quem não tinha e retirou a exclusividade monopolística e predadora dos que favelizaram o Brasil enquanto acumulavam fortunas extraordinárias.

por Paulo Nogueira - Diário do Centro do Mundo

Sobre a Copa do Mundo

Sem pedidos de desculpas

da lavra de JB Costa

Acerca dos editorais de vocês fazendo uma "mea culpa", ainda tímida e aqui e acolá com algum ranço. eu, como o 199.999.999º humilde brasileiro tenha a responder o seguinte:
 
1) Vocês foram, seja institucionalmente, seja através dos seus prepostos repórteres e analistas, a linha de frente nesse processo de alastrar o pessimismo e o catastrofismo no país no que tange à possibilidade desta nação sediar um evento desse porte. Não queiram, por obséquio, querer agora dar uma, como se diz na gíria, de "João sem braço".
 
2) Vãs foram as tentativas do governo, bem como de instâncias não comprometidas com o mesmo, de explicar ou clarificar os processos ou ações perpetradas para viabilizar essa Copa,  começar pela construção/modernização de estádios e as obras de infraestrutura afins. Da parte de vocês o que poderia ser aceitável em termos jornalísticos, no caso, a desconfiança, passou a ser uma linha de ação política-ideológica. Ou seja, não eram os gastos supostamente perdulários, ou eventuais desvios, o foco, e sim, uma tática para desmerecer, depreciar e enfraquecer um sistema de Poder. Tanto é que até o presente momento não há nenhum caso concreto de irregularidades interpostas por quem de direito(TCU, MP, CGU). 
 
3) A verdade, prezados senhores, é que vocês, com todas as vênias, QUEBRARAM A CARA! (Ia escrever fuças, mas hoje estou "bonzinho").
 
Assim, da parte desse humilde brasileiro que hoje se delicia com o sucesso dessa Copa; se orgulha das avaliações feitas no exterior sobre a mesma;  e se emociona com o ar de felicidade dos milhares de torcedores de todos os cantos do mundo, concluo:
 
- Não aceito seus pedidos de desculpas de jeito nenhum! E arremato escrevendo num português que certamente meu finado avô aprovaria:
 
Vão todos para a "baixa da égua".

Charge do dia

Em homenagem a muitos dos pena-paga de pig