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As raízes do terror islâmico

por Paulo Nogueira
A reação dos jornais franceses
A reação dos jornais franceses
Diante de uma tragédia como a de ontem em Paris, duas atitudes se impõem.
A primeira é chorar cada morte. Na última contagem, 120 pessoas foram mortas pelos atos conjuntos de terrorismo, e dezenas estão feridas, muitas em estado crítico.
A palavra mais comum nos jornais franceses deste sábado é, previsivelmente, horreur, horror.
Derramadas todas as lágrimas, vem a segunda atitude. Tentar compreender como uma violência de tal magnitude pôde acontecer.
É um passo essencial para evitar que outros episódios dantescos como o desta sexta em Paris possam se repetir.
Mas há, aí, uma extraordinária dificuldade em sair de lugares comuns como a “violência radical” do islamismo e dos islâmicos.
Trechos do Corão, o livro sagrado dos muçulmanos, são citados em apoio dessa tese falaciosa e largamente utilizada.
A questão realmente vital é esta: o que leva ao extremismo tantos muçulmanos, sobretudo jovens? Por que eles abandonam vidas confortáveis em seus países de origem, abraçam o terror e morrem sem hesitar pela causa que julgam justa?
Os líderes ocidentais não fazem este exercício porque a resposta àquelas perguntas é brutalmente indigesta para eles.
O terror islâmico nasce do terror ocidental, numa palavra.
Há muitas décadas os países ocidentais, liderados pelos Estados Unidos, promovem destruição em massa nos países islâmicos.

Paulo Nogueira: Está em curso uma tentativa de golpe?

Dia do golpe de 64
Dia do golpe de 64
 Está em curso um golpe? Ou, mais precisamente, uma tentativa de golpe?
Sim.
A direita brasileira faz sempre isso. Ou tenta fazer.
Não se pode alegar surpresa. 1954 foi assim. 1964 foi assim.
É sempre assim.
Quando imagina que velhas mamatas e privilégios estão em risco, a direita brasileira – uma das mais predadoras do universo — parte para o golpe.
Isso, ao longo da história, se provou mais fácil do que o penoso caminho das urnas.
Mudam as circunstâncias. Em 1954, você tinha a voz de Carlos Lacerda, o Corvo, símbolo da imprensa reacionária nacional.
Você tinha também militares formados sob a égide da Guerra Fria, visceralmente conservadores – e loucos para sair das casernas.
Em 1964, você tinha, fora Lacerda e os militares, os Estados Unidos, ávidos por consolidar países como o Brasil como seu quintal.
Em 2015, não existe mais Lacerda, não existem mais militares depois do fracasso espetacular da ditadura, não existem mais tropas americanas dispostas a assegurar a vitória dos golpistas num eventual confronto no Brasil.
Mas existem duas coisas. Uma é velho hábito da direita de tirar da frente qualquer ameaça à sua abjeta hegemonia política e econômica.
E a outra são novas formas de fazer o que sempre gostaram de fazer. O nome da arma, agora, é impeachment.
Você – a direita — venezueliza o país: cria uma situação de polarização extrema. Promove, pela mídia, uma lavagem cerebral na opinião pública. E depois instala um processo de impeachment no Congresso.
A fórmula foi testada, com sucesso, no Paraguai. Mesmo no Brasil funcionou para derrubar Collor.
É o que está ocorrendo?
Dura questão. Mas você conhece a história do elefante. Você não sabe se é mesmo um elefante o que avistou. Mas tem trompa de elefante, orelhas de elefante, peso de elefante, patas de elefante, andar de elefante.
Em 1954 era um elefante, em 1964 também e agora cada um dê seu palpite.
Este expediente não foi usado contra Lula, no Mensalão, por medo, por covardia. Havia o receio de que as forças sociais petistas – sindicatos, UNE etc – paralisassem o país.
O tempo passou, e hoje a direita parece descrer do poder de mobilização social do PT.
Nos protestos de 2013, a Maré Vermelha do PT foi um fiasco diante da capacidade de aglutinação de grupos como o Passe Livre.
É dentro desse quadro que a direita se anima agora. A militância petista parece, para muitos, gorda, envelhecida e de alguma forma deslocada no tempo.
Hora, portanto, de fazer o que sempre foi feito: apear a esquerda, ou aquilo que um dia foi esquerda.
O desfecho só não será o clássico caso as forças sociais petistas demonstrem claramente que não estão gordas, envelhecidas e deslocadas no tempo.
Que ainda pulsam. Que ainda vivem. Que são capazes de defender a democracia e o voto de 54 milhões de brasileiros.
Há um lugar, um único lugar, para mostrar que uma eventual tentativa de golpe receberia a devida resposta: as ruas.
Se este grito não for dado, 2015 pode repetir 1954 e 1964, por outros meios mas com os mesmos ingredientes.



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Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Paulo Nogueira - "Perder ganhando" é prêmio de consolação

Diplomação da reeleição da presidente Dilma Roussef

A grandiosa simplicidade de Dias Toffoli na diplomação

Tenho horror à retórica esclerosada e pomposa dos juízes do STF, um sentimento que se intensifica com aquelas togas medonhas que remetem a eras medievais.
Dito isto, o ministro Toffoli merece aplausos de pé pelas palavras simples, claras, breves e extraordinariamente oportunas com as quais encerrou a cerimônia de diplomação de Dilma.
“Não haverá terceiro turno na Justiça Eleitoral”, disse ele.
Foi sem dúvida o pronunciamento mais importante na carreira de Toffoli – sem os rococós intermináveis que são a marca dos votos dos juízes da Suprema Corte.
Ao avisar que não haveria terceiro turno, na condição de presidente do TSE, Toffoli na prática matou o terceiro turno que o PSDB pateticamente vinha tentando alimentar.
O capítulo mais grotesto dessa tentativa se deu pouco antes das palavras de Toffoli, quando o site do PSDB anunciou que estava pedindo à Justiça a diplomação de Aécio e não de Dilma.
Está certo que Aécio acredite na versão de que “perdeu ganhando”, um dos mais batidos prêmios de consolação já inventados pelos perdedores da humanidade.
Mas daí a reivindicar a presidência com um déficit de quatro milhões de votos em relação a Dilma é a chamada coisa de louco.
Como o bizarro pedido do PSDB foi feito pouco antes da diplomação, criou-se, entre os mais ingênuos adeptos de Aécio, a ilusão de que a qualquer momento da cerimônia pediriam a Dilma que se levantasse e cedesse o lugar a Aécio.
Quase tão bem-vindas quanto as palavras de Toffoli foi o silêncio de Gilmar Mendes, que decidiu não emprestar seu formidável prestígio a Dilma na diplomação.
Gilmar fez questão, no entanto, de que seu nome que inspira multidões fosse pronunciado.
Pediu a Toffoli que avisasse, publicamente, que ele não comparecera porque assumira um compromisso anterior.
Claro que alguém como Gilmar tem muitos compromissos mais importantes do que a diplomação presidencial.
Toffoli não disse onde estava Gilmar, mas juntando fios soltos é possível especular que ele estivesse mediando as negociações entre Obama e Raul Castro para a reaproximação entre Cuba e Estados Unidos.
Outra hipótese é que estivesse ajudando Putin a lidar com o dramático problema da desvalorização do rublo.
Que seria do mundo ocidental, e mesmo oriental, sem Gilmar?
Mas, mesmo sem ele, a noite de ontem teve uma dimensão que outras diplomações jamais tiveram.
E o responsável por isso foi Toffoli, justo Toffoli, tão criticado nas últimas semanas por Nassif por estar à frente de uma trama golpista de cunho jurídico ao lado de Gilmar.
Toffoli poderá fazer mil, um milhão de pronunciamentos no restante de sua carreira.
Nenhum deles, no entanto, terá a grandeza épica do de ontem.
Quanto ao não diplomado, minha mãe, com sua elegância intransponível,  me mataria se eu dissesse o que penso. Mas uma imagem que circula pela internet representa exemplarmente o papel de Aécio.
Peço licença a mamãe para reproduzir o que diz a imagem. É um diploma igual ao que Dilma recebeu. E está dito que ali que Aécio Neves foi solenemente diplomado CUZÃO, com maiúsculas.
Perdão, mãezinha, mas não encontrei no dicionário palavra que descreva melhor Aécio Neves.

Paulo Nogueira: a Info é a Veja amanhã

A Veja terá o mesmo destino da Info

Não é uma frase de efeito. É uma realidade doída. Quer dizer: doída para os leitores da Veja.
O que aconteceu com a Info – desativar a edição regular e manter-se na internet — é o caminho inevitável para as revistas impressas.
Chega uma hora em que o custo – papel, mais gráfica, distribuição etc – supera a receita.
Isso se deve a duas coisas. A primeira é a perda de receita publicitária. Os anunciantes estão debandando das demais mídias para se ajustar à Era Digital.
Seus consumidores não lêem jornais e revistas de papel. Eles se informam em sites de notícias e redes sociais.
É virtualmente impossível encontrar algum jovem com um jornal ou uma revista. Antes símbolo de status intelectual, agora ler revistas ou jornais é sinal de atraso.
Pouco tempo atrás, a L’Oreal, um dos maiores anunciantes por muitos anos do mundo em publicações femininas, comunicou que estava deixando a mídia revista.
Não foi um caso isolado. Foi um episódio a mais numa tendência inexorável.
No exterior, casos como o da Info são muitos. A Newsweek, por décadas a segunda maior revista do mundo depois da Time, hoje existe apenas como site.
Também a Business Week, um colosso entre as publicações de negócios na era do ouro do papel, sobrevive na internet.
Não é o que as editoras de revistas gostariam, mas é a vida como ela é. A internet é disruptora. Ela não se acomoda entre outras mídias, conforme aconteceu sempre. Ela vai matando-as.
Mesmo a televisão, que se imaginava até recentemente a salvo da internet, já está sob ataque.
É a próxima vítima.
Revistas tradicionais podem sobreviver como sites, uma vez que as despesas são infinitamente menores que as habituais.
Esta é a boa notícia.
A má notícia é que a pujança que tiveram no papel não se reproduz na internet.
A experiência já demonstrou que os casos de sucesso no jornalismo digital são de nativos da internet, e não de imigrantes.
Nos Estados Unidos, o fenômeno jornalístico dos últimos anos é o Huff Post, o site de Ariana Huffington.
Nativos se movimentam com muito mais facilidade. Já surgem com custos menores, adequados ao novo meio, e têm uma vantagem competitiva adicional: todo o conhecimento relativo ao papel não vale nada na internet.
A Abril acumulou, em meio século, um extraordinário expertise em fazer revistas de papel. Como fazê-las, como conseguir publicidade, como montar uma carteira de assinantes e renová-la, como conseguir o melhor lugar numa banca etc.
Tudo isso vale nada na Era Digital.




Fora isso, há um vasto contingente de internautas que não acreditam nos bons propósitos do jornalismo das grandes empresas de mídia, seja em que plataforma for.
À medida que o jornalismo digital vai-se tornando dominante, as revistas de papel vão enfrentar uma escolha complicada.
Uma saída é simplesmente fechar. A Abril fez isso com vários títulos. A outra é sobreviver na internet, mas em bases inteiramente diversas.
No longo prazo, é difícil imaginar que qualquer uma das grandes companhias jornalísticas brasileiras – Globo incluída – seja parecida com o que foram até recentemente.
A melhor imagem é a das carroças quando surgiram os carros. Passado algum tempo, não sobrou nenhum fabricante de carroça.

Eu disse longo prazo. Mas longo prazo, na era da internet, costuma ser muito mais rápido do que o habitual.
no Diário do Centro do Mundo

O rei do coitadismo de direita

por Paulo Nogueira - Diário do Centro do Mundo

Danilo Gentili conseguiu duas façanhas em sua carreira como apresentador: transformar Jô Soares, por comparação, num gênio, e virar o maior expoente do coitadismo de direita no país.
A julgar pelo que ele apregoa, trata-se de um dos homens mais perseguidos do planeta. Gentili está em listas negras sinistras, tem seu perfil no Facebook derrubado, é processado. Possui absoluta liberdade para falar o que quiser, mas insiste que vivemos numa ditadura bolivariana.
É uma tática manjada. Encontre o regime, o país ou a pessoa mais execráveis da história e diga que é isso o que temos hoje, sem que haja necessidade de qualquer prova. Estamos em Cuba, na Alemanha nazista, na Venezuela, na Coreia do Norte, na União Soviética. Quem manda aqui é Hitler, Fidel Castro, Pol Pot.
Quando ele é criticado, o que é normal numa democracia, grita que não é justo. Um marciano burro que pousasse na Avenida Paulista e o escutasse haveria de pensar que Gentili está preso numa cela, seminu, num pau de arara, subjugado.
Ele insiste que nasceu num “cortiço” e se fez através do esforço próprio, como se fosse o único caso em 500 anos num país de 200 milhões de funcionários públicos recebedores do Bolsa Família. Seu apelido “Palmito” é uma prova de que sofre preconceito racial. Portanto, qual o problema de oferecer banana a um negro?


Meritocrata caçado de maneira inclemente pelo abominável estado, Gentili trabalha numa emissora que, em 2012, recebeu 153,5 milhões de reais em verbas publicitárias do governo federal, valor que provavelmente cresceu de maneira inercial desde então. Seu salário vem daí e não das empresas Jequiti ou do Banco Panamericano. Mas isso não é assunto para um mártir.
Como todo coitadista, Danilo Gentili esconde um desejo autoritário de ver seus desejos atendidos e seus inimigos destruídos. Em sua falta de imaginação, cria uma distopia rasa em que luta contra um inimigo poderoso.
É preciso espalhar a tese de que a liberdade está constantemente ameaçada. Não há nuances e espaço para a dúvida. Gentili e seus amigos vivem de vender a ideia de que são pobres inocentes quando, na realidade, os inocentes são os que acreditam em sua mistificação meia boca.
A vitimização pode ser um grande negócio, desde que haja um número suficiente de bobos para chorar por você.

Por que os debates agressivos são bons para a sociedade

Vi que alguns blogueiros progressistas ficaram chocados com o que seria o baixo nível do debate no SBT.

“Se Aécio e Dilma tiverem bom senso, estão com vergonha deste debate”, escreveu Leonardo Sakamoto.

“Todos perderam em um circo de horrores”, disse Nassif.

“Quem escreve agora não é o blogueiro, é o cidadão. Estou cansado de ver brigas entre Dilma e Aécio. Quero propostas”, afirmou Eduardo Guimarães.

Discordo inteiramente. Discordo 100%. Melhor: discordo 200, 300%.

A importância de um debate está em permitir ao leitor que conheça os candidatos. A alma dos candidatos, quero dizer.

Pope disse que não existe nada tão relevante, na história da humanidade, do que o estudo da essência do homem em si.

E nisso os debates, particularmente o de ontem, têm sido extraordinariamente ricos.

Conheça o homem, ou a mulher, e você terá plenas condições de votar com consciência.

Acho até engraçado esperar que se formulem propostas para um país em dois minutos para o adversário rebatê-las em um minuto, sob o cerco implacável dos moderadores.

Você não discute sequer o seu casamento, ou namoro, em um minuto, que dirá os caminhos da educação ou da saúde, os remédios para a economia ou para o meio ambiente, e por aí vai.

Mas em instantes, em fragmentos de instantes, você capta a alma do candidato, e isso acontece em geral em situações de tensão e confronto, quando a guarda está mais baixa e o nhenhenhém diplomático se esvai.

Vou falar de mim, pessoalmente.

Paulista, não conhecia Aécio. Ou conhecia superficialmente. Era, para mim, essencialmente, apenas um playboy, mais presente no Rio do que em Minas.

Os debates me mostraram que ele é muito mais que um playboy.

É um clássico demagogo: fala com desenvoltura e aparente segurança, mas não tem o menor pudor em mentir, simular indignação e tergiversar.

Se você espremê-lo, não vai sair uma gota de sinceridade.

Junte, por exemplo, todas as explicações que ele deu sobre o aeroporto de Cláudio. Não sobra uma linha que convença alguém de que aquilo não foi uso de dinheiro público para fins privados.

Repita o procedimento para o caso do nepotismo serial, algo particularmente grave para quem deu para falar compulsivamente em meritocracia.

Outra vez, não há nada de substantivo em suas perorações sobre o assunto.

Ardilosamente, ele quis no debate do SBT confundir os eleitores ao comparar sua irmã com o irmão de Dilma.

Não poderia haver duas situações mais diferentes. Mas Aécio não se constrange em misturar coisas para enganar os eleitores mais ingênuos.

Estes podem pensar, como disse Aécio numa frase certamente estudada, que Andrea Neves trabalha sem ganhar e Igor Rousseff ganha sem trabalhar.

Mas é uma falácia – e ele sabe que é. Mas isso não o detém.

Procure também uma justificativa decente sobre o dinheiro público posto em seu governo em rádios da família.

Você não vai encontrar. Sequer vai saber qual o montante, e isto partindo de um candidato que se diz um campeão da honradez e da transparência.

Vamos ser diretos: é abjeto político ser dono de concessão pública como rádio. É um palanque que funciona todos os dias, e todas as horas.

A questão do bafômetro, posta ontem, mereceu uma resposta que, no Twitter, alguém classificou como “a frase do debate”.

Aécio afirmou que não se submeteu ao bafômetro “inadvertidamente”. É uma das desculpas mais fajutas que alguém já apresentou na história da República.

Passemos a Dilma.

Ela está longe de ser uma campeã de oratória, uma réplica de Cícero, Demóstenes.

Mas, por não ser demagoga como Aécio, transmite muito mais sinceridade, ainda que tropece, aqui e ali, em algumas frases e cite demasiadamente números, um recurso enfadonho para o espectador.

Com seu jeito simples, nada afetado, Dilma consegue mostrar que seu projeto de governo dá foco aos desvalidos, aos excluídos, aos miseráveis.

Com sua fala de demagogo, Aécio tenta esconder – sem conseguir — que seu compromisso é com a plutocracia que fez o Brasil ser o que é, um campeão mundial da desigualdade.

Não teríamos um quadro tão claro quanto este não fossem os debates acirrados – daí meu elogio entusiasmado a eles.

Sobre o Autor

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.
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Paulo Nogueira: Marina vai para o segundo turno?

[...] Vistas as coisas em retrospectiva, Marina floresceu antes do tempo. E pode murchar exatamente às vésperas das eleições.
Na pesquisa CNT/MDA divulgada hoje, ela apareceu com 27,4%. Não seria um número em si ruim, não fosse a circunstância de que na mesma pesquisa anterior, no início de setembro, ela tinha 33,5%.
Caso ela continue a cair no mesmo ritmo, chegará às urnas na casa dos 20%. É um patamar de alto risco para suas pretensão de fazer do segundo turno uma coisa “diferente”, pelo tempo de propaganda de que disporia – o mesmo de Dilma.
A aflição dos adeptos de Marina não significa que os tucanos estejam dando pulos de alegria.
Aécio depende de um milagre para ir ao segundo turno. Uma virada sem precedentes, na análise do diretor do Datafolha.

Aécio Neves, um desqualificado que não sabe lidar com as críticas

Criança mimada, quando exposta às asperezas da vida, sofre em dobro.

O mesmo vale para político mimado.

Até há pouco tempo, Aécio viveu no mundo superprotegido de Minas Gerais. Jamais foi exposto pela mídia local, dependente dos anúncios do governo, a embaraços e a enfrentamentos.

Isto o poupou de aborrecimentos, é certo. Mas o deixou absolutamente despreparado para lidar com outras coisas que não sejam tapinhas nas costas de repórteres.

O caso do aeroporto – o primeiro grande teste de Aécio como vidraça – é exemplar.

Ele vem mostrando não ter preparo nenhum para as adversidades jornalísticas. Nas vezes em que se pronunciou sobre o assunto, misturou nervosismo, arrogância e falta completa de convencimento.

Decretou, numa das ocasiões, que estava “tudo explicado”, como se coubesse a ele decidir isso. A melhor resposta a isso veio do colunista Elio Gaspari: “Explicação de Aécio não decola”.

E como poderia?

Sua melhor alegação é que o aeroporto pertence não a seu tio, mas ao Estado, pois a terra onde ele está foi desapropriada. (Em termos, porque a desapropriação está na justiça, num caso de litígio.)

Mas, se é um aeroporto de interesse público, como justificar que o acesso a ele só se dê se você, autorizado, pega a chave na fazenda?

É um aeroporto para poucos, muito poucos. Sintomaticamente, Aécio não respondeu, numa entrevista, se ele estava entre os poucos. Não disse se usou o aeroporto, o que na prática sabemos o que significa.

Em outro capítulo desastrado de sua louca cavalgada, ele atribuiu o vazamento ao PT. Aos velhos e conhecidos métodos do PT, segundo ele.

Será que ele imagina que, assim, vai transferir o ônus do escândalo para outras mãos que não as suas?

A vida fácil de neto de Tancredo poupou Aécio de dissabores como este com que ele lida agora.

Mas, ao virar personagem nacional, a mamata tinha mesmo que acabar. E o que se vê é uma criança mimada contrariada, pronta a culpar os outros pelas artes que comete.

Não é certa ainda a extensão dos danos do aeroporto para as pretensões presidenciais de Aécio.

Num mundo menos imperfeito, ele retiraria sua candidatura, sob o assédio da mídia e, mais ainda, da opinião pública.

Um homem que repetiu a palavra ética milhões de vezes, sobretudo para acusar seus adversários, não pode tropeçar, ou será visto como detentor de um descaro total.

Mas este aqui é o mundo que temos.

A mídia está fazendo o máximo para preservar Aécio: a mínima cobertura possível, tom quase dócil — o suficiente apenas para não passar vergonha.

Mas não há nada que ninguém possa fazer para poupar Aécio das dores excruciantes que um político mimado sofre ao lidar com dificuldades das quais foi sempre protegido.




Paulo Nogueira - jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

O anti-Nelson Rodrigues


O Anti-Nelson Rodrigues é uma das últimas peças de Nelson Rodrigues. O nome extravagante tem um motivo óbvio: o final é feliz.
Um beijo cinematográfico sela a história: os dois protagonistas estarão juntos para sempre, como num conto de fadas.
Isto é o anti-Nelson Rodrigues: suas peças jamais terminaram bem.
Fora do terreno da dramaturgia, temos hoje no Brasil o anti-Nelson Rodrigues. Paradoxalmente, é alguém que se considera um discípulo apaixonado de Nelson Rodrigues e o cita obsessivamente.
É Arnaldo Jabor.
Jabor é o anti-Nelson Rodrigues porque faz exatamente o oposto daquilo a que o maior dramaturgo brasileiro se dedicou com tamanho empenho.
Nelson Rodrigues gastou boa parte de seus incontáveis artigos nos jornais identificando, e combatendo, uma patologia nacional.
Ele dizia que o brasileiro era um Narciso às avessas, alguém que cospe na própria imagem.
Para ele, o futebol retirou o brasileiro da sarjeta emocional em que se arrastava desde sempre. O primeiro título mundial, em 1958 na Suécia, fez o brasileiro finalmente se orgulhar de seu país, e de si mesmo.
Isto, sabia ele, era fundamental para a construção do país. Você não constrói nada – uma família, uma empresa, muito menos um país – sem que as pessoas sintam respeito por elas mesmas e pelo grupo a que pertencem.
O anti-Nelson Rodrigues faz o oposto.
Em seus artigos e comentários no rádio e na tevê, Jabor se esmera em depreciar o Brasil e os brasileiros.
Numa fala na CBN que viralizou na internet, e já é um clássico das grandes asneiras da mídia, Jabor disse algum tempo antes da Copa que o Brasil daria um vexame mundial.
Nossa incompetência para organizar um evento de tal envergadura ficaria brutalmente exposta, segundo ele.
Veio a Copa e ela foi o anti-Jabor.
No mesmo texto em que vaticinou o apocalipse futebolístico, ele disse que o Brasil não é sequer o terceiro mundo. É o quarto.
Os ouvintes e leitores de Jabor são regularmente massacrados com a mensagem de que o país deles não presta – e nem eles.
Razões objetivas para detestar o Brasil ele não tem. Em que outro país teria o espaço na mídia que o Brasil lhe oferece? Em que outro país faria palestras a 20 mil reais ou mais a hora?
O Brasil é uma mãe amorosa para Jabor. E Jabor devolve o amor com desprezo. Ele lembra, neste sentido, o Oswaldinho de o Anti-Nelson Rodrigues. A mãe o adora, e ele a despreza com ferocidade. “A senhora sempre liga na hora errada”, grita Oswaldinho ao telefone numa cena à mãe rejeitada.
Por que tanto ódio?
É alguma coisa que só o próprio Jabor pode responder. Eis um homem atormentado, você logo percebe.
Teria sido o fracasso no cinema o responsável pela raiva que inunda Jabor? Só ele sabe.
O que ele talvez não saiba é o mal que, como Anti-Nelson Rodrigues, faz aos que o ouvem no rádio, o lêem nos jornais e o vêem na tevê.
Jabor projeta sobre eles, impiedosamente, toda a sua amargura, todas as suas frustrações, todo o seu rancor.
Os que hoje o levam a sério um dia, caso acordem, podem desejar algum tipo de indenização por terem sido devastados numa coisa tão importante como o respeito por si mesmos.
É uma conta que jamais poderá ser paga – nem pelo anti-Nelson Rodrigues que atende por Jabor e nem por ninguém.
Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Sobre o artigo do Financial Times que afirma: O Brasil já ganhou a Copa

or Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo.
Um artigo do Financial Times circula nestes dias pela internet. O título é: “O Brasil já ganhou a Copa”.
Ao contrário de textos do FT críticos à política econômica do governo, este não é objeto de exaustiva repercussão na mídia e seus comentaristas.
Regra número 1: a mídia repercute apenas notícias negativas, numa seleção minuciosa que não admite exceções.
O artigo do FT sublinhava o que já é de amplo conhecimento: a Copa foi um triunfo.
A extraordinária surpresa se deveu menos aos fatos, em si, e mais à campanha feroz movida pela imprensa.
Num dos momentos apoteóticos dessa campanha, Jabor disse que o Brasil mostraria sua incompetência em organizar um evento de tal magnitude.
Mesmo jornalistas de outra natureza que não a de Jabor se deixaram contaminar pelo sentimento apocalíptico. Poucas semanas antes da estreia do Brasil, depois de visitar o Itaquerão num jogo do Corinthians, Juca Kfouri previu, na ESPN, o caos.
O FT falou naquilo que todos sabem: os brasileiros são um povo encantador. O francês rosna para você. O inglês ignora você. O brasileiro sorri e dá um tapa nas suas costas.
Para os jornalistas estrangeiros, e os turistas, cobrir a Copa nas cidades com praias foi uma experiência única. “A Copa tem que ser sempre no Brasil” foi uma frase várias vezes repetida.
Também para os jogadores estrangeiros o Brasil foi, em geral, uma festa. Viralizou um vídeo em que futebolistas alemães torciam num hotel, ao lado de brasileiros, na disputa de pênaltis entre Brasil e Chile.
O ganho em termos de imagem para o Brasil é inestimável. A “publicidade” gratuita que a mídia internacional deu ao país com seus textos e vídeos não tem preço.
Não é que o Brasil tenha passado por uma metamorfose súbita na Copa. É que a mídia, já faz um bom tempo, retrata um país que não existe.
É a Banânia, uma terra da qual devemos todos nos envergonhar. Segundo a mídia, somos corruptos, somos infames, somos linchadores, somos violentos, somos canalhas, somos ignorantes.
Falta alguma coisa? Ah, sim: somos feios.
O Brasil monstruoso da mídia não é, evidentemente, uma obra do acaso. O objetivo é convencer os incautos de que, com outra administração, viraremos um paraíso, mais ou menos como o Brasil que a Globo mostrava na ditadura militar.
Ou, tirados os exageros, como o Brasil sob a ótica dos jornalistas, turistas e jogadores estrangeiros que vieram para a Copa.
O país tem desafios monumentais para se tornar uma sociedade avançada, é certo. Os extremos de opulência e miséria ainda são intoleráveis, a despeito da redução da desigualdade verificada nos últimos anos.
Um “choque de igualdade” tem que percorrer o país.
Mas não somos a Banânia da mídia.
Melhor: a Banânia está representada apenas numa área. Na própria imprensa. A mídia brasileira é, em si, a Banânia que, ardilosamente, ela finge que o Brasil é.
Leia Também: A Copa vai mostrar ao mundo a nossa incompetência

Paulo Nogueira - as vidas paralelas de Dirceu e Barbosa


Dois homens que frequentaram nos últimos anos as primeiras páginas iniciaram, nesta semana, uma nova etapa em sua vida.
As fotos falam sozinhas.
É um Joaquim Barbosa reluzente, com ares de estrela de Hollywood, que você vê se despedindo do STF.
Jornalistas se apressaram em tirar selfies ao lado de JB. Seu futuro é previsível. Fora a pensão vitalícia de quase 30 mil reais, a possibilidade de fazer palestras em série com cachês milionários.
Quanto tempo vai demorar até que JB se torne colunista do Globo ou da Folha, comentarista da CBN e da Globonews – todas aquelas coisas, enfim, que alavancam você para a vida de palestrante?
A direita cuida dos seus.
Mas antes de tudo o ócio esplêndido, gasto em parte provavelmente no apartamento de Miami comprado com um expediente para evitar imposto.
A foto do segundo homem é bem diferente. É um Zé Dirceu muito mais magro e claramente abatido que é fotografado a caminho do seu emprego.
Foram sete meses de prisão por um capricho de Joaquim Barbosa, que contrariou uma jurisprudência consagrada para mantê-lo trancafiado.
Sete meses de cadeia deixaram marcas
Sete meses de cadeia deixaram marcas
Neste período de mais de meio ano, enquanto Barbosa fazia coisas como dar um giro pela Europa e ver num camarote a abertura da Copa do Mundo, Dirceu desfrutava o que a mídia chamava de “regalias” da Papuda.
O banheiro, por exemplo, não tem vaso sanitário, apenas um buraco. Mas para a mídia era como se Dirceu estivesse no George 5 de Paris.
Ainda agora é este o tom. Leio no site do Globo que “especialistas dizem que Dirceu debochou” dos brasileiros ao sair da prisão numa Hilux com motorista.
Como ele deveria sair para satisfazer o Globo? Ele deveria ir a pé para o trabalho? Numa perua Brasília 1974? De quatro?
Vou ver quem é o “especialista”. É Bolívar Lamounier, apresentado como “cientista político”, simplesmente. Pobres leitores do Globo. Talvez eles imaginem que Lamounier seja um analista “isento” e não, como é, um antigo militante do PSDB.
O que Lamounier tem a dizer sobre Robson Marinho, de seu partido, mantido há tantos anos no Tribunal de Contas do Estado mesmo sob evidências cabais de contas secretas na Suíça?
Então ficamos assim: o Globo quer que alguém bata em Dirceu e vai procurar esta pessoa no PSDB. Diz que ela é “especialista”, para lhe conferir autoridade. Só não avisa seu leitor de que o “especialista” pertence ao PSDB.
Num certo momento, pouco mais de dez anos atrás, as vidas de Joaquim Barbosa e José Dirceu se cruzaram. Estavam em situação diferente da atual.
Barbosa batalhava, sôfrego, por uma vaga no STF, e Dirceu era um ministro poderoso.
Algum tempo depois, no Mensalão, os papeis tinham mudado. Barbosa era Deus e Dirceu o demônio.
Nos últimos meses, em mais um giro da roda, Barbosa era o homem que podia fazer de Dirceu um presidiário em tempo integral, mesmo sob a reprovação de quase todos os seus colegas de STF – e fez.
Agora, Barbosa parte para um futuro que promete trazer dinheiro e status em grandes quantidades. Dirceu é uma incógnita: como a temporada na prisão o afetou?
Como a posteridade tratará dois homens tão diferentes mas que compartilharam uma mesma história de forma tão intensa?
Representam visões tão opostas que um haverá de aparecer como vencedor e o outro como vencido nos livros de história.
Qual o vencedor, qual o vencido?
Façam suas apostas, amigos.
Tenho a minha.
*Jornalista, fundador e diretor do Diário do Centro do Mundo