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Frase do dia

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Povo brasileiro
(...)
Um povo só
O melhor do mundo
Sem ser maior que ninguém
Mas, que é muito mais na sua diversidade
É a civilização do amanhã
Porque
É a soma de todos
Das virtudes que se agregam E defeitos que se diluem.
by
***

Vive les enfants du ‘Brizolon’! Vive les jeunes du Brésil!

Tout ne va pas bien, Madame La Marquise.
O CIEP 449, que leva o nome de seu autor, Leonel de Moura Brizola, é uma  das escolas da América do Sul que recebeu o selo de qualidade Label France Éducation, concedido a quem promove uma metodologia de excelência da Língua Francesa.
Fica em Charitas, Niterói, onde antigamente se mandavam os navegantes doentes, para morrerem em isolamento e não contaminarem a cidade do Rio.
Mas os guris do Brizolão não estão nadando em fartura, não.
Nem esquecem dos outros que não tem o que eles, mal ou bem, tem.
E mais mal do que bem, porque são vitimas da carência geral da educação e da carência particular do Rio de Janeiro.
E você vai ver no vídeo abaixo que a garotada não está mansa, não.
Il n’est pas douce.
Porque o velho homem que fez esta escola, pondo em prática o sonho de outro de sua geração, o garotão Darcy Ribeiro, não fez tudo isso para que eles fossem mansos.
Foi para ensinar o que eles aprenderam quase sozinhos e escreveram no cartaz da foto.
Uma escola para aprender a pensar, não a obedecer.
O contrário do que quer o cachorrinho de madame de São Paulo que quer colocar um espião em cada sala de aula.
E eu, que fiz o ginásio com o velho e sebento “Cours de Langue et Civilization Française”, ainda guardo comigo os lindos versos da Marselhesa que dizem: “Liberté, Liberté chérie! Combats avec tes défenseurs” (Liberdade, querida liberdade! Combata com teus defensores).
Os coroas que fizeram esta escola e o agora coroa que conta esta história estão orgulhosos de vocês.

Frase do momento



Se os governantes não construírem Escolas, em vinte anos faltará dinheiro para construir presídios
Darcy Ribeiro
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Cieps: Roberto Marinho bombardeou

... mas foram Moreira Franco e Marcello Alencar que os destruíram -
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Publiquei ontem aqui o depoimento do jornalista Luiz Augusto Erthal sobre a generosa aventura de Darcy Ribeiro e Leonel Brizola com seu projeto de educação integral e a oposição que, desde o primeiro momento, os Cieps enfrentaram de Roberto Marinho e seu império Globo.
Mas se o “cogumelo global”, como dizia Brizola, atacava pelo bombardeio, seus agentes no Governo do Estado, encarregados de dar fim – ou quase fim, porque muitos sobrevivem, sem o projeto original mas com o esforço e a dedicação de professores e diretores – têm nome e sobrenome e estão apontados no jornal que meu colega e amigo  publica, o Toda Palavra, que vai ouvir Lia Faria, uma das integrantes da equipe de Darcy:
Lia Faria, que ocupou os cargos de coordenadora-geral de treinamento de pessoal na primeira fase do programa (1985-1987) e de coordenadora pedagógica na segunda fase (1991-1995), afirma que, além do prejuízo para os alunos, a descontinuidade do projeto também deixou de formar pelo menos 50 mil profissionais nesses trinta anos. “Eu mesma capacitei pessoalmente nove mil professores”, afirma. Para ela, a capacitação de profissionais de três áreas (educação,saúde e cultura), com formação em exercício e a visão multidisciplinar

Segundo Lia Faria, os responsáveis pelo desmonte do programa “têm nome e sobrenome”: Moreira Franco e Marcello Alencar.

Cieps - “Governador, faça umas escolinhas…” Roberto Marinho tentou fazer Brizola abortar o projeto desde o início

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Luis Augusto Erthal é um teimoso. Insiste em ser jornalista, insiste em ser brizolista, insiste em editar livros e insiste em promover a cultura de sua terra, Niterói, onde me encontro exilado já faz tempo. Faz pior, insiste em ser meu amigo há mais de 30 anos, desde a finada Última Hora. E insiste, juntando toda a teimosia, em publicar jornais, um deles o que me envia, sobre os 30 anos do Programa Especial de Educação, que o povo conhece como Cieps, ou Brizolões.
Tem mais coisas, mas começo pelo depoimento pessoal que dá, no qual eu tenho culpa, porque “matriculei-o” por dois anos nos Cieps, em horário integral. Mas como jornalista, capaz de trazer detalhes, propostas, conquistas e dificuldades do mais ambicioso projeto educacional que este país já viveu. Ia dizer já viu, mas não o posso fazer porque não viu, pois essa revolução educacional, que mobilizou milhares de professores e centenas de milhares de crianças, jovens e adultos, numa área construída maior do que Brasília, na sua inauguração, foi criminosamente boicotada pela mídia.
Uma grande e generosa aventura, que jamais sairá de nossos corações, de nossas vidas e de nossos sonhos, que deixo que ele conte, porque o faz melhor que eu.


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Luiz Augusto Erthal
Não poderia publicar uma matéria sobre os Cieps sem dar um depoimento pessoal, por mais que me doam algumas das lembranças hoje sopesadas na distância desses 30 anos. Tive o privilégio de ver esse programa nascer e acompanhar cada passo da sua implantação. Talvez seja o jornalista que mais colocou os pés dentro dessas escolas, em muitas delas quando ainda se encontravam na fundação.
Estive no Palácio Guanabara, como jornalista e assessor de imprensa, nos dois governos Brizola (1983-1987 e 1991-1995). Cheguei em 1984 para participar de um projeto jornalístico, cujo objetivo era criar um caderno noticioso dentro do Diário Oficial do Estado, o D.O. Notícias, como ficou conhecido, uma estratégia para tentar enfrentar o cerco da mídia contra o governo. Fui designado pelo editor, Fernando Brito, mais tarde assessor-chefe de imprensa do governador, para cobrir as áreas de educação e esportes.
Passávamos os dias como combatentes às vésperas de uma grande batalha naqueles primeiros meses. Brizola conquistara o governo fluminense superando grandes obstáculos, desde atentados à sua vida até a fraude da Proconsult, uma tentativa desesperada de impedir sua chegada ao governo fluminense.
Havia uma enorme expectativa em torno dele desde a posse no Palácio Guanabara, que mais pareceu a queda da Bastilha, com o povo ocupando de forma descontrolada aquele símbolo de poder.  Afinal, nos estertores da ditadura, cada naco de poder reconquistado pelo povo era valioso. Vigiado de perto pelos militares, que permaneciam ainda no controle, bombardeado pela mídia conservadora e sufocado economicamente, Brizola tinha pouco espaço de manobra. Até que algo aconteceu.
“Agora esse governo começou!”, lembro bem da exultação do Brito ao voltarmos da apresentação do projeto dos Cieps, com a presença de Brizola, Darcy Ribeiro e Oscar Niemeyer, no Salão Verde do Palácio Guanabara. Uma revolução havia sido colocada em marcha. Estava claro para todos nós.
Brizola não tinha condições políticas de retomar naquele momento, como nunca mais teve, a reforma agrária e as outras reformas de base preconizadas por ele e por Jango em 64. No entanto, cria como ninguém no poder transformador da educação. Órfão de pai, que morreu emboscado ao retornar da última revolução farroupilha, em 1922, ano do seu nascimento, Brizola e seus irmãos foram alfabetizados pela mãe em Carazinho, interior do Rio Grande do Sul. Calçou os primeiros sapatos e usou a primeira escova de dentes aos 12 anos, na casa de um reverendo metodista, cuja família o adotou. Pode, então, estudar até formar-se em engenheiro. Fora salvo pela educação.
Quando governador do Rio Grande do Sul (1958-1962), construiu nada medos do que 6.300 escolas. “Nenhum município sem escola”, era o lema. Mas a realidade do Rio de Janeiro nos anos 80 era bem diferente. Ao retornarem do exílio, após 15 anos, Brizola e Darcy se depararam com a obra macabra da ditadura: o inchaço das grandes cidades, a favelização, a desestruturação familiar e o surgimento do crime organizado, que separavam, como bem sabemos hoje, nossos jovens de seu futuro. Aquelas escolinhas alfabetizadoras e formadoras de mão-de-obra técnica e rural do Rio Grande do Sul não resolveriam o problema do Rio de Janeiro pós-golpe.
A solução: uma escola integral em turno único, ofertando educação, cultura e cidadania; mantendo os jovens durante todo o dia longe das ruas e da sedução do crime organizado; dando alimentação, assistência médica, esportes e muito mais. Tudo isso, porém, tinha um custo e exigiria a ruptura de um velho paradigma da política brasileira – de que os recursos públicos sejam colocados à disposição das nossas elites e não do povo. A inobservância desse princípio levou o presidente Getúlio Vargas ao desespero e suicídio; o presidente João Goulart à morte no exílio e a presidente Dilma, agora, a um completo isolamento político, culpados, todos eles, por fazerem transferência direta dos recursos públicos para o povo e não para as elites.
Logo após o lançamento do programa dos Cieps, Brizola ainda tentou estoicamente obter o apoio do então presidente das Organizações Globo, Roberto Marinho. Sabia o quanto ele seria capaz de influenciar, para o bem ou para o mal. Apresentou-lhe pessoalmente o projeto e nos relatou depois:
“Ele olhou, olhou, olhou e não disse uma palavra. Em uma segunda oportunidade em que nos encontramos, eu cobrei: ‘Então, doutor Roberto, o que achou do nosso projeto’. Então ele disse: ‘Olha, governador, se o senhor quer construir escolas, está muito bem. Mas não precisa disso tudo. Faça umas escolinhas… Pode até fazê-las bonitinhas, tipo uns chalezinhos…’.” Depois disso não houve mais diálogo entre eles.
Os Cieps começaram a brotar do chão com a arquitetura inconfundível de Oscar Niemeyer. Eu fazia sobrevoos de helicóptero para fotografar as obras e, vistas do alto, indisfarçáveis, pareciam pragas que irrompiam da terra árida dos subúrbios e das cidades da Baixada Fluminense. Era a praga rogada pelo povo esquecido que, enfim, tomava sua forma visível e ameaçadora, pois apontava para uma nova ordem.
“As gerações formadas pelos Cieps farão por este País aquilo que nós não pudemos ou não tivemos a coragem de fazer”, afirmava Brizola. Esta, e só esta, é a razão do ódio e do horror que essas escolas incutem até hoje em nossas elites.
Eles ainda estão aí. Descaracterizados, desconstruídos, desativados, degradados. Mas cada um desses 508 Cieps ainda traz consigo a semente da grande revolução sonhada por Brizola e Darcy. São quinhentas “toras guarda-fogo” feitas de concreto armado, uma imagem dos pampas gaúchos com que Brizola gostava de ilustrar o futuro do nosso povo:
“Às vezes a fogueira do gaúcho parece ter-se apagado à noite, mas existe sempre a tora guarda-fogo, que esconde aquela centelha interior. Pela manhã, basta assoprá-la para a chama ressurgir.”



Direito de resposta de Leonel Brizola, lido por Cid Moreira

Há vinte anos no Jornal Nacional
por Luiz Augusto Erthal no blog Toda Palavra


O relato de Fernando Brito  sobre “o tiro que acertamos no cu de um mosquito” – no dizer de Leonel Brizola, a improvável vitória judicial que obrigou Cid Moreira a ler o seu direito de resposta contra a TV Globo, há exatos 20 anos – abre um baú de recordações e revelações que não se pode mais deixar fechado.


Aquela foi sem dúvida uma das mais espetaculares façanhas políticas e jornalísticas da qual tive o privilégio de participar – modestamente, é verdade – ao lado de um dos mais competentes e íntegros profissionais de imprensa que conheço. Durante uma boa dúzia de anos vivi a aventura de colaborar com Fernando Brito, como seu fiel escudeiro, na assessoria de imprensa do Brizola, dentro e fora de seus dois governos no Estado do Rio.
Partilhamos lutas e sonhos numa posição da trincheira difícil de se estar, lutando contra inimigos poderosos, tentando romper, mesmo que em pequenas brechas, a muralha de cinismo, hipocrisia e mau jornalismo erguida pela grande imprensa ao longo desses últimos 50 anos para tentar impedir o reencontro do povo brasileiro com a sua história. Na esteira dos anos de chumbo, a mídia e as elites criaram os anos de silêncio, cassando a palavra de líderes como Brizola (lembro de um casuísmo do TSE nas eleições estaduais de 1986 que chegou a proibir a presença dos governadores – leia-se Brizola – na propaganda eleitoral gratuita, quando Darcy Ribeiro disputava o governo fluminense contra Moreira Franco).
Aí entraram os tijolaços e as nossas quixotescas tentativas de buscar pelas vias judiciais os espaços que nos eram negados na mídia. Estas, na maioria das vezes, esbarravam no facciosismo do judiciário, depois de nossas respostas serem solenemente ignoradas dentro das redações. Eu mesmo cumpri algumas vezes o papel – apenas formal – de entregar pessoalmente na redação de O Globo textos que dali iam diretamente para a cesta do lixo, antes que os enviássemos aos tribunais.
Cabia ao Brito compor esses textos, ora ao lado do Brizola, mas muitas vezes a duas mãos apenas. E não só os tijolaços e os pedidos de direito de resposta, mas muitas peças de campanha e manifestações políticas que levavam a assinatura do Chefe. O processo era exatamente como descrito por ele em seu artigo. Uma sintonia perfeita com o estilo discursivo e o pensamento político de Brizola o levava a incorporá-lo. Sem qualquer insinuação metafísica, parecia mesmo ser tomado por ele.
Brito não apenas redigia, com o nosso auxílio, pois nesses momentos preferia discursar, cabendo-nos a tarefa de transcrever, com um ou outro debate sobre algum ponto do texto. Ele o sentia. Gerava-o sofregamente. Experimentava a dramaticidade daquela argumentação empírica, como o próprio Brizola a definia, às vezes até às lágrimas.
Recordo que, às vésperas da eleição presidencial de 1989, naquela que nos parecia, e era, a última grande encruzilhada histórica deste país, ele vomitava um artigo para ser publicado em O Dia na própria data do pleito. Lembro da última frase, que fechava o artigo mais ou mos assim: “Hoje, quando saíres de casa, olha para os olhos de teus filhos, de teus netos, me dê a tua mão e vamos juntos em busca do nosso destino…”. Na sala do Edifício Orly, onde ficava o nosso bunker, nossos olhos marejavam enquanto Brito corria, soluçando, para o banheiro.
Não, ele não era um ghost writer qualquer. Era, na verdade, a única pessoa capaz daquilo. E, a meu ver, por três razões conjugadas: primeira, por seu grande talento de redator; segunda, e mais importante, pela incorporação do pensamento, da identidade e da fidelidade política do próprio Brizola; e, terceira, sem a qual as duas anteriores de nada serviriam, por merecer a confiança absoluta do Chefe. Coisa para bem poucos dos que serviram a Brizola ao longo de sua trajetória.
Vivemos e choramos até hoje os nossos fracassos. Naqueles idos de 89 sentíamos como se fôssemos a última linha de defesa da histórica bandeira política do povo brasileiro – o Trabalhismo. Vi o grande Doutel de Andrade prantear, pouco antes de morrer, repetindo insistentemente: “A nossa geração fracassou!” Vi Darcy, também antes de partir, confessar os seus fracassos: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”.
Muitos de nós, como eu, ficamos em determinado momento desesperançados e ensimesmados. Precisávamos encontrar nossos caminhos, e para jornalistas como eu, Apio Gomes, Osvaldo Maneschy e outros companheiros da mesma trincheira de Fernando Brito, dificilmente eles poderiam passar novamente pelas redações dos grandes jornais. Mas ao olhar para o que ajudamos a fazer há 20 anos, fica a sensação de que aquela fenda na muralha de cinismo continua aberta, minando essa estrutura iníqua até que ela um dia caia de podre.
Os vários arquivos que reproduzem no YouTube o direito de resposta conquistado por Brizola contra a TV Globo em 1994 somam centenas de milhares de exibições e continuam sendo visualizados a cada dia por mais pessoas. E quantas das muitas mentiras da Globo levantadas contra Brizola naquela época ecoam ainda hoje? Foram sepultadas para sempre no limbo da história.
Ao rever a cara de bunda do Cid Moreira  passo a pensar menos nos nossos fracassos e mais em uma das grandes imagens do Brizola, o único talvez que nunca admitiu o fracasso – a da lenha guarda-fogo. Ele dizia que nós, trabalhistas, somos como aquela tora mais grossa da fogueira do gaúcho no pampa, que guarda uma centelha de chama no seu interior mesmo quando não se vê. Durante a noite, a fogueira parece ter-se apagado. Mas, pela manhã, o gaúcho se levanta e assopra as cinzas, fazendo rapidamente levantar novamente o fogo necessário para a sua jornada.


Fracassei em tudo que tentei na vida

Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. 
Tentei salvar os índios, não consegui. 
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. 
Tentei fazer o Brasil  desenvolver-se autonomamente e fracassei. 

Mas os fracassos são minhas vitórias. 

Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.

do brasileirissímo Darcy Ribeiro

Viva o Povo-Nação brasileiro

por Carlos Tautz
Darcy Ribeiro costumava dizer – e escrever em livros como o Viva o povo brasileiro – que a dimensão mais acabada da nação brasileira era seu povo. O Brasil, para ele, era o feliz produto de uma miscigenação intensa de indígenas da América do Sul com africanos escravizados e europeus desterrados, onde só quem dá certo mesmo é o povo e a geografia deste país com dimensões de continente.

O povo, aliás, é quem mais teria avançado na construção de algo que se aproxime de uma nação, a despeito das instituições e das elites. Daí povo-nação.

Foi inevitável a lembrança de Darcy nesta semana, ao percorrer 1000 km dos sertões de Sergipe e Alagoas (com uma cidade de incrível nome Jacaré dos Homens), saindo de Aracaju, alcançando a hidrelétrica Xingó e o cânion formado pelo represamento do São Francisco. Aliás, por falar nele, o Velho Chico, o da integração nacional, sofre de assoreamento, desmatamento das margens e extração superintensa de sua água. Não chega perto da pujança de há 500 anos, quando as caravelas nem precisavam vir à terra se abastecer de água doce porque a tremenda correnteza potável do São Francisco invadia o Atlântico 3 km além da costa.
Descendo pelo lado alagoano, cheguei à Penedo e Apiaçabuçu, de onde partem os que visitam a foz do Velho Chico. Passei, entre outros, pelos povoados Potengi, Deserto Feliz e a cidade de Coruripe, indo até Maceió, para dali voltar à capital sergipana pela BR-101, por centenas de quilômetros do latifúndio da cana-de-açúcar que escraviza o solo e acorrenta o Brasil ao século 17.
Ao longo dessa diminuta epopéia pessoal, o traço comum na costa, na Caatinga, no rio-mar e no mar mesmo era aquele que Darcy amava. Em cada uma dessas paragens há um povo que constrói na terra, ora esverdeada pela recente chuva, com seus afazeres do dia a dia, uma nação e luta contra uma brutal concentração de renda e instituições públicas que adoram fazer um gol contra a sociedade.
No turismo, na pesca, na agricultura em que labuta (no latifúndio da cana, não!, que ele é paupérrimo de mão de obra!), é o povo brasileiro quem define a cara verdadeira do Brasil e lhe dá sentido, e não o governo, os parlamentos, os tribunais ou a universidade.
Se Darcy usou seu acúmulo intelectual, a sensibilidade e a paixão brasileira para cravar a melhor definição que há desse País, são as camponesas, os pescadores, as frentistas, os funcionários, as professoras e o gentio todo quem dá à nação uma cara de pele mestiça e vai concluindo esse projeto civilizatório chamado Brasil.


Carlos Tautz, jornalista, coordenador do Instituto Mais Democracia – Transparência e controle cidadão de governos e empresas.

O testamento de Darcy Ribeiro

Por Rodrigo Vianna


A TV Senado levou ao ar no fim de semana um belo documentário sobre Darcy Ribeiro. Documentário clássico, em que os depoimentos costuram a história. A diretora Maria Maia não pretendia se mostrar genial. Até porque gênio era o personagem retratado.

Entrevistei Darcy uma vez, em 1995, pela TV Cultura. Fazíamos um especial sobre UTIs, sobre formas de humanizar o tratamento hospitalar. Darcy tinha muito a dizer. Fugira pouco antes do hospital, porque o ambiente da UTI o matava lentamente. Fugiu porque queria escrever (terminar de escrever, na verdade) seu grande livro: O Povo Brasileiro. Deu certo. Fugiu, escreveu, e viveu mais alguns anos.

Era a segunda vez que driblava a morte. Nos anos 70, exilado, teve câncer de pulmão. Foi desenganado pelos médicos. Pediu aos militares autorização para voltar ao Brasil, onde queria morrer. Voltou, e não morreu. O amor pelo Brasil, pelo conhecimento, pelos índios e pela educação: tudo isso alimentava Darcy Ribeiro.

Acadêmico, jamais se escondeu atrás da pompa universitária. Fundou a UnB (Universidade de Brasília), andou pelo Brasil, fez Política com P maiúsculo. Foi Chefe da Casa Civil do governo de Jango. Caiu em 64. Foi o último janguista a abandonar o Palácio, com o golpe já consumado. teve que fugir de Brasília num teco-teco, ao lado de Waldir Pires. Diz que foi o momento de maior tristeza na vida: saber que haviam sido derrotados pela direita. Exilou-se no Uruguai, Chile, Peru. Já era um antropólogo renomado. Vivera entre os índios – sua primeira grande paixão. Escrevera sobre os índios obras fundadoras.

O exílio permitiu que estudasse mais sobre América Latina. Debruçou-se sobre o tema. Escreveu o grandioso As Américas e a Civilização. Depois da Anistia (e do drible no câncer), Darcy fundou o PDT com Brizola. Foi vice de Brizola no Rio. Idealizador dos CIEPs e do Sambódromo.
Perdeu a eleição para governador em 86, para Moreira Franco. Mais tarde, viraria senador. Nacionalista, professor, namorador… O documentário retrata bem a vida de Darcy.

Adorava o Brasil. “Temos um povo maravilhoso, e uma classe dominante horrorosa. Precisamos dar lição a ela, mostrar que é possível construir esse país”, diz Darcy em transcrição não literal, numa das entrevistas concedidas pouco antes de morrer e recuperadas no documentário.

Ele dizia que “sentia dó” porque não veria a grandeza do Brasil consumada. Iria morrer antes. E disse, olhando para a câmera e para as gerações mais novas: “ficam vocês encarregados de fazer esse país. Mas façam! Sem copiar ninguém! Seremos uma das grandes civilizações desse mundo”. 

A história mais emocionante sobre Darcy é contada por uma das médicas que cuidou dele. Pouco tempo antes de morrer, Darcy – percebendo que o fim se aproximava – disse que queria ficar em casa. E pediu: “doutora, estou com uma vontade de dar uma aula, a senhora não me traz uma criança pra eu dar a aula?“. Deu aula a uma criança de 9 anos. Falou sobre o Brasil, sobre a importância de respeitar todas as culturas. Falou sobre escolas e sambódromos. Era o testamento que ele queria deixar. 

Darcy amou o Brasil. Sem pompa, mas com energia. Viva o Darcy Ribeiro!

Fonte: http://www.rodrigovianna.com.br/sopa-de-letras

Frase do dia


Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca".
Darcy Ribeiro

Educação: Globo e sociedade se rendem a Leonel Brizola e Darcy Ribeiro


Em 1982, Leonel Brizola assumiu, eleito pelo povo, o Governo do Estado do Rio de Janeiro. Darcy Ribeiro, antropólogo e educador, seu Vice-Governador e Secretário de Estado de Cultura, Ciência e Tecnologia, propôs ao Governo que, em lugar de multiplicar conformadamente aquela escola conservadora que, nas suas palavras, fingia que ensinava as crianças que fingiam que aprendiam, era vital que se promovesse uma revolução na educação desse País, dando a ele a escola verdadeira e honesta que seu povo merecia.

Com a aprovação do Governador Leonel Brizola, o Professor Darcy Ribeiro solicitou a Oscar Niemeyer um projeto arquitetônico capaz de conter os espaços necessários a uma escola de tempo integral e que possibilitasse, através de sua multiplicação, baixos custos e montagem rápida.
Projeto Pedagógico - O gênio de Oscar Niemeyer produziu um prédio, executado com seis peças pré-fabricadas de concreto armado, cuja beleza e impacto chegaram a encobrir o projeto pedagógico desenvolvido no interior do mesmo. Enquanto Niemeyer trabalhava no projeto arquitetônico, professores trabalhavam sob a orientação de Darcy Ribeiro na estrutura do I Programa Especial de Educação, do seu projeto pedagógico. Leia mais>>>

Cieps: Educação em tempo integral


O CIEP é um símbolo do encontro feliz de três gênios brasileiros: Leonel Brizola, o político a favor do povo e da nação; o educador Darcy Ribeiro que mentalizou o CIEP como o útero do povo brasileiro; por fim o arquiteto Oscar Niemeyer, cujo desenho na arquitetura traz a inscrição popular da rede de dormir, das veredas do sertão, das curvas das montanhas e da mulher brasileira. Esse encontro propiciou a criação do CIEP.

Educação

[...] o único caminho

Diferente da austeridade imposta pela educação de séculos atrás, quando o rigor da disciplina – muitas vezes com severos castigos corporais – era o que imperava na condução do ensino, pensar hoje a educação é uma tarefa que precisa ser feita com sensibilidade, razão, forte sentido humanista e, acima de tudo, vontade política. 

A educação ultrapassa os limites dos abnegados professores batalhando na sala de aula, e vai para muito além dos limites físicos de nossas escolas. Essa palavrinha mágica abre portas, desenha o destino e tange no horizonte o futuro num sopro de anseio e vontade. A educação é emancipação social, econômica, política e ideológica. A educação é o princípio da cidadania e a consolidação dos povos como nações.

Não por acaso, a educação é a área da administração pública que, por lei, deve receber o maior investimento dos governos em seus orçamentos. Desde a formação do movimento sindical, em 1979, e mais à frente com a redemocratização do País, na década de 1980, a educação avançou em determinados pontos e ficou engessada em outros, num contexto complexo e desafiador. Os professores passaram a propor, com mais audácia, novos caminhos para a educação, adequando-a, cada um ao seu modo de pensar, a modelos que o sistema público não conseguiu absorver.

A começar pela estrutura física das escolas, que é a mesma desde quando fui aluno no saudoso Lyceu de Goiânia. Apenas recentemente ouvimos falar em Escola em Tempo Integral, algo que já existe há anos na Europa. A distância da política nas escolas, sempre trancada nos gabinetes, também é fator preocupante de comprometimento do setor público com essa importante área que já foi, em parte, tomada pela iniciativa privada.

Os problemas da educação começam no ensino básico. Essa fase essencial em nossas vidas, onde estão as raízes do  interesse humano  pelo conhecimento e da nossa própria personalidade, continua “enciclopédica”, tradicional e voltada para métodos antiquados, dissociados da realidade e dos tempos difíceis e desafiadores em que vivemos. Um ensino ainda dentro de padrões arcaicos de educação, onde os alunos não veem aplicabilidade naquilo que lhes é ensinado, aprendendo coisas que de nada lhes servirão na vida prática durante os cursos primário e secundário, gerando reflexos negativos quando chegam na universidade, sem uma base mais sólida e consistente.

Infelizmente, o Brasil apresenta outra deficiência crônica quanto ao ensino público superior. Deficiência que começou ainda no Brasil Colônia e se arrastou até os dias de hoje, tornando-se agora num nó que precisa ser desatado por uma profunda reforma universitária. Por falta de planejamento e visão de futuro, o País não teve como absorver a quantidade de alunos que estava saindo do ensino médio e ingressando no curso superior. Não existiam vagas para todos, e o País começou a apresentar impressionante demanda reprimida. O crescimento dessa demanda pode ser atribuído a dois fatores: o próprio aumento vegetativo da população e a necessidade cada dia mais frequente de profissionais e mão-de-obra qualificada. 

Não existia por parte da iniciativa privada  interesse maior em realizar investimentos de porte nessa área. As exigências do MEC eram muitas, dificultando a possibilidade de grupos educacionais investirem no setor. Para se constituir uma faculdade, eram necessários laboratórios específicos, nem todos os cursos eram liberados, e, os que eram, sofriam limitação no número de vagas a serem oferecidas. Resultado: o interesse em se investir na educação superior era quase nulo. 

Em 1987, o Ministério da Educação ampliou a facilidade de abertura das instituições particulares de ensino superior, diminuindo exigências e possibilitando o aumento do número de pessoas que ingressaram nas universidades. Só para se ter uma ideia, depois dessa medida o número de faculdades particulares aumentou mais de 300%, de 1987 a 1996, possibilitando que mais e mais estudantes brasileiros pudessem se formar, trabalhando de dia, estudando à noite e ampliando os seus horizontes de vida.

Se por um lado essa medida permitiu o aumento no número de trabalhadores com curso superior no País, também é verdade que a proliferação sem limites de faculdades particulares, com cursos (não todos) abaixo do padrão de qualidade, colocou no mercado uma pequena parcela de diplomados sem maior qualificação. Mas nem isso diminuiu o progresso alcançado e os milhares de excelentes profissionais que saem a cada ano dos bancos das universidades públicas ou particulares.

Há uma peça fundamental nessa engrenagem abençoada da educação, desde o jardim da infância até a pós-graduação nas universidades: o professor, esse missionário tantas vezes incompreendido, mal pago, enfrentando dificuldades de toda ordem, mas dando conta do seu recado! Os mestres desse Brasil gigantesco, seja a professorinha em começo de carreira lá nas margens do Araguaia, seja o consagrado catedrático das melhores universidades de nível internacional, são patrimônio inestimável, intocável e indispensável do povo brasileiro. Nem os pisos salariais baixíssimos, nem as escolas em petição de miséria, nem a falta de giz, nem os quilômetros de estradas de terra, com lama ou poeira, são empecilhos para que esses brasileiros da melhor qualidade forjem as gerações do futuro. Benditos os professores!

Otimista, percebo algumas mudanças na educação tanto em Goiás quanto no Brasil. As transformações apresentadas pelo Exame Nacional do Ensino Médio, por exemplo, dão um primeiro e importante passo para uma nova filosofia da educação, com reflexos positivos ao ensino superior. Primeiro, por tirar o aluno do vício enciclopédico, com aplicação das provas “em cima” de áreas do conhecimento, exigindo habilidades e competência do estudante. Aí está sendo edificada uma sólida base para o futuro de nossos estudantes que é, também, o futuro do próprio País.

A eleição direta para diretores das escolas públicas, outra conquista do movimento sindical e da comunidade escolar, é mais um avanço na educação.  Da mesma forma, a eleição direta dos reitores modernizou a vida universitária, democratizando-a e oxigenando-a.



O processo democrático é um momento importante, único e transparente, onde os pais discutem lá dentro da escola – no que chamamos de gestão participativa – qual o modelo de ensino que querem para os seus filhos, concretizando mais ainda o exercício da cidadania e a sedimentação de um modelo democrático e eficiente de se educar para a vida e o futuro. Sem envolver a sociedade nos assuntos ligados ao meio escolar, as decisões eram tomadas “de cima para baixo”, estabelecidas conforme as conveniências políticas dos governantes, prejudicando seriamente a qualidade do ensino ministrado aos educandos e o ânimo dos educadores. 


Da mesma forma, o programa de Educação de Jovens e Adultos, o EJA, fez com que o número de analfabetos caísse. Quantos pais e mães de famílias, muitos com filhos inclusive formados, redescobrem o mundo através do alfabeto! Algo que antes não fazia muita falta – após anos de costume –, hoje se torna indispensável, valoroso, formidável, bonito e mágico. Lembro-me do poeta Thiago de Mello ao dizer da alegria nos olhos de quem aprendeu a ler.   

O Brasil está seguindo rumo ao seu destino de grandeza. Nossas riquezas naturais, a beleza de nossa terra, a grandeza de nosso povo, a história feita a golpes de bravura e patriotismo, nada disso valeu ou valerá se não investirmos até o último centavo numa educação sólida, com o professor valorizado e o estudante bem preparado.  Não por acaso, esse País deu ao mundo alguns dos maiores educadores de todos os tempos: Anísio Teixeira, Paulo Freire, Darcy Ribeiro e Milton Santos. Nós sabemos educar, temos que fazê-lo e já não temos nenhuma dúvida: a educação é o único caminho para o futuro.

Delúbio Soares

Educação

O grande e inesquecível brasileiro Darcy Ribeiro dizia: 
"Nós precisamos cuidar das crianças e educá-las. E logo, porque a criança só tem sete anos uma vez". 

Sábias palavras. Resta perguntar: 
como um País que não valoriza o professor pode formar jovens, impedindo a entrada deles para o mundo do crime? Com Brizola e ambos inspirados no baiano Anísio Teixeira, Darcy fez a escola integral.


Reação do mal
Sucedeu que as elites não se conformavam com o fato de crianças pobres terem acesso a colégio de qualidade até maior que as que os ricos frequentavam.

Encantamento
Eu só conheci uma dessas escolas quando Brizola e Dar- cy não estavam mais no go- governo. O Rio de Janeiro já era governado, digamos as- sim, por Wellington Moreira Franco. Mesmo já tendo sido iniciado o sucateamento dos chamados Cieps, eu fiquei tão maravilhado com o que via que lá demorei de nove horas da manhã às sete da noite, nem lembrei de almoçar, sequer beber água.

Era assim
Como funcionava. Os pais deixavam o filho cedo da man-hã. A criança tomava café, merenda-va, ia ao banho, almoça-va, atividades à tarde (reforço escolar, línguas, esporte), outra merenda, banho e jantar, quando o responsável ia buscá-la. Para que pobre precisa disso? - era o pensamento sujo.

Essa gente quer vender o Brasil





No momento em que o tema das privatizações volta ao debate público, vale a pena reler o que Darcy Ribeiro falou sobre a venda da Vale do Rio Doce, em 10 de janeiro de 1997, um mês antes de morrer. 

A Vale acabou sendo privatizada no governo FHC por insistência do então ministro do Planejamento, José Serra.