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Ainda sobre a meritocracia


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A arte de envelhecer, por Drauzio Varella

Achei que estava bem na foto. Magro, olhar vivo, rindo com os amigos na praia. Quase não havia cabelos brancos entre os poucos que sobreviviam. Comparada ao homem de hoje, era a fotografia de um jovem.

Tinha 50 anos naquela época, entretanto, idade em que me considerava bem distante da juventude. Se me for dado o privilégio de chegar aos 90 em pleno domínio da razão, é possível que uma imagem de agora me cause impressão semelhante.

O envelhecimento é sombra que nos acompanha desde a concepção: o feto de seis meses é muito mais velho do que o embrião de cinco dias.

Lidar com a inexorabilidade desse processo exige uma habilidade na qual nós somos inigualáveis: a adaptação. Não há animal capaz de criar soluções diante da adversidade como nós, de sobreviver em nichos ecológicos que vão do calor tropical às geleiras do Ártico.

Da mesma forma que ensaiamos os primeiros passos por imitação, temos que aprender a ser adolescentes, adultos e a ficar cada vez mais velhos.

Rebelde precoce

Com certeza por ciúmes do irmãozinho Eric, mas também provavelmente por influência dos protestos de rua, minha neta Alice, a dois meses de completar 4 anos, tem estado muito rebelde — malcriada, desobediente, respondona. Respeito que é bom, nada, pelo menos em relação a mim. Faz caretas com a língua de fora — “brruuuu” — e só falta me vaiar. Acho que tudo piorou depois que o Papa, fazendo apologia da contestação, anunciou que “um jovem que não protesta não me agrada”. Ela deve ter visto na TV e resolveu seguir o evangelho segundo Francisco.
Ainda ontem, brincando com ela de massinha de modelar, confundi a figura de um cachorro com a de um cavalo, uma confusão que eu julgava natural na minha idade. Pra quê? “Você só faz bobagem”, ela me recriminou e eu fiquei tentando me lembrar se algum dia ousei falar assim com meu avô.
Quando tento uma gracinha, em vez de provocar risos, recebo gozação: “Vovô Zu é bobo!” “Tive uma ótima ideia”, ela diz e, diante de minha curiosidade para saber qual era, exibe seu preconceito feminista: “Não adianta, homem não sabe nada.” Essa impaciência se manifesta também toda vez que não consigo aprender a lidar com o Ipad, que ela domina. 
No meu tempo, criança não tinha mau humor, que era coisa de adulto. Já Alice tem acordado mal-humorada, ou porque não dormiu bem ou por motivos não revelados. “Estou irritada e hoje não quero conversa com ninguém”, limita-se a responder. A única maneira que descobri para romper esse gelo não é recomendada, porque se trata de suborno.
Como, além de gênio, ela é interesseira, apelo: “Pena você não querer conversa porque tinha um presente-surpresa pra você.” Ela vem correndo e eu dou escondido o biscoito de chocolate que ela adora e que o pai proíbe fora de hora. Uma amiga politicamente correta se escandalizou: “Isso é corrupção!”, me recriminou, e eu a provoquei: “Estou preparando ela para a vida lá fora.” Enfim, já vejo o dia em que, repetindo o ronco das ruas, minha neta vai chegar exibindo para mim o cartaz: “Você não me representa.” Aí eu chamo a polícia.
Preocupada com esse estado de ânimo de Alice, Mary resolveu recorrer à sua amiga Lucia, que a tranquilizou, informando que Lucinda, um ano mais velha, também passou por essa fase. Aliás, continua. É a chamada fase “monstro”. Se não se percebe isso nas crônicas-exaltação do Veríssimo abordando o tema, é que esse deslumbramento irrestrito parece que é comum nos avôs de idade mais avançada.
Tenho muito medo de chegar lá assim.

Para que serve uma relação?

Definição mais simples e exata sobre o sentido de mantermos uma relação? 
"Uma relação tem que servir para tornar a vida dos dois mais fácil" 
Vou dar continuidade a esta afirmação
porque o assunto é bom, e
merece ser desenvolvido.  
Algumas pessoas mantém relações
para se sentirem integradas na sociedade,
para provarem a sí mesmas que são capazes de ser amadas,
para evitar a solidão,
por dinheiro ou
por preguiça.  
Todos fadados à frustração.
Uma armadilha.


Uma relação tem que servir para 
 você se sentir 100%  
à vontade com outra pessoa,
à vontade para concordar com ela e discordar dela,
 para ter sexo sem não-me-toques ou
para cair no sono logo após o jantar,
pregado.
 

Uma relação tem que servir  
para você ter com quem ir  
ao cinema de mãos dadas,
para ter alguém que instale o som novo,
 enquanto você prepara uma omelete,
para ter alguém com quem viajar para um país distante,
para ter alguém com quem ficar em silêncio,
sem que nenhum dos dois se incomode com isso.
Uma relação tem que servir para,

às vezes, estimular você  
a se produzir, e,
quase sempre,
estimular você a ser do jeito que é,
de cara lavada uma pessoa bonita
a seu modo.
Uma relação tem que servir para  
um e outro se sentirem amparados  
nas suas inquietações,
para ensinar a confiar,
a respeitar as diferenças que há entre as pessoas, e
deve servir para fazer os dois se divertirem demais,
mesmo em casa,
principalmente em casa.
Uma relação tem que servir para

cobrir as despesas um do outro num momento de aperto 
e cobrir as dores um do outro num momento de melancolia,
e cobrirem o corpo um do outro, quando o cobertor cair.
Uma relação tem que servir para

um acompanhar o outro no médico,  
para um perdoar as fraquezas do outro,
para um abrir a garrafa de vinho e
para o outro abrir o jogo, e
para os dois abrirem-se para o mundo,
cientes de que o mundo
não se resume
aos dois. 
Dr.Drauzio Varela