A história o refaz destas lágrimas |
Ao nojo, à vergonha, ao espanto, à indignação, à tristeza, como todo mundo, eu cheguei ontem.
Mas não ao desânimo.
Não porque seja mais valente que qualquer um – e como nossa gente foi valente! – ou porque vá ficar trombeteando uma vitória parlamentar que nunca passou de esboço e, agora, parece ainda mais improvável.
Mas porque entendo o governo como um meio da política e não, um fim em si mesmo. Para quem tem ideias pró-povo, pró-país e pró-justiça (a social, porque a outra, está lambuzada até a medula), ele é indispensável para a consecução destas ideias, mas não é suficiente, porque sem a política suas ações não mobilizam e galvanizam a vontade popular e acaba por erodir-lhe o apoio.
Mesmo capenga, manietado, confuso, deficientíssimo e até com muitas contradições, é obvio que era (e ainda é, apesar de improvável) importantíssimo manter o governo. Menos que pelos avanços que ele ainda pudesse fazer que pelos retrocessos que ele poderia evitar que se fizessem.
E que se farão.
Ainda assim, não considero que o campo popular e nacionalista da política brasileira tenha sequer de longe razões para desanimar – motivos que, claro, reconheço aos indivíduos, que sentem o recuo de anos e sabem a vida curta para a História.
Os homens podem chorar o leite derramado. A história o refaz destas lágrimas.
É assim para as ideias, nem para as coletividades.
Ambas se constroem com o conhecimento acumulado em suas próprias lutas, seja nas vitórias ou nas derrotas.
Estamos apenas no começo de um movimento que vai longe porque tem agora o que, com triste sinceridade, eu não via há dois anos.
Identidade com fraternidade entre os vários grupos, juventude dominando as manifestações (onde antes eu achava fácil os meus contemporâneos, já ficou difícil fazê-lo, embora estejam lá), narizes que andavam torcidos se destorcendo, porque sente o fedor grande que vem por aí, intelectualidade voltando a se mobilizar por causas gerais, e não por “ativismos setoriais” apenas e, apesar da miopia de alguns fraternos companheiros do PT, o fim do “exclusivismo petista”, em causas que são deles, mas não apenas deles e muito maiores que de qualquer partido.
Seremos mais fortes sem o Governo? Obvio que não e, pior, nosso povo estará mais fraco e desprotegido.
Mas não estamos nem estaremos mortos.
Décadas atrás, de volta para a roça onde nascera, minha velha avó caminhava, com aquela leiteira de alumínio tópica, até a Cooperativa, para buscar leite. E o neto, com seu fusquinha bege, incomodado com a longa caminhada, insistia em levá-la de carro. Ela se escapava do convite, negaceava, até o dia em que me disse: Fernando, eu não nasci com rodas, nasci com pernas.
Nós não nascemos com Governo, não vamos morrer sem ele. Vamos defende-lo agora e, se preciso, retomá-lo depois.
Agora, com tudo o que aprendemos, espero.