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Crônica semanal de Luis Fernando Verissimo


A narrativa

Fizeram um filme do romance apocalíptico do Don DeLillo chamado “Cosmópolis”. O diretor é David Cronemberg e o filme é sobre um dia na vida de um jovem financista, um dos mestres do universo, que comanda seus negócios internacionais de dentro de uma limusine impermeável enquanto lá fora o mundo — ou pelo menos Nova York — desmorona.

No filme há uma fala, não sei se do DeLillo ou do roteirista, que define tanto o poder do jovem protagonista, que pode arruinar nações inteiras com um toque no seu celular, quanto o caos que o cerca. “Toda riqueza se transformou em riqueza apenas pela riqueza, e o dinheiro, tendo perdido sua qualidade de narrativa, passou a só falar com ele mesmo.” Perfeito.
O dinheiro perdeu seu papel na grande narrativa do capitalismo que vem da acumulação primitiva de capital e da industrialização e chegou à globalização, e hoje é apenas um interlocutor de si próprio. A narrativa acabou, a riqueza se acumula entre poucos e beneficia ainda menos e o dinheiro, desobrigado de fazer sentido e de seguir qualquer espécie de roteiro, só produz monstros como o jovem financista do filme.
O capital financeiro dita a historia econômica do mundo e inventou uma nova categoria literária: o dialogo de um só.
Gostei de saber que um grupo de economistas de varias partes do mundo lançou um manifesto criticando o que parecia ser uma quase unanimidade — as exceções eram Paul Krugman e três ou quatro outros — a favor das medidas de austeridade e sacrifício de gastos sociais para combater a atual crise econômica global provocada pelo capital financeiro.
O grupo reage à ortodoxia monetarista que faz a vítima pagar pelos desmandos do vilão e tenta interromper o autodiálogo do dinheiro endossado por tantos economistas. Felizmente, não por todos.
A grande narrativa do capitalismo foi excitante, enquanto durou. Revolucionou a vida humana e, junto com suas barbaridades, fez coisas admiráveis. Tudo que era sólido se desmanchava no ar, para ser recriado no ciclo seguinte. Mas nem Marx previu que seu fim seria este: no meio de um mundo em decomposição, o dinheiro falando sozinho.

O capitalismo financeiro é uma utopia

Em 1997 o  PFF - Produto Fictício Financeiro - era 15 vezes o PIB mundial. Passado 15 anos é de 60 vezes mais. Qualquer pessoa com o minimo de inteligência e bom senso sabe que isto não se sustenta é uma mentira deslavada esta " riqueza ".

Quando isto vai acabar, quando pelo menos os governos começarão a regular este mercado?

Quando não sei. Mas, que isto será regulado...será!

Porém, antes disto haverá muito sofrimento, dor para nós pobres  [ pobres mortais ].

Tem mais: 
A potência mundial do futuro será a que resolver esta questão da banca que joga sem dinheiro para pagar as fichas.


Presente para banqueiros

A austeridade e os banqueiros
por Simon Jonhson

Papai Noel chegou mais cedo, neste ano, para quatro ex-executivos da Washington Mutual (WaMu), um grande banco americano que faliu em 2008. A Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC, que garante os depósitos nos bancos americanos) tinha iniciado ações judiciais contra os quatro, centradas nos enorme riscos financeiros assumidos porque “sabiam que o mercado imobiliário caracterizava uma bolha”. A FDIC queria recuperar US$ 900 milhões, mas os executivos acabaram fechando acordo por US$ 64 milhões, dos quais arcarão com apenas US$ 400 mil, sendo o restante pago por suas seguradoras.
Sem dúvida, os executivos perderam seus empregos e agora precisam abir mão de suas reivindicações adicionais de indenização. Mas, de acordo com a FDIC, apesar disso, os quatro embolsaram mais de US$ 95 mil de janeiro de 2005 a setembro de 2008. Assim, eles se safaram com grande quantidade de dinheiro. Isso é o que acontece quando executivos financeiros são remunerados por “retorno sobre o patrimônio” não ajustado por riscos. Os executivos levam a melhor quando as coisas vão bem e quando riscos se concretizam eles nada (ou quase nada) perdem.
Ao mesmo tempo, suas atividades – e atividades similares de outros banqueiros – são diretamente responsáveis, tanto pela alta dos preços das casas com por seu colapso danoso que se seguiu. Esse colapso impactou os não banqueiros de muitas maneiras negativas, especialmente através da perda de mais de 8 milhões de empregos.
O colapso também provou austeridade – os impostos estão sendo elevados e os gastos do governo estão caindo em nível local e estadual em todo o país. Há uma difícil negociação fiscal em nível federal pela frente, mas cortes e contrações de vários tipos parecem prováveis.
Algumas pessoas argumentam que os americanos precisam apertar os cintos. Essa é uma discussão interessante, especialmente num momento em que o desemprego está acima de 8% (com recentes declínios em grande parte resultantes da decisão de muitos trabalhadores desempregados de parar de buscar emprego e abandonar inteiramente a força de trabalho total). É pouco provável que precipitar uma onda de austeridade ajude a economia americana a encontrar seu caminho de volta para níveis mais elevados de emprego.
Mas o que dizer do apoio do governo aos grandes bancos? Será que isso está diminuindo, tendo em vista nossas atuais pressões fiscais? Infelizmente, não; persiste muito apoio governamental, implicitamente mantido mediante a política de não permitir o colapso de bancos “grandes demais para falir” e explicitamente por meio de diversos tipos de apoio proporcionado pelo Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA).
A lógica – ou, talvez devêssemos denominá-la ideologia – por trás do apoio aos grandes bancos é que eles são necessários para que a economia se recupere. Mas essa posição parece cada vez mais duvidosa, quando os bancos estão sentados em cima de uma pilha de dinheiro, enquanto consumidores e empresas merecedores de crédito estão relutantes em tomar empréstimos.
A mesma situação existe hoje na Europa, onde a realidade é ainda mais dura. Os bancos estão recebendo cada vez mais socorro, ao passo que, como resultado, os países que tomaram empréstimos estão cortando programas sociais e enfrentando crescentes tensões sociais e instabilidade política. Países como a Grécia, Itália, e, possivelmente, Portugal, estão superendividados, e agora seus cidadãos enfrentam graves consequências. Mas os banqueiros não sofrem nada por terem emprestado demais.
Sem dúvida, algumas das principais instituições financeiras europeias poderão agora enfrentar dificuldades, e – quem sabe – talvez alguns de seus executivos acabem sendo demitidos. Mas será que alguém acredita que as pessoas que afundaram os bancos europeus deixarão seus cargos com nada menos do que considerável fortuna?
Os manifestantes do movimento “Ocupar Albany” proclamaram recentemente uma firme declaração consensual, dizendo, em parte: “Os interesses daqueles que compram influência são recompensados à custa do povo, do qual deriva o poder do governo justo. Acreditamos que essa falha em nosso sistema está no cerne de muitas questões interligadas com que nos defrontamos, como sociedade, e que sua resolução é a chave para um futuro justo. Por isso exigimos democracia verdadeira, dissociada da influência corrosiva do poder econômico concentrado e conclamamos todos aqueles que compartilham esse objetivo comum a aliarem-se a nós e atuar nesse sentido”.
Os grandes bancos representam a última palavra em poder econômico concentrado nas economias contemporâneas. Eles são capazes de resistir a toda reforma significativa capaz de efetivamente mudar seus esquemas de remuneração. Seus executivos querem ficar com todo o lucro e, ao mesmo tempo, blindar-se contra todo e qualquer prejuízo real.
Mas um capitalismo sem a perspectiva de insucesso não merece a designação de economia de mercado. Estamos colhendo consequências um regime de subsídios em larga escala não transparentes e perigosos concedidos pelo governo em benefício de um punhado de gente extremamente rica.
Jon Huntsman, um candidato republicano à indicação para disputar a presidência, está abordando diretamente essa questão – insistindo em que deveríamos obrigar os maiores bancos a se desmembrar e tornar-se mais seguros. Nenhum outro candidato à presidência está encarando seriamente esse problema: simplesmente dizer “vamos deixá-los falir” não é uma resposta séria, quando o colapso de megabancos causaria tanto dano.
Devemos aprender tanto com o Washington Mutual como com o movimento “Ocupar”. Nos dois casos, a lição é a mesma: o poder financeiro concentrado é um presente que continua sendo dado – mas não para você.
Simon Johnson é ex-economista chefe do FMI, é cofundador do blog de economia, BaselineScenario.com, professor da MIT Sloan, membro sênior do Peterson Institute for International Economics, e coautor, com James Kwak, de “13 Bankers” (13 banqueiros).

O capitalismo atropelou a democracia

[...] Os mercados se cansaram desta bobagem de soberania democrática

 No ano passado, de fato, o capitalismo atropelou completamente a democracia. Em nenhum lugar isso é tão visível como na Europa, onde instituições financeiras e grandes investidores foram à guerra sob a bandeira da austeridade e governos de países com economias não muito produtivas ou sobrecarregadas descobriram que poderiam não satisfazer às exigências e continuar no poder.

Os governos eleitos da Grécia e Itália foram depostos. Tecnocratas financeiros estão no comando nos dois países. É como se os mercados por toda a Europa tivessem se cansado dessa bobagem de soberania democrática.  Para ninguém achar que exagero, considere-se a entrevista concedida por Alex Stubb, ministro da Europa para o governo de direita da Finlândia, ao jornal Financial Times no último fim de semana. Os direitos políticos da Europa Central e do Sul seriam subordinados, basicamente, aos da Alemanha e da Escandinávia.   

O requisito de que se deve possuir propriedade para votar - abolido neste país no início do século 19 pelos democratas jacksonianos - foi ressuscitado por poderosas instituições financeiras e seus aliados políticos. Para os países da união monetária europeia, a "propriedade" de que precisam para garantir seu direito de voto é uma classificação de crédito apropriada.
   
Isso tudo parece muito estranho. A ideia de que há um conflito entre nossos sistemas econômico e político é difícil de aceitar, e não somente nos Estados Unidos. Também na Europa tem-se assumido até aqui, que democracia e capitalismo (ao menos, o capitalismo social europeu) andam juntos.
    
Agora, os mercados estão contra-atacando. Napoleão não conseguiu conquistar toda a Europa, mas a Standard & Poor's talvez ainda o consiga. Conflitos entre capitalismo e democracia estão eclodindo por toda parte. E os europeus poderão ter de enfrentar, em breve, uma questão que não consideraram por muitíssimo tempo, se é que algum dia consideraram: de que lado eles estão.
por Harold Meyerso

Um jogo de azar

O comunicado conjunto divulgado pelo G20 ao final de encontro para estudo e implantação de regras para o sistema financeiro internacional revelou que está por vir uma queda-de-braço entre a sociedade, via seus Governos, e a banca.

Considerado o mais incisivo desde o início da crise mundial iniciada em 2008, o comunicado reforça o que todos já sabemos: é fundamental regular o setor.

Por ora, nenhuma medida concreta foi tomada, e o G20 volta a discutir o assunto em junho. Os governos demoram a cobrar contrapartidas do mercado financeiro pelo socorro - com dinheiro público! - recebido durante a crise. Assim, o comunicado ainda está mais no campo da satisfação à opinião pública do que no de uma real transformação do sistema.

Enquanto isso, os bancos dos países emergentes - os do Brasil, também, obviamente- começam a pressionar para evitar a nova regulação que está sendo desenhada.

Os banqueiros usam o discurso de que as novas regras mais rígidas diminuirão a atual expansão do crédito, que tem sido a base do desenvolvimento desses países. Além disso, aludem a um suposto impacto nas taxas de crescimento do PIB que a reforma acarretaria.

Era de se esperar uma reação de um setor que passou os últimos 15 anos atuando como bem queria, na esteira do receituário neoliberal - no Brasil, implementado pela gestão tucana de Fernando Henrique Cardoso,mas principalmente no centro do capitalismo financeiro os EUA, onde a política de desregulamentação, da era Reagan e Thatcher, se consolidou e predominou com Bush.

A proposta que fazem, indiretamente, é algo assim: atuamos sem regulamentação para impor os rumos que desejamos à condução da economia e, em caso de crise, os governos vêm nos socorrer.

Ora, fica evidente que só uma decisão política pode superar a resistência da oligarquia financeira internacional, dos grandes bancos e dos rentistas - no mundo e no Brasil também. Não podemos nos esquecer que é justamente a ausência de regras que possibilita à banca restringir o crédito quando quer.

Foi o que aconteceu no Brasil durante a turbulência global: restrição de financiamentos, apesar de o governo Lula ter sinalizado, e atuado, no sentido contrário. Para impor uma barreira à crise, nossa economia praticamente só pôde contar com o dinheiro público (Banco do Brasil, BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Nordeste do Brasil), situação que ainda prevalece.

Em geral, a imprensa brasileira incentiva o rentismo, como se verifica nas seguidas páginas que sentenciam uma inevitável alta da Selic, uma cobertura com contornos de torcida pelos juros altos. Não se vê na mesma proporção ataques ao injustificável spread praticado pelos bancos.

Por essas razões, ou bem os governos agem com vontade política e promovem uma reforma profunda no sistema financeiro global, que vá além do atual debate sobre diminuir a alavancagem, taxar o capital especulativo e desencorajar a tomada excessiva de riscos; ou as cartas na economia seguirão como hoje, nas mãos da banca.

Neste jogo de azar, quem perde somos nós, a sociedade.