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Pirotecnia e fumaça

Leia entrevista feita pelo jornalista Josias de Souza com o deputado Odair Cunha ((PT - MG) relator da cpi do Cachoeira

- Por que o sr. propôs o ‘sobrestamento’ das convocações de Fernando Cavendish e Luiz Antonio Pagot? 
Mais adiante, se a investigação revelar que é necessário, podemos ter a convocaçao deles. O que não quero é que a gente faça convocações pirotécnicas. Não podemos admitir que seja criada uma cortina de fumaça –mais que cortina, um oceano de fumaça— que desvie a atenção do principal.
- O que é o principal? 
Temos uma organização criminosa, que tinha uma atuação territorial importante. Estava muito fortemente impregnada no centro do Brasil, em Goiás, com incursões fortes no Distrito Federal. Analisava ir para outros Estados da federação como Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso e Tocantins. Há evidências dessa movimentação.
- O que seria a cortina de fumaça ou oceano de fumaça, para usar sua expressão? 
De repente, nós queremos investigar uma empreiteira no Brasil inteiro, todos os contratos, de maneira ampla, geral e irrestrita. Isso é oceano de fumaça.
- Não teria sido adequado aprovar as convocações e condicionar a data dos depoimentos à conveniência da apuração? 
Eu preciso analisar toda a documentação da Delta. A partir dessa análise é que poderei tomar uma decisão. Em vez de encaminhar uma votação para derrotar os requerimentos, preferi sugerir que fossem sobrestados para permitir que analisemos os dados. Mais adiante, podemos tomar os depoimentos se eles forem necessários.
- O senador Vital do Rêgo disse considerar a convocação de Cavendish irreversível. Sua posição parece ser diferente. Ele pode vir ou não? 
Exatamente.
- No início da CPI, seu plano de trabalho circunscrevia a investigação ao Centro-Oeste. Depois, quebrou-se o sigilo da conta bancária da matriz da Delta, no Rio. A investigação não se tornou nacional? 
Não havia restrição geográfica. Estamos investigando uma organização criminosa, que tem uma base territorial muito definida em Goiás, com pessoas que dispõem de prerrogativa de foro e que foram corrompidas e cooptadas. A profundidade dos tentáculos dessa organização e os danos que ela causou à segurança pública no Estado não são pequenos.
- Quando diz pessoas com prerrogativa de foro, assim, no plural, refere-se ao senador Demóstenes e ao governador Marconi Perillo? 
Há deputados, secretários de Estado… Nós estamos investigando. São pessoas que têm prerrogativa de foro e há indícios de vínculos sociais, econômicos, políticos e negociais. Estamos procurando elucidar esses vínculos.
- Em dado momento, o sr. manifestou-se favoravelmente à quebra do sigilo bancário da Delta nacional, que acabou ocorrendo. Por quê? 
Admiti a quebra do sigilo da conta nacional porque verifiquei que, ao quebrar o sigilo das contas da Delta no Centro-Oeste, não identificamos o dinheiro. Os contratos, mesmo os que eram intermediados pelo Demóstenes e pelo Cachoeira, mencionavam o CNPJ 001 [da matriz]. Os recebimentos eram feitos nesse CNPJ 0001. Então, a quebra do sigilo nacional foi necessária para desvendar a organização criminosa. Mas isso não significa uma investigação de todos os contratos da Delta no Brasil inteiro. Isso levaria ao que estou chamando de oceano de fumaça.
- Quer evitar que a investigação chegue aos contratos do PAC? 
Minha preocupação com isso é zero. Vamos investigar onde a organização atuou. Se o Cachoeira influenciou na obtenção de contratos do PAC, nós vamos investigar. Não tem problemas investigar esses contratos, desde que tenham sido intermediados pela organização criminosa ou no interesse dela.
- Em algumas CPIs anteriores, partiu-se da investigação de casos específicos e chegou-se a algo mais amplo. A CPI dos Correios, por exemplo, teve como origem o vídeo de um diretor de compras recebendo uma propina e terminou no mensalão. No caso da CPI do Cachoeira, tem-se a impressão de que também poderia evoluir para algo mais amplo. Não seria o caso de abrir o leque? 
Se abrirmos o leque, vamos salvar a turma do Cachoeira. Tenho certeza disso.
- Por quê? 
Nós não vamos conseguir descobrir os vínculos dessa organização que tomou conta de boa parte do aparelho administrativo do Estado de Goiás, infiltrou-se no aparelho de Estado do Distrito Federal e tinha o projeto de ampliar sua atuação para outros Estados da federação. Isso está intimamente ligado à questão de segurança pública, por exemplo. O índice de homicídios em Goiás só aumentou.
- Não contempla a hipótese de a investigação esbarrar em outros crimes? 
Se eu encontrar indícios mínimos de outros crimes, posso fazer menção no meu relatório. Mas antes de fazer menção no relatório final, identificando-se esses indícios, vamos encaminhar para o Ministério Público e para a Polícia Federal. Agora, fazer espetáculo no plenário da CPI e ficar levantando suspeitas sobre o Brasil só serve para salvar a turma do Cachoeira.
- Os dados bancários que já chegaram à CPI permitem formular hipóteses sobre a abrangência da investigação? 
O problema é que as informações são muito inconsistentes. Vamos aproveitar essa próxima semana para irmos diretamente aos bancos, para pedir maior consistência nos dados e informações padronizadas que facilitem o trabalho de investigação.
- Mas essas informações não chegam à CPI depois de passar pelo do Banco Central, que as padroniza? 
Não é assim. Por enquanto, a única conta que chegou da Delta foi a do BMG e os dados estão confusos.
- Quando se determina uma quebra de sigilo, o pedido não é encaminhado por meio do Banco Central? 
Sim, o pedido vai ao Banco Central, que informa aos bancos que eles precisam enviar os dados. Os bancos mandam diretamente para nós, não por intermédio do Banco Central. Por isso falta padronização.
- Quantas são as instituições que devem informações à CPI? 
Pedi para fazer esse levantamento. Na segunda-feira devo ter isso.
- Quanto à convocação de Antonio Pagot, a hipótese de que venha a ocorrer a partir de uma sugestão do relator é menor do que as chances de convocação do Cavendish? 
Não dá para dizer isso ainda. É preciso aguardar pelo avanço da apuração. Na minha opinião, hoje, o Pagot foi mais alvo da organização criminosa do que cúmplice dela. Isso, numa análise feita com base nos dados disponíveis. Mas é preciso ir adiante. Não posso dizer nada sobre isso ainda.
- Então, a análise da conveniência de convocação do Cavendish e do Pagot se equiparam? 
Exatamente. Em relação ao Cavendish, se tivermos boa vontade com ele, podemos dizer que foi, no mínimo, displicente com seus negócios. A Delta Centro-Oeste serviu aos interesses da organização criminosa. Teve um contraventor como sócio. Precisamos avançar para saber até onde isso chegou.
- O senador Jorge Viana (PT-AC) diz que essa CPI está fadada a chegar ao caixa dois de campanha. Ele não vê outra finalidade para os repasses feitos a empresas fantasmas da quadrilha senão a de financiar campanhas políticas. Concorda com esse raciocínio? 
O que está no foco da comissão é a organização criminosa. Isso inclui o caixa dois criado por ela. Não creio que eles só faziam dinheiro para campanha. Essa história de caixa dois de campanha foi a forma que a organização utilizou para ocupar o aparelho de Estado, financiando políticos. Através do financiamento de campanha, criou-se uma fonte de poder paralelo.
- Portanto, o tema caixa dois terá de ser tratado pela CPI? 
Entendo que sim. Mas não apenas esse tema. A Lei de Licitações é outro tema que tem que ser tratado. Temos que buscar formas de coibir essas iniciaitivas, fazendo com que o crime não valha a pena do ponto de vista econômico.
- O TRF de Brasília analisa recurso que pede a anulação dos gampos das Operação Monte Carlo, sob a alegação de que a investigação partiu de uma denúncia anônima. O relator do caso, desembargador Tourinho Neto, votou a favor da anulação. Que tipo de prejuízo uma decisão como essa traria para a CPI? 
Para a CPI, não haveria nenhum prejuízo. A CPI, como comissão parlamentar de inquérito, não conduz ação penal. Essas provas são essenciais na ação penal. Na CPI, estamos buscando provas que confirmem os indícios de crime. Uma denúncia anônima, uma matéria jornalística ou uma prova que a Justiça diga que é ilegal, tudo isso constitui para nós da CPI um conjunto de indícios que servem para que a gente busque as provas.
- O presidente da CPI, Vital do Rêgo, disse ao repórter Fernando Rodrigues considerar que a eventual anulação das provas fragiliza o trabalho da CPI, já que o material recolhido pela PF não poderia ser usado no relatório final. Na sua opinião, a CPI teria de desconsiderar os grampos? 
Entendo que não. Nosso caminho de investigação vai continuar considerando esses áudios. No fundo, eles são indícios contundentes.
- Podem ser usados mesmo depois de declarados ilegais? 
Nós vamos usá-los. Eles são indícios. Se alguém liga para nós e faz uma denúncia anônima, a partir dessa denúncia, vamos buscar fatos que a confirmem ou não. Com os grampos ocorre a mesma coisa. São indícios. Precisamos buscar as provas que os confirmem.
- Está diferenciando o procedimento político do judicial? 
Diferencio o procedimento político, que se encontra numa fase comparável à de um inquérito, do processamento de uma ação penal. No nosso caso, integramos uma comissão política com poderes de realizar um inquérito. Nessa fase, mesmo que as interceptações telefônicas sejam consideradas legais, elas precisam ser corroboradas por outras provas. Sozinhas, elas não são provas cabais. Temos que buscar outras provas que confirmem os eventos apontados nas interceptações. Então, utilizando-as como indícios, nós vamos buscar essas outras provas. Suponha que, numa das interceptações, fulano diga que está repassando dinheiro para beltrano. Eu preciso encontrar esse dinheiro numa conta ou obter uma confissão. Temos que buscar provas. Se as provas forem declaradas nulas, o que a Justiça não pode mais fazer nós podemos.
- Nesse particular, o sr. está falando uma língua ligeiramente diferente da do presidente Vital do Rêgo, não? 
Trabalhamos de forma muito afinada. Não conversamos sobre esse tema ainda. São compreensões jurídicas.
- Em relação ao cronograma, trabalha-se com a perspectiva de prorrogar a CPI? 
Não. Vou entregar o meu relatório em novembro, como previsto. Obviamente, é preciso ter a clareza de dizer que a investigação é que vai dizer se isso será ou não possível.
- Considerando-se o estágio atual, sua opinião é a de que não se configura um quadro de prorrogação da CPI? 
Entendo que isso ainda não está configurado.
- Verifica-se na comissão que as maiorias são ocasionais. Mudam conforme o tema sob análise. Acha que vai dispor de maioria para impor a sua linha e o seu cronograma? 
Acho que isso vai se impor como necessário. Se nos desviarmos do nosso rumo, vamos criar esse oceano de fumaça a que me refiro e essa quadrilha que se instalou em Goiás, em boa parte do Distrito Federal, com muitos interesses ocultos vai sair ilesa. Isso já está acontecendo.
- Como assim? 
O voto do desembargador favorável à anulação das provas é o caminho para isso no âmbito do Judiciário.
- Mas isso independente da CPI, não? 
Isso, de fato, independe de nós. Mas validar os indícios por meio da obtenção de provas só depende de nós.
- O que achou da manifestação do deputado Miro Teixeira a respeito da presença de uma tropa do cheque na CPI? 
Ele tem que apontar os nomes ou os indícios que ele tem sobre isso. É inadmissível que se levante suspeita generalizada.
- Verificou-se que duas pessoas, o senador Ciro Nogueira e o deputado Maurício Quintella Lessa estiveram com Cavendish em Paris. 
Vou esperar a manifestação deles para poder me pronunciar sobre isso. Prudência e caldo de galinha não fazem mal para ninguém.