Já naquela época, por ali entre José carregar Maria num burrico e Pilatos lavar as mãos, Jesus já repartia o pão. Tivesse ele nascido na Itália, repartiria a pizza, fosse proveniente de Miami, dividiria o hambúrguer.
A partir daí, a gente entende a importância de ratear, entre os amigos, a comida nossa de cada dia.
Se Ele repartiu o pão, foi unicamente porque era o que tinha no cardápio do dia. Tenho pra mim, inclusive, que era um pão tabica (bisnaga para os cariocas, bengala para paulistas) porque, pelos meus cálculos, o Pai, o Filho, o Espírito Santo, 12 apóstolos, noves fora nada; um francesinho não ia dar conta.
O fato é que a tradição chegou aqui no Recife na versão francesa. Influenciados pela beleza da corte, o povo levou a sério quando Maria Antonieta disse, “se o povo não tem pão, que coma bolo” (que no original era brioche, mas numa livre adaptação literária troquei por bolo que é bem mais gostoso). E tenho atestado a tradição, passada de geração em geração, na prática.
Com a função de entrevistar recifenses sobre histórias de Carnaval, faz 15 dias que vou à casa dos entrevistados colher depoimentos. E não houve uma só residência em que não nos fosse servido bolo com suco.
Duas entrevistas pela manhã, duas à tarde, uma à noite e eu já tinha comido bolo suficiente para minhas três próximas gerações. Bolo de tapioca com suco de umbu na casa de periferia, torta alemã com suco de graviola na cobertura em Casa Forte, bolo de rolo com suco de cajá no Torreão e, entre o câmera/ação e o corta, os vigilantes do peso iam engolindo, sem reclamar, todas as calorias da boa hospitalidade nordestina.
Se eu tenho um conselho para você, é que não recuse o lanche do seu anfitrião. Nenhuma desfeita pode ser maior, para um pernambucano da gema, do que uma visita recusar os quitutes trazidos bem naquela horinha antes da despedida.