Recentemente, o colunista e blogueiro Ricardo Noblat escreveu um artigo sobre Lula. Trata-se de um dos mais significativos artigos dos últimos anos. Não para entender o fenômeno Lula, mas como material de estudo sobre como o senso comum da mídia o via.
Deixe-se de lado a bobagem de apresentar Lula como ameaça à democracia por convocar o exército de Stédile. É tão inverossímil quanto os 200 mil soldados das FARCs que invadiriam o Brasil em 2002, em caso de vitória de Lula.
Fixemos nas outras características de Lula, apud Noblat: rude, grosseiro, desleal, por não ter defendido José Dirceu e Luiz Gushiken. Também despeitado já que, segundo Noblat, ele queria ser candidato em 2014 e Dilma não permitiu (não é verdade, mas não importa). Ou a ficção de que luta para enfraquecer Dilma - mesmo Noblat sabendo que o fracasso de Dilma seria o fim do lulismo. No ano passado cometeu o feito de chamar Lula de “moleque de rua”.
O que é fascinante em Noblat é o uso da fita de medir homens comuns aplicada em homens de Estado. Pois por aí ele reedita um fenômeno que marca a politica desde os tempos de César: a dificuldade do homem comum em interpretar o Estadista e os recursos para trazer o personagem ao nível da mediocridade (entendido aí do pensamento médio) do leitor.
Mais um vez recorro a Ortega y Gasset e seus portentosos ensaios sobre Mirabeau. Foi o homem que, na Constituinte, salvou a revolução francesa, apontando os rumos e definindo o novo desenho institucional.
Algum tempo depois morreu e seus restos mortais inauguraram o Panteon, que a França reservou para celebrar seus grandes homens. Aí descobriram o diabo da vida pregressa de Mirabeau. Aprontou todas na juventude, deflorou virgens, fugiu com mulheres casadas, deu tombos.
Imediatamente, os homens (comuns) de bem moveram uma campanha para retirar seus ossos do Panteon. E permitiram quase século e meio depois que Ortega traçasse perfis primorosos do Estadista, do homem comum (que ele denominava de pusilânime) e do intelectual.
O perfil do Estadista
O Estadista é um exagerado em tudo, um megalomaníaco, dizia Mirabeau. Pois não é que Napoleão tinha a mania de grandeza de se imaginar Napoleão?. Só um megalomaníaco compulsivo tem a pretensão de mudar o Estado.
Não é tarefa para homens comuns, para intelectuais ou para santos.
O Estadista se propõe a desafios tão grandiosos que assusta os homens comuns - e é para eles que Noblat escreve e é como eles que Noblat pensa, derivando daí sua competência jornalística.