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A Meca dos coxinhas


***
Tô no Shopping Iguatemi, a Meca dos Coxinhas. Os homens aqui andam uniformizados, todos com gel na chapeleta, sobrancelha Edney Silvestre e agasalho salva-vidas azul-chumbo.
Deselegância discreta ô caralho.
A crise tá tão braba que as lojas estão disputando até clientes não potenciais como eu. Fui arrastado pra dentro de um troço chamado "Espaço Alpha".

- Senhor, vamos cuidar da imagem?
- Você é publicitário?
- Não, sou o Jonas, gerente.
- O que é isso aqui?
- É uma barbearia premium.
- Humm.
- Olha como está a barba do senhor.
- Como assim?
- Está desalinhada. Cheio de buraquinho na sua bochecha.
- Tenho uma preguiça da porra de fazer a barba.
- Aqui você não precisa fazer nada. Vamos cuidar do senhor.
- Mas...
- O senhor conhece nossa missão, visão e valores?
- Isso aqui não é uma barbearia?
- Veja nossa carta, senhor.
- Carta?
- Temos várias opções. Essa aqui é a barba-executivo. Vai ficar show, hein?
- Hum. Tô vendo aqui o cardápio. Barba-Christian Bale?
- É uma das que mais saem. Mas não vai ficar bem no senhor.
- Por que?
- É preciso ter lábios mais finos.
- Humm. Gostei dessa aqui.
- Ah, a Lumberjack, a lenhador. Essa é top, mas também não é seu perfil.
- Não é meu perfil?
- Só combina com cabelo undercut ou razor part. E o senhor é calvo...
- Então tem que ser a barba-executivo?
- Sim, mas antes o senhor vai ter que limpar as células mortas.
- Células mortas?
- Sim, com Recharge After Shave.
- Quanto custa?
- R$ 143.
- E pra fazer a barba?
- R$ 99. E o senhor ainda tem direito de ficar meia hora no nosso lounge após a hidratação. E pode baixar a trilha no seu Spotify.
Alguma coisa acontece no meu coração...
Que só quando cruzo o Rascal com o Café Santo Grão...

Mais causos do Tom T. Cardoso 

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Quando minha carreira profissional deslanchou, por Tom T Cardoso

Minha filha de 12 anos já sabe falar alemão, inglês e espanhol.
Outro dia, entrou em casa chutando a mochila. Tinha tirado 8,1 em Biologia.
Abri o armário. Fui fuçar o meu histórico escolar. Estavam ali, os boletins dos tempos de Virgília, a escola estadual onde passei boa parte da minha juventude até conseguir completar o colegial. Perto de mim, o Bolsonaro é um acadêmico brilhante.
Eu era tão preguiçoso e cara de pau, que uma vez, precisando entregar um trabalho enorme de ciências, colei o capítulo inteiro de um livro do Mario Schenberg, ele mesmo, o lendário físico, amigo de meu pai e de Albert Einstein. Contava com a ignorância do professor de física para não ser desmascarado.
Acho que até ganharia um dez, com louvor, se não tivesse, distraído, incluído no texto a seguinte frase: "veja a figura ao lado".
Em 1990, já reprovado quatro vezes, consegui tirar 6,5 em OSPB (Organização Social e Política Brasileira) e ainda ganhei um elogio do professor por ser o único a explicar razoavelmente quem era Golbery do Couto e Silva. Um isolado momento de glória de minha vida escolar.
Eu era um caso curioso. Semi-analfabeto - não sei até hoje conjugar nenhum tipo de verbo e não faço a menor ideia do que seja adjunto adverbial -, lia, desde os onze anos, todos os colunistas dos quatro jornais trazidos pelo meu pai (também jornalista): JB, O Globo, Estadão e Folha.
Com 12 anos li "Minha Razão de Viver", do Samuel Wainer, e "A Regra do Jogo", do Claudio Abramo. Decidi ser jornalista.

O Tinder é perigoso, por Tom T. Cardoso


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- Quem são esses aí na sua camiseta?
- Jonn Travolta e Samuel L. Jackson.
- O que eles fazem?
- São os protagonistas de Pulp Fiction, pô.
- Nunca vi. É uma série?
- Não, um filme do Tarantino, que já virou clássico.
- Quem é esse cara?
- Esse quem?
- O Tarantino.
- É um cineasta.
- Sou ligadona em filmes.
- Tô vendo. O que você tem visto?
- Vários, mas filme pra mim tem que entreter.
- Qual foi o último que você viu?
- Foi com aquele que era gordo e ficou magro. Ôooooo...
- Leandro Hassum...
- Isso! Ele é top, cago de rir nos filmes dele.
- Caga?
- Sim, ele é muito engraçado.
- Então, não sei se você vai gostar desse filme de hoje...
- Já achei estranho esse cinema fora do shopping. Tem combo?
- Vamos ver. Então, é o novo filme do Spike Lee.
- Ele é irmão desse cara aí?
- Que cara aí?
- O da sua camiseta, Samuel Le...
- Não, não, nada a ver.
- Gato, podemos ver outro filme, por favor...
- Por que?
- Filme de chinês me dá dor de cabeça. Eles falam muito rápido.
- Mas...
- E da próxima vez compra dublado. Fica a dica.
Tinder é mesmo perigoso. Fica a dica.
Tom T. Cardoso
***

Café em cápsulas

Eu não ouvia nada tão triste desde que minha mãe me contou que não existia vida após a morte. Eu tinha 4 anos. Agora eu tenho 44 e não esperava passar de novo por um momento tão doloroso.
- Seu Tom, não vou mais trabalhar para o senhor. É o meu último dia. Era a Geni, a diarista que não faz café para qualquer um, me contando que havia recebido uma proposta de trabalho irrecusável.
- Quem é ele, Geni?
- Ele é seu amigo no Facebook.
- Quem?
- Chico Barbosa. Um careca, de óculos, cheio de pelo no ouvido.
- Eu sei quem é. Feladaputa. Invejoso.
- Ele foi bem objetivo comigo, Seu Tom. E me convenceu.
- Ele vai te pagar o dobro?
- Quase o dobro. Vou ter outras vantagens também. Não pude recusar, Seu Tom.
- Quais vantagens?
- Olha essa mensagem que ele me passou pelo Facebook.

“Prezada Genivalda. boa tarde. Você não me conhece, mas eu a conheço bem. Acompanho há tempos o seu drama pelo Facebook. O Tom, além de explorar a sua imagem, a usando para vender um livro de piadas, trabalha, mesmo no inverno, de cueca no sofá e a obriga a fazer pelo menos oito cafés por dia. Genivalda, a senhora não precisa passar por tantas privações. Venha trabalhar comigo. Sou um homem limpo, discreto, com algumas manias, é verdade, mas nada que se compare ao constrangimento de ver o Tom de cueca toda quinta-feira e ser citada por ele em quase todos os posts, sempre em posição vexatória. Aguardo uma resposta sua, para combinarmos o valor da diária. Ah, e não vai precisar fazer mais café, apenas introduzir uma cápsula na minha máquina Nespresso e adoçá-lo (são quatro gotas de adoçante)”.
  Não disse nada para a Geni. Ela volta semana que vem. Não vai suportar (ninguém suporta) uma das manias do Chico. Tenho certeza.



 

Mais um causo do Tom T. Cardoso

Sou filho de pais hippies. Meu pai abandonou a luta armada pra ouvir Caetano. O Leãozinho e a Vaca Profana são responsáveis pela minha existência. Sou grato a eles.
  Mas juro que muitas vezes deu vontade de nascer filho do Bolsonaro com a Marine Le Pen. Principalmente quando me lembro dos quatro anos em que estudei no Mutirão, uma escola semi-integral que se vendia como "alternativa", mas que, na prática, estava mais para sítio dos Novos Baianos administrado por Josef Mengele.
    A diretora, chefe do campo de concentração de Cotia, era uma mulher chamada Ana Maria Pimentel, que obrigava a gente a comer arroz integral e feijoada de soja em plenos anos 70, numa época em que as crianças levavam fandangos de lanche.
  E não havia nem um tempo de adaptação para as crianças. Pior: quem não comia toda a comida do prato, levava castigo, como ficar quatro horas de pé no pátio fantasiado de agrião ou de tomate, dependendo do peso e altura. Não estou brincando. É sério.
  A Ana Maria Pimentel era uma ególatra. Toda segunda, a gente tinha que cantar o hino nacional, o de São Paulo e o do Mutirão, que começava assim: "De manhã ao sair para escola, lá se vai estudante feliz... E terminava assim: "Graças aos professores e a diretora Ana Maria".
   Eu odiava a Ana Maria e o seu cheiro de grão de bico. Ela morava na própria escola, numa casa rodeada de plantas e flores. Desde que entrei no Mutirão, ouvi sempre a mesma história: a conexão da Ana Maria com a natureza era titanta que ela era capaz de identificar qual aluno havia feito xixi em determinada planta ou flor, mesmo a quilômetros de distância.
   A história virou lenda e ninguém nunca ousou mijar no seu orquidário. Só eu. Sou mais curioso que medroso e um dia, após a aula de horta (sim, sei até hoje plantar um rabanete), descarreguei o suco de tamarindo inteiro no girassol predileto da Bela Gil do Mal.
  Não sei se ela era paranormal, ou mantinha homens da KGB infiltrados no quintal. Só sei que, no dia seguinte, o bedel da escola me pegou pelo braço e me enterrou até o pescoço exatamente ao lado do girassol.
   A história foi parar na página policial da revista VEJA, o que obrigou minha mãe, finalmente, a tomar uma providência e me matricular na Escola Chácara Crescer, também igual ao sítio dos Novos Baianos, mas com administração Baby Consuelo, com professores maconheiros e aulas práticas de poligamia. 
   Aí sim o meu mundo passou a ficar Odara.



Pra desopilar


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Ontem fui almoçar com meu grande amigo Afonso, o "Galã":
- E aí tudo bem? Me conta as novidades.
- Conto já Tom. Espera apenas eu gravar um áudio e mandar pelo WhatsApp.
- Certo. Tô esperando.
"Ando devagar, porque já tive pressa/ E levo esse sorriso porque já chorei demais". Pronto, Tom. Cara, quanto tempo a gente não tomava uma.
- É mesmo. Pra quem você cantou isso aí? É aniversário da sua mãe?
- Não. Foi pra Nanda. 
- Sua nova namorada?
- Sim. A gente combinou na virada de cantar um para o outro, todos os dias, trechos de canções. Amanhã vou cantar pra ela, "Tempo Perdido" e sábado, "Folhetim"
- Isso não parece ideia sua. Você sempre foi meio grosseirão.
- Não, foi ideia dela mesmo. Ela está me transformando num cara melhor, Tom.
- Tô vendo. Onde vocês se conheceram?
- Não sei exatamente. Acho que na Recoleta, em Buenos Aires.
- Como assim não sabe exatamente?
- Nosso perfil se cruzou por lá.
- Que perfil, Afonso?
- Do Happn.
- Ah bom.
- Aí vocês marcaram um encontro de verdade.
- Não. Eu estava correndo a maratona e voltei no dia seguinte. Ela mora lá, faz um curso de roteiro. Mas volta em maio pra São Paulo.
- Então vocês nunca se viram?
- Não.
- E estão apaixonados?
- Sim, visceralmente.
- Cuidado, cara. 
- Tom, você não está entendendo. Bateu uma química, uma coisa de pele mesmo.
- De pele? Via WhatsApp? Afonso...
- Tom, a gente gosta das mesmas coisas. Ela curte Kurosawa, adora comida peruana. Sabe qual o drinque favorito dela?
- Qual?
- Negroni! 
- E isso já é o suficiente para ela ser a mulher da sua vida? E se ela tiver bafo? Bruxismo? E se votar no Bolsonaro?
- Todo mundo é imperfeito, Tom. E já conversamos sobre política. Ele é centro -esquerda. Uma mulher de grande vivência. E uma leoa na cama.
- Como assim? 
- A gente já transou várias vezes pela web cam. Gozamos sempre juntos. Nunca tive essa sintonia com mulher nenhuma.
- Ah, a tal química, a coisa de pele. 
- Isso! Agora você está começando a entender. 
- Beleza, se você está feliz, tá valendo.
- Aliás, Tom, nosso almoço não pode ser demorado. Vou no Leroy comprar tinta. Vou pintar todo o apartamento. A Nanda escolheu as cores.
- Do quarto do bebê também? 
- Quarto do bebê?
- Ué, se ela é a mulher da sua vida, você vão ter filhos juntos.
- Você acha...
- Sim! Faça uma surpresa pra ela. Decore o quarto do bebê e mostre pra ela.
- Boa, Tom! Vou trocar "Tempo Perdido" por "Eduardo e Mônica". A Nanda vai amar. Ela adora ser surpreendida.

O Afonso foi lá comprar tinta e a frase do Millôr não me saiu da cabeça:
"Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem"
***

Os Tribalistas voltaram, por Tom T. Cardoso

O que me faz lembrar, de novo, da mais longa e sofrida entrevista que fiz na vida, nos meus 25 anos de profissão.
O ano é 1996. Fui a Salvador, pelo Estadão, entrevistar Carlinhos Brown, na época fazendo sucesso com a Timbalada.
Cheguei no Candeal na hora combinada com a assessoria: 11 da manhã.
Carlinhos já estava lá, em pé, cercado por 15 jornalistas. Todos baianos.
Fiquei sabendo que ele daria uma coletiva para a imprensa local e depois falaria, separadamente, com os quatro jornalistas da "grande imprensa": Antonio Carlos Miguel (O Globo), Silvio Essinger (Jornal do Brasil), Pedro Alexandre Sanches (Folha de S. Paulo) e o foca aqui.
Duas da tarde. Carlinhos ainda estava de pé, na mesma posição, cercado pelas mesmas pessoas. Estava morrendo de fome e fui até lá pegar um pouco de amendoim. Ouvi um trecho da entrevista:
(...)  contemporâneos por terem trazido ao mundo, ou melhor, por fazerem renascer, a intuição da força que nós chamamos de Axé...
Três da tarde. Fui pegar mais um pouco de suco de cajá.
(...) A colonização portuguesa também nos trouxe uma doçura, um força bruta do querer lusitano, do fado enfadado.
Fado enfadado? Putaqueopariu.
Quatro da tarde. Fim da coletiva.
A assessora vira para o quarteto do Sudeste e diz:
"Carlinhos vai dar uma palavrinha com o pessoal do Correio Nagô".
Seis da tarde. É noite no Candeal.
"Pronto. Carlinhos agora vai conversar com cada um. Quem será o primeiro?"
Foi minha a sugestão mais sensata da noite, acatada pelos outros três jornalistas: vamos fazer todos a mesma entrevista. Uma mini coletiva.

Choque de gerações, por Tom T Cardoso

Ontem fui pegar minha filha e amigas numa festinha. Já no carro, ouvi o seguinte diálogo:
- Julia, a Fernanda tá estaqueando agora.
- Sério? Eu shippo ela e o Pedro.
- Que nada, tá bugado, tá bugado.
- Tá nada.
- Tá sim! A Fernanda deu a maior sarrada nele. Eu vi.
Fiz prevalecer minha autoridade:
- Que história é essa de "sarrada nele"? Vocês só têm 11 anos...
- Ah, pai, laid-back.
- Cuma?
- Não brisa, pai, pô! Que saco.
Buguei. O abismo entre as gerações nunca foi tão grande.



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Primeiro encontro do Tinder, por Tom T. Cardoso


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- Olá, tudo bem? Senta aí Walkíria.
- Tudo bem, obrigada.
- Que cara é essa, zangada?
- Não. Só tenho esta cara.
- Tô parecido com a foto?
- Tá sim.
- Você tá estranha.
- Primeiro encontro do Tinder. 
– Não, você tá sem graça. O que foi?

– Tá bom, vou falar.
– Fala. 
– Tanto lugar legal na Vila Madá e você marca aqui na Mercearia São Pedro?
– Porra, a Merça é minha segunda casa.
– Humm.
– Relaxa. Você vai gostar daqui.
– Já achei estranho o cara colocar a gente no meio da mesa dos outros.
– Você tá num bar, Walkíria.
– Sei. Só por que é bar tem que ficar amontoado? É um rolo de papel higiênico ali na prateleira?
– É, tem um mercadinho dentro do bar.
– Que nojo. Comer olhando isso. Como é o esquema aqui? Comanda?
– Não, normal. Só chamar o garçom. Tá com fome?
– Sim. Tem espetinho de frango?
– Não. 
– E Temaki?
– Walkíria, isso aqui é um bar.
– Nada a ver. No The End lá da Vila Olímpia tem. E é bar.
– Relaxa, mulher. Vamos pedir um sanduíche de pernil?
– É nosso primeiro encontro e você vai pedir isso? Romântico você, hein. Aliás, você podia fazer a barba.
– Hehe, eu curto barba.
– Só tem homem de barba aqui. Tá parecendo passeata do PT.
– Você é tucana?
– Eu sou qualquer coisa, menos esse lixo do PT. Por que? Não vai me dizer que você é comunista?
– Deixa de ser ridícula, mina. Quem falou que petista precisa ser comunista?
– Ahhhh!!!! Voce é petista! Eu sabia! Eu sabia!
– Sim, com muito orgulho.
– Ah, era só o que me faltava, Comer sanduíche de pernil e com um petista. Bem que minha prima falou que o Tinder era roubada.
– Roubada é você. Sua cafona! 
– Seu comunista!
– Vaza, mina. Vai comer seu espetinho de frango lá na Vila Olímpia!
– Vai cagar, comunista! E não esquece de levar o papel higiênico.


Tom T. Cardoso - escritor e jornalista carioca, reside em São Paulo

Diálogos acadêmicos, de Tom T. Cardoso


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Mais um texto para ler, curtir, comentar e compartilhar.

– Vamos hoje de supino inclinado com halter? – Demorô. – Sabe o Eduardo Campos?
– Sim, aquele político que morreu num acidente de avião.
– Ele mesmo. Sabe de quem ele é filho?
– De quem?
– Do Chico.
– Que Chico? Chico Anysio?
– Não, sua anta. Do Chico Buarque.
– Sério?
– Sim. Li no site do Revoltados.
– Como descobriram?
– Pela cor dos olhos. Igualzinho.
– E ele nem foi no velório, no enterro?
– Que nada. Ele nem assumiu a paternidade.
– Que filho da puta.
– Puta cara escroto. Diz que lutou contra a ditadura. Ele queria era comer a mulherada.
– Ele é petista, né?
– É, petista doente. Visitou até o Zé Dirceu na prisão. Levou sabonete, livro... Dizem que chegou até a cantar pro Genoíno.
– Minha mulher disse que o pai desse Chico foi um dos maiores professores de história do Brasil.
– O cara é filho de professor e vira petista. Vai entender.
– O pai dele era foda. Minha mulher disse que ele é autor de uma teoria conhecida no mundo inteiro.
– Que teoria?
– Do homem jovial.
– Homem jovial? Como assim?
– É, não sei direito. Mas parece que é por isso que aqui no Brasil tem tanta academia. Somos os primeiros também em cirurgia plástica.
– Sua mulher tá entendida hein!
– É, ela faz aqueles cursos da Casa do Saber. Fala pra Fátima ir também.
– Vou falar.
– Ganha certificado e tudo. Agrega, né?
– Show.


Reunião de pauta, por Tom T. Cardoso

– Tom, precisamos de pautas mais quentes. Cadê o furo?
Era o editor do caderno de cultura, fazendo o que todo chefe tem que fazer: cobrar do repórter matérias exclusivas, de grande repercussão, chamadas de "furo" no jargão jornalístico.
– Pode deixar.
Essa cobrança era sempre feita na reunião de pauta. E nada é mais chato na profissão de jornalista do que participar de reunião de pauta. Por duas razões:
1) Elas não costumam demorar menos do que seis horas. Deveria ser o contrário, mas não existe bicho mais prolixo que jornalista. No Estadão, tinha uma decana da crítica de artes que falava mais do que o Fidel em assembleia da ONU. Isso numa época em que não existia candy crush e nudes para a gente se distrair. Enfim, um tortura, uma viagem às profundezas do tédio que espero nunca mais fazer.
2) Eu nunca tinha pauta para sugerir. Adotava sempre a mesma estratégia. Me sentava à mesa na direção oposta à do chefe, de frente pra ele. Assim, independentemente do repórter que ele escolhesse pra começar a reunião, do seu lado esquerdo ou direito, sempre ganhava um tempo para pensar em alguma coisa. Quase sempre eu inventava alguma pauta na hora – depois dava um jeito. Uma vez, sem pauta nenhuma, inventei que tinha conseguido uma entrevista exclusiva com o Sílvio Santos. Fui aplaudido de pé pelos repórteres – e pelo chefe.  O problema é que esse meu chefe, que havia trabalhado comigo justamente no Estadão, já conhecia minha tática.
– Tom, nem vem que não tem. Sugeriu uma entrevista na reunião, tem que fazer! Fiquei aflito. Tinha acabado de ser contratado. Precisava de um furo para me livrar da fama de repórter malandro. Tive "sorte": logo na primeira semana recebo um e-mail de um pesquisador baiano:
"Prezado Tom Cardoso, sou fulano de tal, pesquisador da UFBA, com mestrado não sei onde. Tenho, em minhas mãos, poemas inéditos do Torquato Neto. Interessa?"
É claro que interessava. Não se lia nada inédito de Torquato, jornalista e poeta, parceiro de Caetano e Gilberto Gil, amigo de fé de Glauber Rocha, um dos grandes nomes da contracultura (o tropicalismo não seria gestado sem ele), desde o seu suicídio, em 1972.
Enfim, seria um furo. Pedi para o pesquisador me mandar os poemas por e-mail. Ele mandou. Li e achei estranho. Não pareciam escritos por Torquato. Pedi o telefone do pesquisador e liguei pra ele.

– Olá. Recebi os poemas.
– Lindos, não?
– Sim, mas o estilo é diferente.
– Pode ser. Os poetas estão sempre em transformação.

Liguei para alguns jornalistas baianos. Eles conheciam o cara, que era, de fato, um pesquisador, e um profundo conhecedor da obra de Torquato. Fiquei mais aliviado e fui todo confiante pra reunião de pauta.
Me sentei ao lado do chefe e abri a reunião:
– Consegui poemas inéditos do Torquato Neto.
– Sensacional, Tom. Vamos soltar logo isso. Capa de amanhã, ok?
– Beleza, saio daqui e escrevo.
O caderno fechava ao meio-dia do dia seguinte. A vinte minutos do fechamento, já com matéria escrita, editada, paginada, a caminho da gráfica, eu liguei para o pesquisador.
– Opa, a matéria sai amanhã.
– Que legal! O Torquato vai gostar.
– Como assim gostar? Ele morreu, pô.
– Sim, morreu. Mas eu vou falar com ele.
– Tá doido. Papo de maluco. Se ele morreu como você vai falar com ele?
– Eu sou médium, Tom.
– Ahã? Como você conseguiu os poemas inéditos?
– Foram psicografados por mim.
Desliguei e fui correndo falar com o meu chefe:
– A matéria de capa tem que cair.
– Como assim, Tom? Os poemas não são inéditos?
– São, mas vieram do além.
Corremos os dois para a escada que dava acesso à gráfica. Cheguei lá e vi a revisora chorando lendo um dos poemas. Mandamos colocar um anúncio da Gillette na capa. Não fui demitido, mas quase fui fazer companhia pro Torquato.


Pinçado do Face de Tom T. Cardoso

Tom T. Cardoso: sonhei com o pinto do Zulu

Pedi no Facebook a famosa foto do pinto do Zulu - pois eu não encontrava sem tarja no Google - em dez (10) minutos recebi 156 fotos da mandioca orgânica. Cada foto enviada era acompanhado de um breve comentário.
"Quero ver agora a Sandy ter prazer anal", disse um amigo.
Uma garota de Fortaleza não se impressionou com os padrões Kid Bengala do dublê de ator e sim com a sua simetria: nunca viu um pau tão centralizado. 
“Repara, ele não entorta nem na ponta". Reparei. 
Uma senhora de Sorocaba não gostou do que viu: prefere o charme discreto do pinto do Stênio. O comentário mais intrigante, porém, foi o da Geni, a diarista que não faz café pra qualquer um:
- Já pensou ele de cueca no sofá? Deusmelivre. Ainda bem que trabalho pro senhor.
Até agora não sei muito bem o que ela quis dizer com isso. 
Maldita Geni. 
Pinçado do Facebook de Tom T. Cardoso

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***

Pitacos a um jornalista recém formado, por Tom T. Cardoso

- Oi Tom.
- Opa.
- Acabei de me formar em jornalismo.
- Bacana.
- Pode me dar algumas dicas rápidas por aqui no Facebook?
- Sim, claro.
- Que Deus o abençoe.
- Primeira dica, anote aí.
- Sim.
- Deus não abençoa ninguém.
- Por que?
- Porque ele não existe.
- Não?
- Não. E mesmo que ele existisse, você não poderia acreditar nele.
- Não posso?
- Jornalista não acredita em instituições.
- Deus é um instituto?
- É, por ai. Qual o último livro que você leu?
- Crime e Castigo. Faz tempo.
- Quanto tempo?
- Foi no começo da facu, numa viagem de ônibus para Poços de Caldas.
- Quanto tempo dá de ônibus até lá?
- Quatro horas.
- Você leu Crime e Castigo em quatro horas?
- Sim. Sou amarradão nessa autora.
- Autora?
- Sim, a Agatha Christie. Ela é top.
- Cara, pode voltar a acreditar em Deus.
- Posso?
- Pode.
- Obrigado, mestre.

Lobão anda meio sumido, por Tom T. Cardoso


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Fiquei pensando como se deu a mutação do Lobão cheirador, sarcástico, comedor de criancinha para o Lobão adulador da ditadura, escada do Rodrigo Constantino. 
Mas estou aqui pra contar a minha experiência como colaborador do Lobão.
Ele resolveu fazer uma revista de música e comportamento, a Outra Coisa, que era em parte sustentada, veja só, com anúncios da Petrobras e da Caixa Econômica Federal. Tudo isso em pleno Governo Lula. Não estou inventando. É só pegar as edições antigas e folhear.
A profissão de jornalista é uma merda, mas a gente se diverte. E não tinha nada mais hilário do que as reuniões de pauta da revista “Outra Coisa”.
A gente sempre se reunia, eu, o Lobão e a mulher dele, num restaurante alemão do Leblon. Eu não sei se o Lobão já tinha parado de cheirar, ou se a troca de cocaína por rapé fez mal ao cara – experimente dar um pouco de Yakult para o Keith Richards para ver o que acontece –, mas ele foi o editor mais maluco e sem noção que eu já conheci.


O Lobão queria de qualquer jeito que eu entrevistasse o Osama Bin Laden. Juro. Eu tentava argumentar, dizendo que se a CIA não tinha pistas do cara, eu, um repórter preguiçoso, teria certa dificuldade. Ele insistia. E a mulher dele dava corda. Papo de maluco total.
Eu trabalhava, nessa época, na redação do jornal Valor. Toda tarde, o Lobão ligava:
– Tom, conseguiu achar o Osama?
Eu achava que era melhor não contrariar:
– Lobão, tô mexendo os pauzinhos, falando com as minhas fontes. Calma, a gente chega lá.
O Lobão nunca me pagou. Recebia a grana, mas não pagava os colaboradores. 
A última vez que falei com o Lobão foi por telefone. Ele tinha feito a pergunta de sempre e eu, de saco cheio por não receber, com monte de conta pra pagar, respondi:
– Lobão, achei o homem.
– Você está brincando. Sério?
– Sim. Você me manda para o Afeganistão?
– Humm. Não consegue fazer por e-mail?
Pensei em dizer que nas montanhas de Tora Bora não tinha wi-fi, mas achei melhor acabar com aquela maluquice:
– Lobão, vai dar meia hora de cu, vai.

***

Tom T. Cardoso: Luciano Huck queria ser presidente

Vamos a alguns trechos de artigo seu publicado na Folha de São Paulo:
"Em mais de 20 anos de carreira, sempre quis ser alguém que se coloca, que está presente na cena nacional e faz o que pode para usar sua energia a favor da evolução da sociedade e da nação".
Pois é, em 20 anos de carreira, à frente de programas revolucionários como Circulando e Caldeirão do Huck, Luciano praticamente moldou um novo jeito de pensar do brasileiro, além de usar sua invejável energia para colocar em prática uma profícua reforma habitacional. O Minha Casa, Minha Vida da Rede Globo reformou 66 barracos em menos de uma década. Ninguém fez tanto em tão pouco tempo. E sem usar dinheiro público.
"Por força do meu trabalho, nas últimas duas décadas viajei este país de ponta a ponta, entrei na casa das pessoas, dividi com elas seus sonhos, compartilhei seus desejos, sem nenhuma intenção, além de ouvir e contar histórias".
Verdade. Luciano deixou a Caravana da Cidadania de Lula no chinelo. Percorreu os rincões do país, batendo de porta em porta dos barracos, dormindo no chão de terra batida, e ouvindo os problemas e anseios do povo brasileiro. Tudo isso sem usar uma gota de álcool gel, sem registrar em vídeo um só encontro e sem faturar um mísero centavo. O altruísta da década.
"Meu nome foi levado para esse debate, em boa medida, por ter afirmado que está na hora de minha geração ocupar espaços de poder".
Sem dúvida. Luciano Huck é único que possui credibilidade e coragem para aglutinar grandes nomes da sua geração. Ele tem força para levar pra vida pública estadistas como Rico Mansur, Alexandre Acioly, João Paulo Diniz,  Álvaro Garnero, Aécio Neves e Paulo Preto. O artigo termina assim:
"Contem comigo na construção deste Brasil, mais positivo e mais justo de se viver".
Só parei de chorar agora. Volta, Luciano!

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***

Alexandre Frota liga pra Jair Bolsonaro, por Tom T. Cardoso

- Fala, capitão!
- Quem é?
- Alexandre...
- Opa, Ministro, que honra.
- Não virei ministro ainda não, brother. Mas você pode me nomear. Tô dentro.
- Não é o Alexandre de Moraes?
- Não. É o Frota!
- Não entendi. De qual frota você é?
- Alexandre Frota, o ator e ativista.
- Ah, sim. 
- Capitão, você mandou bem. Não sabia que você passava o rodo também.
- Do que você está falando, rapaz?
- De comer gente, brother. 
- É, mas estão me enchendo o saco com essa história.
- Eles têm inveja da gente, capitão, da nossa pegada. O Lula não come ninguém.
- Já você, come tudo que vê pela frente, né? Agora tenho que desligar, tá bom?
- Capitão, deixa eu ser o seu vice, vai. Uma chapa puro-sangue. Dois comedores de gente, sem frescuras. Vamos ganhar no primeiro turno.
- Sei, não.
- Já tenho até um slogan: "Bolsonaro e Sua Frota: Pau pra toda obra". Gostou do trocadilho? Aliás, sua ereção é orgânica?
- ....
- Capitão, taí?
-. ....
- Capitão?
-.....
- Sargentinho mascarado. Come ninguém. Vou ligar pro Maroni.

Publicado originalmente por Tom T. Cardoso no seu Facebook
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Causos do Tom T.


Entro no avião. Poltrona 2C, corredor. Na 2A, na janela, um baixinho, careca. No meio uma loira, lindíssima, de vestido até os pés, dona de uma beleza e elegância que me fizeram lembrar na hora de Grace Kelly em "Janela Indiscreta" Eu também quebraria as duas pernas para ter a companhia daquela moça. 
Estou longe de ser o James Stewart da história, mas tenho meus rompantes de cavalheirismo. O meu primeiro impulso ao vê-la foi me oferecer para sentar no meio, evitando que ela dividisse o encosto da poltrona com o braço peludo e ensebado do careca.  Mas o Danny DeVito da janela se mostrou ainda mais oportunista do que eu:

- Quer sentar na janela? 
- Ah, que gentil. Obrigada.

Eu tive que me levantar para que a troca fosse feita. Ela se acomodou, cruzando as pernas lentamente (que classe!), enquanto o braço do DeVito ocupava 95% do nosso encosto compartilhado, acabando com a minha viagem.
Nada me irrita mais do que não poder apoiar o braço durante um voo. Para quem gosta de ler, como eu, é um tormento - a falta de apoio compromete toda as articulações do corpo. Sinto dor até no calcanhar.

Enquanto tentava ao menos apoiar meu cotovelo, evitando gestos bruscos - é fundamental você demonstrar que não faz a mínima questão do encosto, sob o risco do seu vizinho perceber sua angústia e aí sim começar a dificultar a tomada de território -, o DeVito puxou conversa:
- De onde você? Pela beleza, já sei.
Tava demorando. Todo cavalheiro de ocasião é, no fundo, um canalha.
- Se você já sabe, por que tá perguntando?
Linda e rápida, a Grace.
- Você é gaúcha, né?
- Não. 
- Ah, você é catarinense?
- Não. 
- De Curitiba?
- Não.
- De onde você é?
- Sou do Rio.
- Eu também! Da Zona Sul?
- Não.
- Ah, você mora na Barra.
- Eu não. 
- De onde você é?
- Zona Norte.
- Da Tijuca?
- Não. 
- Ah, já sei: do Méier. Minha tia é de lá.
- Também não. Você é ruim de adivinhar né?
- Kkk Hoje eu tô.
- Eu sou boa. Quer ver eu adivinhar na primeira qual a sua atividade?
- Quero!
- Você é do IBGE. Só pode. Se não é, não perca tempo: você nasceu pra isso.

Eu ri tão alto que a comissária, já sentada pra decolagem, esticou o pescoço olhando pro corredor, assustada.
O DeVito, coitado, se afundou na poltrona, constrangido, e eu aproveitei pra tomar todo o território.
Aposto que ela é da Penha.
Tom T. Cardoso