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Quem banca o luxo do canalha?


Divulgação | Reprodução/Twitter


Sejumoro zomba do país e reforça a percepção pública que atua para favorecer os tucanos

Brasil 247 - Numa viagem nababesca, o casal Moro foi a Nova York e posou alegremente ao lado do casal Doria; é a segunda imagem icônica do lugar que o juiz ocupa no Brasil; a primeira foi ao lado de Aécio Neves, em dezembro de 2016; em ambas as imagens, um clima de intimidade e parceria; o PSDB é um partido de sorte: tem Gilmar Mendes no STF, especialista em habeas corpus para tucanos, e tem um juiz para cuidar de tudo na Lava Jato e desfilar ao lado dos líderes emplumados enquanto persegue implacavelmente o PT.  
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A maldição do túnel do tempo, por Fábio Oliveira

A nova campanha publicitária do usurpador Michel Temer, que afirma que o Brasil voltou 20 anos no tempo como se isso fosse algo bom e desejável, desencadeou uma crise em razão de ter sido ridicularizada pela oposição. A oposição, porém, foi generosa. Afinal, no GGN sustentei que a estrutura sócio-econômica do Brasil após o golpe de 2016 se assemelha muito com a que existia em Roma no século I d.C.

Pensando sobre essa disputa irrelevante - nenhuma campanha publicitária será capaz de reduzir o desemprego e aumentar a felicidade da população marginalizada pelo governo – lembrei-me de uma série de TV que era reprisada à exaustão durante a década de 1970. Refiro-me ao “O Túnel do Tempo”.

Os protagonistas desta série faziam viagens temporais utilizando um sofisticado equipamento experimental. Sempre que caiam em algum lugar eles eram logo capturados pelos acontecimentos e acabavam interferindo inadvertida e involuntariamente no fluxo temporal. A preservação do curso da história, porém, era algo essencial. Assim, Tony e Doug quase sempre eram obrigados a fazer algo para impedir que a sua interferência alterasse o fluxo da História.

A interferência do STF está alterando o curso da história brasileira. A condenação injusta de Lula e sua prisão antes do trânsito em julgado da sentença – criticada à exaustão por diversos penalistas brasileiros e estrangeiros – está sendo legitimada pelo STF com uma finalidade claramente política: impedir que ele concorra à presidência da república.

Gilmar Mendes chegou a dizer à imprensa que a impossibilidade de Lula ser candidato é matemática. É evidente, portanto, que ele pré-julgou o Recurso Extraordinário do réu antes mesmo de recebe-lo do TRF-4. Isso reforça a impressão de que o ex-presidente petista não teve e não terá um julgamento justo e que a aplicação da Lei Penal no caso dele é apenas um meio para um fim e não um fim em si mesmo decorrente do conjunto probatório.

É fato consumado: a prisão de Lula não destruiu sua liderança política. Muito pelo contrário, a popularidade dele apenas aumentou. Todas as pesquisas indicam que os eleitores preferem Lula a qualquer um dos outros candidatos à presidência. Ele ganharia a eleição em qualquer cenário, em alguns ele levaria a faixa presidencial já no primeiro turno. Como na série “O Túnel do Tempo” a interferência desastrada dos agentes temporais – neste caso os Ministros do STF - não será capaz de corrigir o curso da história. No máximo ela irá criar um problema adicional.

Suponhamos que Lula fique fora da eleição e o PT resolva fazer campanha do voto nulo. O que ocorrerá? O novo presidente pode acabar sendo eleito com 50% + 1 de menos da metade dos eleitores inscritos. A legitimidade política dele, portanto, será igual ou menor que a de Michel Temer. O capital político inicial dele será uma rejeição política equivalente a soma dos votos nulos que seriam atribuídos a Lula e os votos do candidato derrotado no segundo turno.

Ao retirar Lula da equação eleitoral o STF está condenando o novo governo a ser tão ou mais instável que o de Dilma Rousseff. Sob a roupagem da Constituição Federal de 1988 nós seremos obrigados a viver na República Velha (1889-1930) e o resultado será o aprofundamento da crise política e econômica até que ocorra um evento cataclísmico semelhante ao golpe de 1930.

Em 1989, portanto, no ano seguinte à promulgação da CF/88 o cientista político Hélio Jaguaribe fez um alerta que vale a pena ser levado em conta neste momento:

“O Brasil, em um só território, sob a égide do mesmo Estado, no âmbito da mesma nação, contém duas sociedades distintas. Uma sociedade moderna, que opera, em condições semelhantes às de um país europeu, uma moderna sociedade industrial, que já é a oitava do Ocidente, mas que absorve cerca de 40% da população, e uma sociedade primitiva, que contém a maioria absoluta do povo brasileiro, vivendo em condições equivalentes, numa paupérrima economia agrária de subsistência ou numa miserável economia marginal urbana, às de um pobre país afro-asiático.

Esse dualismo básico, nas condições de um Estado democrático, gera uma brutal contradição. São os excluídos da modernidade que detêm a absoluta maioria decisória do poder político, elegendo os membros dos Poderes Executivo e Legislativo que regularão o país, inclusive seu setor moderno.

Essa profunda contradição produz dois diferentes tipos de consequências. Por um lado, à medida, estatisticamente rara, que os marginalizados do sistema escolham representantes que atendam as suas imediatas expectativas – não necessariamente correspondentes aos seus verdadeiros interesses -, estes representantes colidem, frontalmente, com o sistema econômico, social e institucionalmente vigente, com importantes efeitos desestabilizadores.

Por outro lado, como tende predominantemente a ocorrer, à medida que os marginalizados escolham representantes que só ficticiamente atendam as suas imediatas expectativas, dá-se origem a uma classe política intransitiva, que não representa nada além dos seus próprios interesses pessoais, de caráter predominantemente patrimonial. No fundamental, a péssima qualidade da classe política brasileira decorre dessa situação.”(Alternativas do Brasil, Hélio Jaguaribe, editora José Olympio, Rio de Janeiro, 1989, p. 65/66)

Os governos Lula e Dilma se esforçaram para reduzir as desigualdades sociais mencionadas por Hélio Jaguaribe. O objetivo político de ambos era o mesmo: fazer com que o Brasil tivesse um só povo. A reação negativa da classe média tradicional à inclusão social da classe baixa – à sua presença nas universidades, nos aviões, nos Shoppings, nos cinemas – criou o caldo tóxico que alimentou as manifestações de rua que levaram ao golpe de 2016.

O aprofundamento da crise econômica desencadeada pelo programa neoliberal de Michel Temer afetou de maneira negativa os interesses da classe média. Mesmo assim ela não foi às ruas para reclamar da gasolina a R$ 5,00 o litro como ocorreu quando a presidenta Dilma Rousseff reajustou a gasolina para R$ 3,20 o litro. O mesmo pode ser dito em relação a outras medidas draconianas adotadas pelo usurpador, como por exemplo o aumento do gás de cozinha e a autorização para os planos de saúde cobrarem franquia dos seus consumidores. A impressão que fica é que o ódio contra os pobres – que se tornaram ainda mais pobres nos últimos dois anos – está inibindo a classe média de ir as ruas para derrubar o usurpador Michel Temer. A esperança de eleger “um dos nossos” em 2018 provavelmente também está ajudando a manter a tigrada nos seus condomínios.

Em geral, podemos dizer que a classe média tradicional está tranquila em razão da percepção de que ela voltou ao seu lugar na hierarquia social mesmo que a situação econômica tenha se deteriorado. A reconstrução do Brasil com duas sociedades distintas (Hélio Jaguaribe) pode ter pacificado a classe média tradicional, mas dificilmente pacificará o país. No fundo é isso que os brasileiros estão dizendo ao demonstrar sua preferência por Lula.  

“O sistema político-partidário está-se aproximando, aceleradamente, dos limites de resistência do Estado. Confrontado com o primitivo canibalismo do sistema partidário, o Estado brasileiro, como já se pode observar, se defronta com um iminente dilema. O dilema da incompatibilidade entre a comparativa modernidade de que se ainda se reveste o Estado e o primitivismo do sistema partidário. Em tais condições, ou se moderniza e se aperfeiçoa, aceleradamente o sistema político-partidário ou o Estado, para se conservar democrático, será rapidamente conduzido a deixar de ser moderno ou, reversamente, para ser moderno, será compelido a deixar de ser democrático.” (Alternativas do Brasil, Hélio Jaguaribe, editora José Olympio, Rio de Janeiro, 1989, p. 67)

Ao interferir no processo político o STF se tornou um partido político. O problema é que ele não está em condições de fazer a reforma política que o país necessita. E se ele fizer algo autoritário, como cassar o registro do PT por exemplo a guerra política não deixará de existir. Ela apenas será levada adiante por outros meios.

Resumindo: se o STF soltar Lula neste momento o Tribunal perderá o que resta de sua credibilidade diante da classe média tradicional e da imprensa que vive explorando e tentando expandir o anti-petismo. Se o manter preso e o impedir de ser candidato a presidente, todo o sistema político/eleitoral brasileiro pós 1988 se tornará obsoleto e/ou potencialmente explosivo. Como ocorria nos capítulos da série “O Túnel do Tempo”, sempre que alguém quer alterar o passado consolidado – refiro-me aqui ao processo de inclusão social levado adiante por Lula – ocorre algo imprevisto que irá prejudicar os envolvidos.