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Lá vem o Geddel, descendo a ladeira ou seria no elevador do La Vue?
Cabe a Michel Temer decidir se acompanhará seu ministro ladeira abaixo ou se vai dar um empurrão para a descida ser mais rápida. Não é fácil, porém, para o presidente abandonar quem gerencia a articulação política (quando não está empenhado em aprovar projetos imobiliários no Iphan). O dilema de Temer deve-se menos ao futuro do que ao passado. Sua ligação com Vieira Lima sobrevive há duas décadas, passou por quatro presidentes da República.
Na era FHC, em meados dos anos 90 do século passado, ambos faziam parte da Turma do Pudim. Reunidos semanalmente em torno de um prato de comida, Temer, Geddel, Renan Calheiros, Eliseu Padilha e Jader Barbalho decidiam o que o PMDB queria do governo tucano. Quem transmitia os recados era Henrique Eduardo Alves.
Muito mudou na aparência da política brasileira desde então, mas a Turma do Pudim continua onde sempre esteve: mandando e demandando. Eles mudam de cargo, circulam do Legislativo para o Executivo, mas raramente largam o poder. No governo FHC, a disposição das cadeiras era outra, mas quem as ocupava não.
Como Renan hoje, Temer, à época, presidia uma das Casas do Congresso (a Câmara). O hoje presidente do Senado é quem estava no Executivo, comandando o Ministério da Justiça. Padilha era ministro então e é ministro agora, só mudou de prédio: do Ministério dos Transportes para o Palácio do Planalto. Geddel, que era líder do PMDB, agora é ministro. Barbalho era e é senador (além de ser pai do ex-ministro dos Portos de Dilma). Alves era deputado, foi um breve ministro e caiu.
Eles dividem o pudim desde 1995. Prestam favores ao governo -qualquer governo – e depois cobram a fatura na forma de cargos. Foi assim que Temer emplacou o presidente das Docas de Santos (Codesp), Marcelo Azeredo, no governo FHC, e que Geddel viu seu pai, Afrísio, assumir posição semelhante nas Docas da Bahia.
Na primeira configuração da turma, Temer era líder do PMDB na Câmara, e Geddel, seu vice. No mandato seguinte, Geddel coordenou a campanha de Temer a presidente da Câmara, que contou com o apoio informal de FHC. Não foi à toa. Meses depois naquele 1997, ambos ajudaram a viabilizar a aprovação da emenda constitucional que garantiu o direito à reeleição a FHC (o autor da emenda foi o hoje ministro da Educação, Mendonça Filho).
Não é, portanto, trivial a decisão que Temer tem à sua frente. Ele e Geddel dividiram mais do que sobremesas. Foram do couvert ao digestivo, passando por incontáveis pratos principais.
Maior sinal da dificuldade do presidente é sua demora para agir. Nada fez mesmo depois de informado pelo então ministro da Cultura, Marcelo Calero, sobre as pressões de Geddel para que o Iphan (a ele subordinado) desembargasse as obras do Condomínio La Vue, um espigão de 30 andares na ladeira do Porto da Barra, em Salvador, onde Geddel comprara apartamento “em andar alto”.
Mesmo depois de o embrulho vir a público e de a versão preferida pelo Planalto (de que Calero havia caído por causa do projeto que regula a vaquejada) não ter emplacado, Temer não tomou nenhuma atitude em relação a seu ministro palaciano. Se, como diz Calero, Geddel de fato assediou o colega para agir em favor de seus interesses particulares, não há o que pensar. Se não é verdade, caberia então agir judicialmente contra Calero.
A inação não é uma opção por muito mais tempo. Mas a atitude que Temer vier a tomar não terá repercussões apenas sobre Geddel. Ela servirá de precedente para toda a Turma do Pudim.
Se o presidente entregar a cabeça do parceiro de confraria, os outros confrades saberão que, amanhã, dependendo das circunstâncias, pode ser a deles. Assim como o Iphan melou o pudim de Geddel, Renan, com seus 12 inquéritos no STF, tem o poder de embargar os principais projetos de Temer no Senado.
Publicado originalmente no Estadão