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Para que serve a Veja?

Ou porque a revist(ec)a quer sepultar sonhos e incriveis histórias de superação de atletas
da Record
As irmãs Luana Vicente e Lohaynny Vicente, de 21 e 19 anos, tiveram uma infância pobre nas vielas da comunidade do morro da Chacrinha, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Ainda bem crianças viram o pai, chefe do tráfico do morro, ser morto num confronto com a polícia. O que vem a seguir é daquelas improváveis histórias brasileiras, que parecem escritas como fábulas de superação.
As duas são hoje fenômenos num esporte tão improvável quanto a trajetória de ambas: o badminton. Luana e Lohaynny asseguram um feito inédito ao esporte brasileiro com a medalha de prata no Pan de Toronto a ponto de serem chamadas de irmãs “Williams” do Brasil, comparação às grandes tenistas americanas. Como se sabe, o badminton utiliza raquetes e uma peteca.
Por projetar atletas como as irmãs Luana e Lohaynny é que o Pan é tão importante. Afinal é hora de adquirir mais experiência e confiança para o que vem pela frente: as Olimpíadas do Rio de Janeiro de 2016, a primeira realizada no Brasil. Mas não é assim que pensa a revista semanal Veja.
Em sua mais recente edição, a publicação estampou na capa a seguinte pergunta: Para que serve um Pan? No texto, desmerece a competição com argumentos conhecidos, como a de que alguns países, como os Estados Unidos e até o Brasil, não enviaram seus principais atletas para o Canadá, já que alguns são deslocados para competições específicas de seus esportes simultâneas ao evento. 
Veja lembra que atletas como o nadador Michael Phelps nunca participaram de um Pan, mas se esquece de outros nomes importantes que foram e são expressivos nas marcas dos Jogos. O nadador brasileiro Thiago Pereira não só está em Toronto como pode se tornar o maior medalhista de toda história dos Pan-Americanos.
Ao tentar desmerecer o Pan, Veja lança comparações descabidas com a NBA (liga de basquete profissional americana que inclui um time canadense) e aposta que o que ficará na memória será apenas a apresentação do Cirque du Soleil na abertura.

Veja ignora assim os esforços de todos os 590 atletas brasileiros enviados ao Pan, 314 homens e 276 mulheres que compõem nossa melhor geração olímpica. Despreza também casos impressionantes de superação muitas vezes escondidos pela euforia das vitórias.

Isaquias Queiroz, 21 anos, o menino de ouro da canoagem brasileira, herói do Pan de Toronto, é uma dádiva do esporte e da vida. Tinha três anos quando a mãe, dona Dilma, ouviu a sentença de morte do filho que um dia carregaria medalhas de ouro no peito e se tornaria uma das esperanças do esporte brasileiro. “Ele vai morrer”, afirmou o médico de Ubaituba, no sul da Bahia. Dona Dilma estava trabalhando como servente da rodoviária da cidade para sustentar a casa de três cômodos – ela hoje tem seis filhos biológicos e mais quatro adotivos - quando foram avisá-la. Uma panela de água fervendo havia caído sobre ele.
Isaquias ultrapassou a morte pela primeira vez. Dois anos depois das queimaduras, já recuperado, foi sequestrado, mas, de novo, voltou aos braços da mãe. Já moleque, despencou de uma árvore, teve uma hemorragia interna e perdeu um rim.

Hoje brinca que não tem um rim, mas ganhou pulmão. O pulmão que não deixa o fôlego se esgotar e que ajudou a ganhar as três medalhas deste Pan, duas de ouro e uma prata, esta última junto com Erlon de Souza Silva. Uma das medalhas de ouro veio sob uma chuva intensa, que foi apertando no ritmo que as remadas cresciam.

A judoca Rafaela Silva, bronze em Toronto, filha de um entregador de pizza e de uma dona de casa, que cresceu na favela da Cidade de Deus, já chegou ao título mundial de judô. “Eu estou mostrando que não depende de cor, de dinheiro, de nada, depende de vontade e de garra”, disse.

Entrar para história do esporte é para poucos. O patinador Marcel Stürmer, de 29 anos, se tornou o primeiro atleta a conquistar quatro vezes seguidas a medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos. Os aplausos delirantes do público canadense ganharam um sentido maior para quem sabia que durante os treinos ele enfrentou infiltrações para suportar as dores.
Agora, imagine. Como se sentiriam esses quase 600 atletas, seus familiares e amigos ao entrar numa banca de jornal e ver lá estampado um título na capa da revista Veja: “Para que serve o Pan?”. Com a arrogância de quem se acha detentora de todas as verdades, Veja quer agora sepultar sonhos, desprezar as mais incríveis histórias de superação e esforços e atrapalhar quem persegue suados patrocínios e parcos incentivos governamentais. Seria como se perguntar: Para que serve a luta de Isaquias, Marcel, Rafaela, Luana e Lohaynny? Não seria melhor perguntar, então: Para que serve a Veja?