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Política - por Gaudêncio Torquato

O petês e o tucanês

A campanha era a de 1985, aquela em que Jânio Quadros ganhou de Fernando Henrique, depois deste ter sentado na cadeira de prefeito de São Paulo antes da apuração final dos votos.
Para um dos raros comícios na periferia (Jânio, ao lado da esposa Eloá, preferia verberar contra bandidos e sonegadores em despojado programa eleitoral de TV), levou o ex-ministro da Fazenda, Delfim Netto, que assim concluiu sua peroração palanqueira: “A grande causa do processo inflacionário é o déficit orçamentário”.
Após a fala, Jânio puxou Delfim de lado e cochichou: “olhe para a cara daquele sujeito ali. O que você acha que ele entendeu de seu discurso? Ele não sabe o que é processo, não sabe o que é inflacionário, não sabe o que déficit e não tem a menor ideia do que seja orçamentário. Da próxima vez, diga assim: a causa da carestia é a roubalheira do governo”.
O guru da economia, a quem todos hoje recorrem para explicar os sobressaltos que deixam interrogações no ar, passou a reservar seu economês para plateias mais acessíveis ao vocabulário de questões complexas.
O estilo Jânio marcou a história da expressão e do comportamento dos atores políticos. Ele foi o ícone da irreverência. Ponderável parcela da admiração que angariou em todas as faixas da população se deve ao “modo janista de ser”, do qual se extraía um conjunto de valores, entre os quais o da autoridade.
Jânio forjou uma linguagem política, composta pela imagem histriônica e adornada de trejeitos, olhares esbugalhados, roupas mal ajambradas, compassos e pausas que imprimiam força à fonética esganiçada de construções exóticas. Semântica e estética juntavam-se em apelativa performance que, aos olhos e ouvidos dos espectadores, chamava atenção.
Pois bem, puxando a linguagem janista para a atualidade, podemos concluir que petistas e tucanos também desenvolveram seu jeito de ser no campo da verbalização, o que explica maior ou menor penetração e/ou rejeição de uns e outros na esfera dos conjuntos sociais.
O dicionário do PT tem um autor

Rafael Patto: Há 52 anos, renunciava Jânio Quadros


"Fui vencido pela reação e, assim, deixo o Governo. Nestes sete meses, cumpri meu dever. Tenho-o cumprido, dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram-se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, o único que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.

Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive, do exterior. Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração. Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranquilidade, ora quebradas, e indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo, que não manteria a própria paz pública. Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes e para os operários, para a grande família do País, esta página de minha vida e da vida nacional. A mim, não falta a coragem da renúncia.

Saio com um agradecimento, e um apelo. O agradecimento, é aos companheiros que, comigo, lutaram e me sustentaram, dentro e fora do Governo e, DE FORMA ESPECIAL, ÀS FORÇAS ARMADAS, CUJA CONDUTA EXEMPLAR, EM TODOS OS INSTANTES, PROCLAMO NESTA OPORTUNIDADE. (Grifo meu)

O apelo, é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos; de todos para cada um.
Somente, assim, seremos dignos deste País, e do Mundo.
Somente, assim, seremos dignos da nossa herança e da nossa predestinação cristã.

Retorno, agora, a meu trabalho de advogado e professor.

Trabalhemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria.

Brasília, 25-8-61."
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Foi com esta mensagem que a renúncia de Jânio Quadros foi tornada pública, há exatos 52 anos. Vou reproduzir aqui também a plausibilíssima interpretação que o personagem Tibério Vacariano, do romance “Incidente em Antares”, de Érico Veríssimo, fez dessa enigmática carta-renúncia (às vezes, a ficção literária é uma fonte historiográfica mais eficiente que o próprio “historialismo oficial”). Vamos, pois, ao que nos diz o controvertido coronel Vacariano:

São Paulo e a elite Off-shore

É com prazer que o Blog do Briguilino publica artigo de Mauro de Santayana fisgado do JB Online
Faz parte da história política de São Paulo a aparente indecisão de muitos de seus líderes. O Sr. Jânio Quadros, que tinha dias de Hamlet e dias de MacBeth, subordinava suas decisões a dois pontos geográficos da cidade: Vila Maria e Sapopemba. Vila Maria é a região de classe média emergente, e, Sapopemba, área mais pobre. Ele costumava consultar os dois eleitorados. De Vila Maria vinha a esperança da vitória, uma vez que, desde sua eleição para vereador, contara com o apoio de seus eleitores. Sapopemba era o teste de popularidade. Antes de candidatar-se a esse ou àquele cargo, aferia, nos comícios, o apoio de seus moradores.

O ex-governador José Serra não chega à forte tragédia do escocês MacBeth, mas se aproxima, em seu ser e não ser, do príncipe da Dinamarca. Não que Hamlet disputasse uma eleição, a não ser a do destino, e que a sua dúvida fosse muito além de sua própria tragédia, ainda que nela amarrada. Mas se Jânio e Serra estão muito distantes da essência do caráter que Shakespeare dá aos dois personagens, e que ele pintara como antípodas morais, os dois paulistas começam a se assemelhar. Jânio adorava que fossem bater à sua porta, apelar para a sua taumaturgia populista. Serra, ao desconfiar de que não o procurariam, como a bóia salva-vidas na tempestade (mesmo porque os ventos políticos sopram brandos, por enquanto), resolveu aceitar, de bom grado, os ralos apelos que lhe chegam.

Os paulistas começam a dar à eleição para a Prefeitura de São Paulo importância maior do que ela realmente tem, e os comentaristas políticos, próximos dos tucanos bandeirantes, avançam sobre a lógica, dizendo que ela terá efeitos nacionais. Não há dúvida de que a cidade é a mais importante do país, no que se refere à economia e à cultura, de maneira geral, mas está distante da realidade política e social do Brasil como um todo. Os paulistanos atuam como se fossem o sol, em torno do qual os planetas menores orbitam, e, de cuja luz, dependem.

Na noite de sábado para domingo, em uma cidade satélite (das mais pobres) de Brasília, Santa Maria, alguns rapazes atearam fogo a moradores de rua. Um deles morreu e o outro se encontra seriamente ferido, com poucas possibilidades de sobrevivência. Há dois fatos, relacionados com essa tragédia, que devem ser ponderados. Até há algum tempo, os pobres costumavam ser solidários entre eles. Agora, no entanto, submetem-se à cultura, made in USA, da intolerância, da violência pela violência, da discriminação e do desprezo pela vida. Talvez – e as investigações continuavam – os incendiários de fim de semana sejam dos “emergentes” das cidades-satélites, filhos de pais bem empregados, moradores em casas confortáveis. E, talvez, não – o que será pior.

O outro ponto de reflexão é o da impunidade. Há quase quinze anos, cinco rapazes, filhos de famílias da elite de Brasília, atearam fogo ao índio Galdino, dirigente da etnia pataxó da Bahia, que dormia em um ponto de ônibus. Presos, graças ao testemunho de um rapaz da mesma idade, que passava de carro pelo local, os culpados foram defendidos com veemência. Seus pais, e os advogados que contrataram, tentaram desqualificar o crime – tratara-se, segundo a desculpa, de uma brincadeira que dera errado. Não tinham a intenção de matar, só a de assustar com o fogo. Foram presos e julgados. Condenados, em 2001, a 14 anos de prisão, menos um deles, que era adolescente, não passaram mais de 4 anos na prisão – onde gozaram de todas as regalias, entre elas a de sair para estudar e trabalhar, quando aproveitavam o tempo para beber e namorar, chegando frequentemente muito depois da hora de recolher.

As denúncias de que estavam sendo privilegiados de nada adiantaram. Eles eram enteados e filhos de juízes. Como sabemos, todos somos iguais diante da lei, embora alguns sejam muito mais iguais.

É nesse país, em que as leis são meras declarações de intenção, e apenas 3% dos responsáveis pelos crimes de homicídio são julgados e cumprem penas, que temos de pensar. Não entendem os legisladores e administradores públicos que a impunidade dos poderosos estimula a criminalidade geral. Assim, enganam-se os tucanos da maior cidade brasileira. São Paulo, com toda sua opulência (mesmo com a maior população de moradores de rua de todo o país) não é a estrela em torno da qual circula o sistema planetário nacional. Mesmo porque as elites de São Paulo, salvo poucas exceções, exercem uma cidadania off-shore, desligada do destino do país.

O nosso futuro está sendo construído em todo o território nacional, pela inteligência, pelo esforço e pelo patriotismo de seus trabalhadores, incluídos os de São Paulo – e não pelos senhores da Febraban e das corporações multinacionais,  empenhadas em novo e cômodo colonialismo.

por Carlos Chagas


A HISTÓRIA NÃO TEM PRESSA

Vivemos de modismos. De idéias pré-concebidas. Por que, por exemplo, determinar 100 dias como primeiro prazo para o julgamento de um governo ou de uma governante? Por que não 102 ou 110, ou 200, 500 ou 800? Dirão muitos que a vida é assim. Os casamentos são contados por bodas de prata, de ouro e até de diamante. As guerras, por décadas ou séculos. As religiões, por milênios.

Senão  insurgir-se, Dilma Rousseff deveria dar de ombros para a cascata de análises, interpretações e diagnósticos apresentados pela mídia  no fim de semana, a respeito de seu desempenho na presidência da República. Afinal, a data que interessa mesmo é a de cada dia, com ênfase para o último  de seu mandato.

Para Getúlio Vargas, foi 24 de agosto de 1954, mesmo tendo ele permanecido por 15 anos variadíssimos, numa primeira etapa, e três anos e meio de incompreensões, no segundo.

Juscelino Kubitschek preferiu ressaltar os 50 anos em 5, no começo, para no final fixar-se na data futura que não chegou, de  3 de outubro de 1965, quando voltaria ao poder.  Jânio Quadros jamais imaginou que 25 de agosto de 1961 seria o fim, muito menos João Goulart, de que tudo terminaria no 1 de abril de 1964. Dos generais-presidentes, note-se apenas a seqüência de seus mandatos com dia certo para transmitirem o poder, exceção de Costa e Silva que adoeceu antes. Para Tancredo Neves o destino não deixou um dia sequer, para José Sarney um ano lhe foi surripiado. Fernando Collor imaginou vinte anos, defenestrado em dois e meio, ao contrário de Fernando Henrique, que era para ser julgado depois de  quatro anos e burlou seus julgadores, estendendo o prazo para  oito. O mesmo tempo concedido ao Lula, de olho em  mais oito, ainda que  sem prazo certo para iniciar o retorno.


Essas considerações se fazem por conta da evidência de que a análise da ação  dos presidentes da República não deve ser medida em dias, meses ou sequer anos. A História não tem pressa e não comporta açodamentos, ainda que se apresente pródiga em surpresas.  Dilma pode ter ido bem nos primeiros 100 dias, mas quem  garante que seguirá  assim nos seguintes?  Melhor aguardar.

Lula, Jango e JK, injustiçados

Jango

Durante o governo João Goulart, os jornalões o acusavam de corrupto. Por isso, foi derrubado pelos militares que, ao assumirem o poder, antes mesmo de institucionalizarem a tortura, criaram IPMs para perseguir os vencidos. Em nenhum deles se provou corrupção.



JK
O mais injustiçado homem público, Juscelino Kubitschek, foi acusado nos quartéis como corrupto. Nada se provou contra ele. Dele só se soube que suscitava o amor fervoroso das multidões. Tinha vida modesta e morreu sem deixar herança como outro presidente, o honesto Jânio Quadros, cujos netos ainda hoje tentam encontrar milhões de dólares em depósitos em contas secretas em bancos estrangeiros.

Lula
É o caso de Lula. Nunca se provou que um auxiliar seu tenha enriquecido quando no poder. As calúnias se multiplicaram sem crédito na opinião pública. Por isso, seu Partido sobreviveu e deverá ser majoritário na Câmara e ter mais senadores que o PSDB e o PFL. Ele foi considerado o presidente da República mais popular de nossa história.

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Se diz a presidente ou a presidenta?

Luis Fernando Veríssimo

De hoje à data da eleição teremos dez dias de manchetes nos jornais e duas edições da Veja. Não sei até quando podem ser publicadas as pesquisas sobre intenção de voto, mas até a última publicação – aquela que, segundo os céticos, é a mais confiável, pois é a que garante a credibilidade e o futuro dos pesquisadores – veremos uma corrida emocionante: o noticiário perseguindo os índices da Dilma para tentar derrubá-los antes da chegada, no dia 3. O prêmio, se conseguirem, será um segundo turno. Se não conseguirem a única dúvida que restará será: se diz a presidente ou a presidenta?
Até agora as notícias de corrupção na Casa Civil não afetaram os índices da Dilma. Estou escrevendo na terça, talvez as últimas pesquisas mostrem um efeito retardado. Mas ainda faltam dez dias de manchetes e duas edições da Veja, quem sabe o que virá por aí? O governo Lula tem um bom retrospecto na sua competição com o noticiário. 
A popularidade do Lula não só resistiu a tudo, inclusive às mancadas e aos impropérios do próprio Lula, como cresceu com os oito anos de denúncias e noticiário negativo. Desde UDN x Getúlio nenhum presidente brasileiro foi tão atacado e denunciado quanto Lula. Desde sempre, nenhum presidente brasileiro acabou seu mandato tão bem cotado.
Acrescente-se ao paradoxo o fato de que o eleitorado brasileiro é tradicionalmente, às vezes simplisticamente, moralista. Elegeu Jânio para varrer a sujeira do governo Juscelino, elegeu Collor para acabar com os marajás, aplaudiu a queda do Collor por corrupção presumida e houve até quem pedisse o impedimento do Itamar por proximidade temerária com calcinha transparente. Mas o moralismo tornou-se politicamente irrelevante com Lula e, por tabela, para os índices da Dilma. É improvável que volte a ser decisivo em dez dias. Mas nunca se sabe. 
O que talvez precise ser revisado, depois dos oito anos do Lula e depois destas eleições, quando a poeira baixar, seja o conceito da imprensa como formadora de opiniões.
Mas a corrida dos dez dias começa hoje e seu resultado ninguém pode prever com certeza. Virá alguma bomba de fragmentação de última hora ou tudo que poderia explodir já explodiu? O que prevalecerá no final, os índices inalterados da Dilma ou o noticiário? Faça a sua aposta.

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