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Causo nordestino

Causos & contos
Esta história de excesso de automóveis nas ruas brasileiras, faz-me lembrar de Dr. Gouvea - médico e político, orgulho da cidade de Iguatu - Ceará -. Ao atender um simplório camponês, remoendo-se em mal-estar digestivo, Dr. Gouvea perguntou  saber o que o humilde homem se alimentara na última refeição:

- Dr. Gouvea, ontem à noite eu comi duas nambus torradas, um preazinho que peguei no fojo, metade de um jerimum caboclo, arroz vermelho com capitão de feijão, duas taiadas grandes de melancia, meia rapadura, e um docinho de banana feito pela muié! Dr. Gouvea, interrompeu, e disse que já tinha o remédio para aquilo!

- Oh, doutor, passe um remedinho barato, daqueles que eu possa comprar! Dr. Gouvea disse-lhe que não era preciso, ia resolver ali mesmo: Pegou dois instrumentos e olhou sério para o matuto, atônito:
-- Que é isto doutor, vai me operar?

- Não! Respondeu o bondoso médico! Eu vou abrir é outro cu em você, porque um só, não dá conta de despachar o que você comeu, animal da bruta raça!

***

Papo de homem

Conhece aquela?...
"Ele é tão lesado que se cuidasse de uma tartaruga ela fugiria"...Então?




"É por causa do Barrichelo". Foi assim que me apresentaram o Rubens, uma tartaruga que foi encontrada perto do trabalho há pouco mais de um mês. Ela parecia perdida caminhando assustada na calçada e, com medo de ela ser atropelada, rapidamente o amigo Rodrigo a trouxe para a casinha aqui do PapodeHomem. 
Muito mais rápido que isso, logo virou piada. Quem diabos perderia uma tartaruga? Aquela velha máxima de que "ele é tão lerdo que deixaria a tartaruga fugir se cuidasse de uma" poderia existir de fato?
O Rubens foi a atração da casa, o alívio cômico do final de tarde. Pesquisando, descobriram que ele, na verdade, era um jabuti do sexo masculino e que gostava de comer mamão, mesmo que a iguaria soltasse seu intestino. Acompanhei tudo meio à distância, era muita gente em cima do bicho, imaginei que ele fosse um cara mais discreto, um verdadeiro outsider
Sabe, aquela coisa de querer ficar meio só, de conhecer o mundo com as próprias patas? Acho que essa era a do jovem Rubens, uma descoberta de si mesmo no urbanismo selvagem da zona oeste de São Paulo. Teve um dia que me vi a sós com ele. Fui lá fora pensar numas palavras chiques e me deparei com sua desenvoltura meio estúpida pelo quintal. Me sentei e passei a reparar nele. Ele parou e me olhou. Ficamos nesse jogo de mente alguns minutos. Provavelmente ele me contou um pouco de sua vida, seu desejo de chegar ao Alasca, a saturação que ele estava sentindo da cidade grande, da falsidade das pessoas, do escárnio pela condição natural de lerdeza que ele carregaria para o resto da vida. 
Preconceito, liberdade, o direito de ir e vir de todos. Acho que tivemos um papo incrivelmente produtivo sem trocar uma única palavra. Era hora de libertar o Rubens.
Batendo de porta em porta, descobriram o dono do Rubens e seu verdadeiro nome: Leopoldo. Morava há uns dois quarteirões dali, em uma casa que estava em reforma. Os pedreiros deixaram o portão aberto e foi a brecha que o Rubens, digo, Leopoldo queria. Seu dono, um senhor de pouco mais de 50 anos contou que o jabuti ficara na casa quando o pai dele se mudou. Logo, o bicho tinha mais de 50 anos. O nosso aventureiro gosta de longas caminhadas pelo bairro, sempre na companhia de seu dono.
Ao levar o Leopoldo de volta para casa, o Rodrigo - que foi quem encontrou e o batizou de Rubens - começou a trocar uma boa conversa com o dono, saber mais sobre o passado do bairro, saber mais sobre a família do cara. No meio do papo, o pai do cara chegou da rua, um velho de mais de 70 anos chegando em sua moto, estiloso de tudo, descolado. Os três, encantados uns com os outros e com a deliciosa conversa sobre a vida, descobriram coisas em comum, falaram da paixão pelas motocicletas, sobre velocidade, sobre esperteza e lucidez e já passava mais de meia hora desde que se encontraram pelo motivo da entrega do jabuti.
E aí se deram conta. Onde estava o Jabuti? Lá se foi mais uma hora até encontrarem novamente o Leopoldo.
Vi depois, em meu celular, quatro ligações não atendidas. Não foi dessa vez, Rubens. Não foi dessa vez.

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É escritor e editor do Papo de Homem. Lançou, nesse ano, seu primeiro livro de contos, o Ela Prefere as Uvas Verdes e outras histórias de perdas e encontros.

A loja de Dissabores

– Bom dia! Senhor… Ashby. É esta a pronúncia?
– Sim sim, é sim. Ah…. bom dia.
– Vejo que está muito nervoso. É sua primeira vez?
– Sim, nunca fiz isto antes.
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– Não há com o que se preocupar. Somos bastante experientes e o sigilo é nossa principal diretriz. Já tomou conhecimento dos procedimentos?
– O mesmo amigo que me indicou contou algumas coisas, mas gostaria que os repassasse, se for possível.
– Mas é claro, Senhor Ashby. Como bem sabe, somos procurados por diversas pessoas de renome nacional e internacional. Músicos, escritores, pintores, artistas em geral, todos procurando discrição e privacidade.
– Certo.
– Fornecemos o que a maioria das pessoas não pode ter na hora que quer. Não poderia ser mais simples. Temos um catálogo com diversas opções à sua escolha, e a customização é inclusa nos pacotes Premium e VIP.
– Customização?
– Exato, Senhor Ashby. Cor do cabelo, pelos ou a ausência deles, podemos encontrar, inclusive, alguém parecido com antigos companheiros ou companheiras. Basta nos entregar uma foto se assim for o caso.
– Entendi, mas acredito que não precisarei disso….
– Tem certeza? Temos descontos especiais para quem foi indicado por algum cliente.
– Vocês têm?
– Temos sim.
– Então, digamos… se eu quiser alguém parecido com, uma suposição, Sigourney Weaver, vocês conseguirão encontrar?
– Faremos o nosso melhor. Caso não conste ninguém assim em nosso banco de dados, logo o informaremos e faremos a devolução do valor investido.
– Certo.
– Desculpe, mas ainda não disse com o que trabalha.
– Eu sou escritor.
– Bloqueio criativo?
– Exatamente. O livro não sai do lugar.
– Qual o tamanho desejado e até onde escreveu?
– É um romance, umas trezentas páginas apenas. Não escrevi nem a primeira centena.
– Entendo. Bom, acredito que o pacote ideal seja mesmo o Premium, com intensidade de sofrimento 7 da nossa escala.
– E como seria isso?
– Promessas não cumpridas, cobranças desnecessárias. Eventual perda de desejo sexual e admiração. Crescente aumento de ciúmes e outras desconfianças e, por fim, jogos de poder totalmente desnecessários levando a um fim de relacionamento desgastante e depressivo. Caso queira, podemos subir a escala para 8 e adicionarmos o componente da traição, que pode ser com um desconhecido ou amigo próximo, chegando a 9 pontos na nossa escala.
– Quero 9 pontos, por favor. Preciso mesmo pagar a hipoteca da casa.
– Perfeitamente, Senhor Ashby. Deixe-me apenas imprimir o contrato para que possa assinar.
– E qual a duração?
– Depende do senhor. O contrato diz que precisamos de 45 dias para encontrarmos alguém compatível com suas exigências. A partir daí, quando nossa funcionária, treinada especialmente para isso, perceber sinais de afeto e apego, começamos o procedimento.
– Está ótimo pra mim. Onde eu assino?
– Aqui. Aqui também. Isso. Muito bem. Fez uma ótima escolha, Senhor Ashby. Em breve ligaremos para marcar um encontro entre você e sua futura ex-companheira. Tenha um bom dia e cuide-se. Volte sempre que precisar.
– Se funcionar, pode ter certeza que voltarei.
– Ah, Senhor Ashby. O senhor já é nosso cliente. Apenas não sabe disso ainda. Dê tempo ao tempo. Em breve estará aqui novamente, em busca de uma dor ainda maior para continuar produzindo. Esperaremos. Até lá, tenha um bom dia.
Marco Magalhães


Marco Magalhães é escritor, nascido e criado no concreto brasiliense. Acredita que isso já diz muito mais do que gostaria sobre si mesmo. Escreve em seu site e no Facebook