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Bom dia!

Modelos pela manhã

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Uma delícia perdida no carnaval é a da contemplação. A urgência em sagrar o júbilo, a alforria das más intenções, o curto espaço de tempo em que, de repente, o que não se podia torna-se permitido. As pessoas correm e farreiam e aproveitam. É o fogo que sobe, e calor que não cessa.
Nisso, perde-se o olhar e a refrescância, vão-se as possibilidades de experimentos efervescentes. Observar e reparar e possibilitar entreolhares. É imersão mesmo. Estruturar detalhes e ir com calma, deixar as coisas chegarem, testar o ápice do sensorial. O Models in the Morning vai com a calma de quem acabou de acordar.
Há 6 meses, eu apresentava um projeto embrionário que tinha uma foto ou outra e um vídeo de apresentação que mostrava mulheres sendo fotografadas pela manhã:
O site Models in the Morning tira fotos, como o próprio nome já diz, de modelos pela manhã, com uma câmera analógica que busca mulheres com pouca roupa e maquiagem, “em seus momentos mais bonitos e vulneráveis”.
Basement Fox caiu na estrada para completar um livro de fotografia nu e filme da série, viajando a América em um trailer dos anos sessenta. Depois de um ano de preparação, é hora de embarcar em uma viagem inesquecível.
Hoje, o site tem muito mais ensaios e alguns vídeos bem bons.
Tudo aparentemente sereno, acalmado. Bom pra botar tranquilidade no dia e apurar os olhares.

Antônimos

Do camarão, tiro a cabeça, jogo na lata do lixo e aprecio o restante. 
Da manequim de passarela, tiro o corpo, jogo na lata de lixo e aprecio a cabeça.

Desfiles de moda e manequins


O mundo não tem jeito mesmo, deixa o mundo para lá. Não se preocupe em se distrair e ficar desinformado: quando o mundo chegar ao fim, com um estrondo ou uma inalação, nós saberemos. Fique descansado, ele não acaba sem você. Vamos às banalidades, portanto.

Por exemplo: o que acontece com os seios à mostra quando saem das passarelas? Em todos os desfiles de moda pelo menos metade das modelos mostra roupas transparentes em que os seios aparecem. Mas é raro encontrar alguém na, digamos, vida civil usando as mesmas roupas, ou roupas com a mesma transparência.
Os seios não aparecem na mesma proporção, quando as roupas saem das passarelas para a realidade. Ou eu é que ando frequentando a realidade errada?
Pode-se argumentar que os desfiles são representações de um ideal impossível de ser reproduzido no cotidiano.
Num desfile de modas todas as mulheres são lindas, altas e magras. São, por assim dizer, mulheres destiladas, ou a mulher como ela sonha ser — e andar, e brilhar, e vestir roupas caras. Desta maneira os seios à mostra nos desfiles também seriam idealizações. Só seriam seios reais se viessem junto com o vestido, e a mulher, usando sua transparência, automaticamente ficasse com seios de manequim.
As manequins são como aqueles desenhos nos cartões à sua frente nas poltronas dos aviões, de pessoas ajustando o colete salva-vidas, colocando as máscaras de oxigênio, assumindo a posição adequada para o caso de queda do avião, atirando-se pelo tobogã para sair do avião acidentado — enfim, em situações de emergência.
E nos cartões ninguém tem cara de quem está numa situação de emergência. Não estão exatamente sorrindo, mas suas expressões é de quem enfrenta emergências com naturalidade, até com um certa indiferença. São pessoas que seguiriam as instruções de respirar normalmente depois de colocar as máscaras de oxigênio — coisa que você e eu nunca faríamos.
As manequins são assim. Desfilam como se ser magnífica, com seios magníficos, fosse uma coisa comum. Na vida real, poucas mulheres podem usar uma roupa cara como a roupa cara merece, como manequins. Na vida real, ninguém respira normalmente com máscaras de oxigênio caindo sobre sua cabeça.

Luis Fernando Verissimo