(...) Não dos sonhos realizados, mas dos sonhos perdidos. Sonhos perdidos. Acho essa expressão sublime. Poética, lírica, poderosa. Os sonhos que me interessam são os perdidos. Não resisto à tentação de interromper a mim mesmo e falar de um quadro inspirado num outro de Edward Hopper, o grande retratista da solidão americana. O quadro se chama Boulevard of Broken Dreams. Rua dos Sonhos Perdidos. Não troco dez Monas Lisas por aquele pequeno grande quadro.
A minha tese a respeito de sonhos é: eles não existem para ser realizados. Existem apenas para ser sonhados e, depois, perdidos. O sonho realizado morre. O sonho perdido se eterniza. Contemplem, por favor, o quadro que ilustra este texto e digam se não estou certo. Os sonhos perdidos reunidos naquela lanchonete são para sempre. Nem os meteoros destruidores do filme Armageddon seriam capazes de obliterar a Rua dos Sonhos Perdidos.
E então eu olho para mim mesmo e para meus sonhos. Meu primeiro sonho sério amoroso foi, como uma vez contei, com Constanza. Outro dia, ao mexer em velhos livros, encontrei uma dedicatória de Constanza. Era um livro francamente horrível. Um tratado de semiótica. Não o li na época e jamais o lerei. Mas vou guardá-lo até o fim de meus dias, como um pequeno troféu, pela dedicatória. "Espero que você goste. Mas, tratando-se de Fabio Hernandez, nunca se sabe".
A dedicatória me devolveu à memória o rosto jovem de Constanza. E depois a reconstruiu, como um escultor meticuloso, como naquela noite de sábado em que a beijei pela primeira vez. O vestidinho azul. A camisa amarela por baixo dele. O ar ingenuamente sexy de bandeirante. E sobre os olhos mais verdes que as águas do Caribe eu prefiro nem falar.
Tive então o impulso de ir ao condomínio de prédios onde, lá para trás, se realizou o baile em que demos nosso primeiro beijo. Desci do carro e me sentei num banco diante do condomínio. Fiquei apenas olhando, e olhando, e olhando. Na verdade eu não estava ali. Eu estava a muitos anos de distância dali. Uma jovem se aproximou e perguntou, gentil e preocupada, se estava tudo bem. "Sim", respondi. "Foi só um… sonho". Ela não pareceu convencida. "Tem certeza de que está tudo bem?" Fiz que sim com a cabeça. Um dia ela também retornaria a seus sonhos perdidos.