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Temporada de bumerangues

AYRTON CENTENO
    É de impressionar a frequência com que os movimentos da campanha de José Serra – grande parte deles secundados devotadamente pela antiga mídia que lhe segue os passos – fazem uma pirueta no ar e se voltam, com igual ou maior impacto, contra a própria candidatura. É uma temporada de bumerangues.
    Foi assim com o neocarolismo assumido do candidato que passou furiosamente a beijar imagens, enrolar-se em rosários e puxar hinos com um oportunismo nunca visto em um processo eleitoral no Brasil. Ninguém estranharia se o tucano se juntasse a uma passeata de penitentes açoitando as próprias costas. Este caminho alucinado, porém, levou-o à frente de um padre no interior de Pernambuco que, esbravejando e sem se intimidar com o cardinalato tucano, acusou-o de profanador da religião. Por pouco, não se repetiu na missa a cena bíblica de Jesus Cristo expulsando a chibatadas os vendilhões do templo de Jerusalém.
    Foi assim com o desembarque da questão do aborto na eleição, subrepticiamente desovado pela escória neofascista a soldo na internet. Para, depois, aflorar na campanha oficial por obra e graça da esposa do candidato, a psicóloga Mônica Serra. Como se recorda, ela acusou Dilma Roussef de “matar criancinhas”. Não houve santo que salvasse Serra de afundar na hipocrisia quando várias ex-alunas de Monica disseram ter ouvido da professora, em aula, que ela própria fizera aborto.
    Foi assim com o brutal atentado com bolinha de papel que o deixou entre a vida e a morte. Salvou-o uma tomografia providenciada às pressas pelo ex-secretário de saúde do Rio na gestão César Factóide Maia. A desconstrução da pantomima na web levou de roldão a TV Globo que abraçou, sob vaias de seus próprios jornalistas, a versão serrista dos fatos. Serra e a Globo foram arrastados para um picadeiro virtual e transformados em motivo de chacota planetária, com os hashtags #serrarojas e #globomente escalando os píncaros no twitter nacional e internacional. Pelos e-mails disseminou-se o game “Bolinha de papel”, atraindo adultos e crianças, e que consiste em atirar uma bolinha na cabeça de Serra que se esconde atrás da bancada do Jornal Nacional. Serra e Ali Kamel, o diretor executivo de jornalismo da Globo, poderiam dormir sem essa.
    E foi assim com a história da propalada quebra dos sigilos de notáveis tucanos. O repórter Amaury Ribeiro Junior nega tal violação. De qualquer forma, seus movimentos foram realizados quando atuava no jornal O Estado de Minas – sabidamente aecista – e tiveram como objetivo proteger o ex-governador Aécio Neves, então aspirante à indicação como candidato à presidência pelo PSDB, das arapucas armadas pelo submundo serrista.
    O vazamento de trechos selecionados do depoimento de Ribeiro Jr. na Folha de São Paulo através da advogada do ex-ministro e coordenador da campanha de Serra, Eduardo Jorge Caldas Pereira, além de expor o fogo amigo entre tucanos, deixou furioso o PSDB mineiro. Mais do que isso, o foco dirigido para Ribeiro Jr. enfeixa necessariamente suas investigações.
    Como consta na abertura de seu livro a ser lançado, “Os porões da privataria”, sua garimpagem de uma década de trabalho fulmina eminências do tucanato enfiadas até o queixo nas privatizações da era FHC, várias delas com contas e empresas off-shores abertas em paraísos fiscais. E detalha as ligações perigosas de José Serra com seu clã, entre os quais sua filha Verônica e seu primo emprestado, Gregório Marin Preciado – ambos ex-sócios do próprio Serra – seu genro Alexandre Bourgeois e o ex-caixa de suas campanhas, Ricardo Sérgio de Oliveira, não por acaso diretor de operações do Banco do Brasil e mago da montagem dos consórcios de privatização e dos leilões que torraram o patrimônio público do Brasil e dos brasileiros sob FHC. Todos estão ricos.
    Ribeiro Jr. perseguiu o caminho de ida e volta dos valores movimentados pelo alto tucanato e o clã Serra entre o Brasil e as offshores e as contas paradisíacas do Caribe. Colocá-lo em foco significa enfocar também suas revelações que, cedo ou tarde, virão à tona. “Todos eles – afirma o repórter – têm o que explicar ao Brasil”. A hora da explicação parece estar chegando.

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O Brasil, o Pig e a bicicleta ergométrica

    Tempos atrás, Luis Fernando Veríssimo especulou sobre o que pensariam alienígenas que chegassem à Terra após uma hecatombe nuclear e só encontrassem, como vestígio da civilização anterior, uma bicicleta ergométrica. Quebrariam a cabeça tentando interpretar o mundo e a vida através daquele aparato com pedais que não levava a lugar algum. A metáfora pode ser transportada para o Brasil de 2010.
      Aqui, um passar de olhos pelos grandes jornais, cadeias de rádio e TV fotografa um país imerso em escândalos que pipocam como catapora e haverão de nos tragar a todos para o mais profundo dos abismos; um Estado que torra dinheiro público pilotado por um presidente rude, simplório e analfabeto, um amigo de ditadores que nos faz passar vergonha, não sabe o seu lugar e nos deslustra além-fronteiras.
      Neste país, ler os diários é um convite ao lexotan e um perigo para a saúde dos dentes, cujo rilhar nos remete ao bruxismo. Os escândalos ou subescândalos saltam já embalados de uma linha de montagem fordista: Gamecorp, dólares de Cuba, aloprados, tapiocagate, Farc, Lina Vieira, grampo no STF, estado policial, dossiê da Casa Civil, CPI do MST, compra de aviões, Petrobrás, neoaloprados etc e adquirem uma dimensão, independentemente da sua gravidade ou não, extraordinária.          
      Mas são produtos perecíveis, efêmeros na era da descartabilidade. É de sua natureza. Os mais taludos rodam uma, duas, talvez três semanas, cumprem o percurso tradicional Veja-Folha-Globo-Estadão-Rede Globo, perdem as asas e se esvaem na sua irrelevância. Veio aquele da menina Mantega – que, ao menos, teve o dom de nos iluminar os olhos por alguns instantes – para infelizmente esmaecer e murchar em um par de dias. O mais recente atende por “dossiê da Previ”. Terá seus 15 minutos de ribalta antes de ser remetido ao limbo. Logo mais um virá substituí-lo.
       Porém, há outro país ausente da mídia. Nele há progresso no campo e na cidade, perceptível nas conversas, nas estatísticas oficiais ou não, no ritmo da economia, nos levantamentos sobre produção, vendas, emprego, safras, salários, crédito, matrículas e no retorno das políticas sociais. E seu presidente rude, simplório e analfabeto ostenta maior popularidade do que qualquer outro cidadão que já sentou na cadeira que ele ora aquece. Uma popularidade confirmada em todo o mundo, forjada através de sua capacidade de diálogo e de seu carisma e de uma diplomacia sem genuflexão e com um protagonismo planetário inédito em cinco séculos.
      O primeiro dos dois países é um apocalipse mental. Conforta os 5% da população que querem ser confortados por esta ficção de horror. Resulta da amargura da mídia hegemônica da qual emana uma contrariedade que, não raro, azeda em claro rancor. É a opinião publicada que transborda dos editoriais, assalta as manchetes e infecciona o noticiário.
      Uma característica marcante da opinião publicada é lixar-se para a opinião pública. Esta, que habita o segundo país, ultimamente tem dado o troco: passou a lixar-se para a opinião publicada. E boa parte da opinião pública começa a olhar enviesado para a opinião publicada. Percebe-a como uma geringonça bizarra, deslocada no tempo e no espaço, tão útil para quem deseja se movimentar, andar para a frente e para o futuro, como uma bicicleta ergométrica.
AYRTON CENTENO

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