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O judiciário cultiva Pinheiros e destrói pinheirinhos

É assim que age o judiciário brasileiro [ com raríssimas exceções ]. Por isso que tenho convicção que ele é o mais corrupto dos poderes. Leia com atenção o texto abaixo:

Há um prédio na Marginal Pinheiros, São Paulo, que é simbólico do que ocorre no Brasil. A começar pela sua fachada, um neoclássico pastiche que junta Miami com Copacabana num pesadelo que faria Jackson do Pandeiro mudar a letra de sua mais famosa música.
A fachada não basta para metáfora. Ele tem também "penthouse" (pois é fino "penthouse"),  gigantesca, faustuosa, imponente, avistada de quase qualquer ponto da Marginal, como quem diz: "estou aqui em cima, longe de vocês, acima de vocês".
Mas ainda há mais: o prédio está embargado, sem moradores, porque a construtora ignorou solenemente as leis de construção da área e fez um prédio bem maior que o permitido (talvez até pela "penthouse"), e ele fica na rota de alguns aviões para o aeroporto de Congonhas, e põe vidas em risco.
Mesmo assim, sabendo disso, a construtora aumentou sua altura além do permitido, na base do "agora que já ta aí, deixa".
Pois bem. Se não me falha a memória, isso tem mais de década. Há mais de dez anos o prédio está lá na Marginal Pinheiros , sem morador, mas na rota da cabeceira de Congonhas, olhando para todos de cima, rindo talvez, impávido, indiferente à batalha jurídica, à chuva de recursos.
Não muito longe dali, em São José dos Campos, um bairro chamado Pinheirinho (ironias que a vida reserva), a polícia  militar cumpre um mandato de reintegração de posse num domingo de manhã, depois de uma semana de vai-e-vem de liminares, da justiça estadual ter decidido pela reintegração, a justiça federal ter concedido uma liminar impedindo-a, a estadual disse que não recebeu o comunicado, ignorou dizendo que não era de competência federal etc, etc,etc... (ah, o direito processual brasileiro e sua confusão proposital!).
A desastrada e rápida ação (que nos colocou no noticiário internacional com reportagem no Guardian, na Al Jazeera,  dentre outros) expulsou 1.900 famílias, 6.000 pessoas, que moravam no Pinheirinho, tirou os moradores de suas casas, isolou a área e as destruiu. Muitos saíram sem nada, nenhum pertence, sem documento. No corpo apenas a roupa e uma pulseirinha,  que seria útil no dia seguinte, para o cadastramento das pessoas. Apenas no dia seguinte. Até lá foram jogados em uma escola sem a menor condição de abrigá-los, sequer sanitária , onde se misturavam doentes, crianças, sujeira e excrementos.
Desabriga primeiro, destrói as casas, depois vê o que faz com as pessoas. Para onde elas vão? O que farão? "Pouco importa". Esta é a política. A questão social é esquecida, ou melhor, torna-se caso depolícia.
Independentemente do mérito da ação de reintegração de posse (princípios constitucionais, jurisdição, cautelares até o julgamento final), a ação do Executivo, rápida, célere, criou um ponto de não retorno. Não há mais bairro, não há mais casas. A prefeitura de São José dos Campos rapidamente ofereceu passagens para que os migrantes "voltassem às suas terras" (pergunto: sem mais nenhum pertence, nenhum teto... como recusar? Higienismo caridoso que é legitimado pela própria ação)
Na Marginal Pinheiros um prédio continua em pé. Lá a batalha jurídica é longa e cara, não interessa sequer que atrapalhe aviões, ponha em risco a segurança das pessoas, passageiros ou dos carros que trafegam pela marginal. Os advogados cuidam de tudo.
No Pinheirinho, o diminutivo carinhoso do Pinheiro, só há lágrimas e desespero de quem tudo perdeu.
O prédio continua rindo lá do alto, na "penthouse", impávido, agraciado de como as leis e os recursos funcionam. Não muito longe dali, no Pinheirinho, falar em leis e recursos soa como um escracho, uma piada de péssimo gosto.
Pinheiros e Pinheirinho