A batalha eleitoral em São Paulo

por Gaudêncio Torquato

Políticos e profissionais que militam na arena eleitoral conhecem a regrinha: nenhuma campanha é igual à outra. A razão aponta para o argumento do filósofo Heráclito, quando, ao observar que “tudo flui, nada persiste nem permanece o mesmo”, arrematou com o Ditado: ninguém se banha duas vezes no mesmo rio; a água, no segundo banho, é outra.

Apesar de a política ser um território árido, particularmente quando se discorre sobre a tão propalada reforma de padrões e costumes, é forçoso reconhecer que os ciclos eleitorais têm identidade própria, um ajuntamento de peculiaridades, atores físicos e jurídicos diferenciados, morfologia urbana com graves demandas, estratos eleitorais de motivações distintas, enfim, elementos influenciados pelas circunstâncias.
A tentativa de inserir esse conjunto num abrigo conceitual abrangente aponta para o que podemos designar de PSBF - Produto Social Bruto de Felicidade, índice para medir a satisfação do eleitor com a situação em que vive e que depende de coisas como dinheiro no bolso para sobreviver e satisfação com os serviços públicos, a partir de saúde, educação, transportes e segurança.
Ressalte-se a importância central da condição econômica, lembrando que a geografia do voto faz uma trajetória que começa no bolso, percorre o estômago, sobe ao coração e, por último, chega à cabeça. O percurso é fruto dos valores que influem sobre a decisão do eleitor: agradecimento por recompensas recebidas; emoção, simpatia e fervor que convergem para o engajamento na campanha do candidato; e racionalidade, régua que o eleitor usa para fazer comparações entre perfis.
Sob tais premissas, ocorrerá na capital paulista o maior pleito do país. A magnitude do evento se apresenta na expressão superlativa. Tudo aqui será maior: a densidade eleitoral, os conglomerados organizados, as classes médias, as margens sociais, as entidades de trabalhadores, as organizações não governamentais, os núcleos de profissionais liberais, as taxas emocionais e racionais.
Ao lado da grandeza dos números, uma bandeira simbólica cobrirá o campo de batalha, eis que o comandante de uma frente será o perfil de maior ícone nacional, Luiz Inácio, em tratamento contra um câncer. Exibindo a estética da convalescença, o ex-presidente avoca como questão de honra a missão de colocar na prefeitura seu pupilo Fernando Haddad, ex-ministro da Educação.
A ideia aponta para a meta finalista, que é tomar dos tucanos, em 2014, o território paulista, sonho acalentado pelo petismo.
O ex-presidente, ao pinçar o nome de Haddad, vale-se do feeling que usou para escolher Dilma, eleita com a maior votação da história sem nunca ter recebido antes um voto. Assepsia política, eis o conceito que ele parece enxergar. Obterá êxito?
Puxemos as premissas já citadas: nenhuma campanha é igual à outra; campanha municipal costuma ser diferente de campanha nacional; puxador de voto nacional pode ser bem sucedido em alguns lugares e noutros, não.
Lula já tentou amparar Marta, em São Paulo, e não obteve êxito. Em Natal, no Rio Grande do Norte, não conseguiu eleger sua candidata, a então deputada Fátima Bezerra (era questão de honra derrotar o senador José Agripino, integrante do DEM). Mas Lula pode contar, a favor de seu candidato, do fator imponderável, que baixa frequentemente no terreno da política. Pode ser que, desta feita, as coisas serão diferentes.
Pragmático, sabe que os 30% históricos do PT na capital carecem de mais uns 10% a 15% para seu candidato ganhar a eleição. A realpolitik lulista defronta-se, porém, com o “dogmatismo de esquerda” de Marta Suplicy, que se recusa a dar as mãos no palanque ao prefeito Kassab e ao seu PSD, como se fosse legitima representante do puro sangue petista. (Lembre-se que seu suplente é o vereador do PP, Antônio Carlos Rodrigues).
A par de querelas internas, que mostram um PT cindido e enciumado, o pleito serve também para reacender a fogueira que devasta a floresta tucana. Tentemos enxergar no meio da fumaça.
José Serra, a expressão de maior peso eleitoral do PSDB na capital, reanima as desesperançadas bases tucanas e pode vir a ser o candidato à prefeito, depois de refugar por muito tempo a hipótese.
E aqui, mais uma vez, as águas correntes da política emergem para fustigar pressurosos interlocutores com uma bateria de inquietações: candidato, poderá o ex-prefeito e ex-governador mergulhar no mesmo rio de 2008?
Verá acesa a tocha que lá atrás incendiou as bandas do PT e do PSDB? Será que Gabriel Chalita, do PMDB, quebrará a polarização? Apagará ou não a chama alta da rejeição a seu nome, que tem entre os motivos sua renúncia à prefeitura, em 2010, para se candidatar à presidência da República, depois de ter mostrado ao eleitor compromisso firmado em cartório de não largar o mandato de prefeito?
Responder agora é especular. Mais viável, nesse momento, é supor que tais questões serão adicionadas a outros componentes e entrarão no liquidificador eleitoral, de onde sairá o produto social bruto da felicidade, a gostosa vitamina que alimentará a decisão final do eleitor.
O que se pode garantir, ainda, é que, em se tratando de perfil de grande visibilidade e dispondo de razoável tempo de mídia eleitoral, Serra junta condições para alcançar bom desempenho.
Outros componentes pesarão sobre a competitividade dos candidatos como a organização das bases, significando militância ativa; apoio de núcleos eleitorais fechados (sob a esfera de vereadores, deputados estaduais, credos e associações de bairro); projetos bem definidos para as localidades; e engrenagens administrativas – federal, estadual e municipal – que, mesmo impedidas pela legislação de entrar no circuito eleitoral sob pena de responsabilização de agentes flagrados, dão um empurrão nos carros de uma campanha.
E, por último, a lembrança de que uma nova classe média engrossa o meio da pirâmide. Será decisiva na escolha do melhor perfil para preservar suas conquistas.

Dorinha nunca deixou de desfilar no carnaval

Crônica de Luis Fernando Verissimo
Outra carta da Dorinha
Recebo outra carta da ravissante Dora Avante. Dorinha, como se sabe, até hoje só perdeu um carnaval. Foi quando morou um ano no exterior com um milionário cujo titulo ela não se lembra (“Duque, Sultão... Sei que era nome de cachorro”) . O romance durou pouco porque ele tinha lhe jurado que era do “jet set” mas se revelou um teco-teco na cama.
Até hoje Dorinha só se refere a ele como “Le Blef”. Fora este interregno impensado, Dorinha nunca deixou de desfilar no carnaval.
Inclusive com sacrifícios pessoais, como na vez em que saiu como destaque num pedestal tão alto que ficou presa na rede elétrica e foi salva por um bombeiro chamado Eudir, com quem ela não tem certeza mas acha que se casou depois.
Ficou famosa a sua passagem triunfal na avenida como rainha da bateria, só de tapa sexo e puxando o Pitanguy pela mão, para o caso de o publico começar a gritar “O autor! O autor!” .
Por tudo isto, pode se compreender seu desalento com a possibilidade de não desfilar este ano. Sim, ela e seu grupo de pressão política e carteado, as Socialaites Socialistas, estão ameaçados de serem cortados do desfile da sua escola, porque...
Mas deixemos que a própria Dorinha nos conte. Sua carta veio, como sempre,escrita com tinta purpura em papel rosa e com aroma de “Sacanage”, um perfume recém-lançado e já banido em vários países.
“Queridíssimo. Beijos tristes e babados. Agora esta: estão preocupados com a quantidade de brancos nas escolas de samba e a solução, na nossa escola, foi adotarem um sistema de cotas! Parece que se deram conta da gravidade da situação quando descobriram que justamente este ano, quando o tema da escola é “Esplendor de um rei Nagô”, a porta-bandeira será canadense e o mestre-sala dinamarquês, e os dois aprenderam a evolução por correspondência.
Concluíram que se não fosse tomada uma resolução drástica agora em breve teríamos baterias formadas só de alemães. Como o ritmo dos desfiles fica cada vez mais marcial, nesse quesito os alemães não seriam problema. Problema seria eles não pararem na praça da Apoteose, seguirem adiante e invadirem a Polônia.
Concordamos que alguma coisa deve ser feita, mas o fato é que as cotas para brancos já foram todas preenchidas por um grupo ucraniano e não sobrou nada para as Socialaites Socialistas, vítimas de odiosa discriminação.
Pensamos em muitas maneiras de contornar a situação, todas envolvendo algum tipo de escurecimento rápido da pele, culminando com a decisão da Tatiana (“Tati”) Bitati de mergulhar em tinta nanquim. Mas temos pouco tempo. E o impensável talvez aconteça.
Este ano, a avenida pode não ver Dora Avante. Domage. Estou com seios novos, ainda não testados em publico. Assim passam as glórias, e as doras, deste mundo. Beijíssimo da tua Dorinha.”

O que se passa com o PSDB de São Paulo?

[...] Digo de outra forma: Que falta faz Mario Covas!

O confuso PSDB paulista
por Marcos Coimbra

Criado em 1988, o PSDB nasceu em São Paulo. Foi lá que um grupo de políticos da “ala do bem” do PMDB resolveu que havia limites para tudo: o começo da administração de Orestes Quércia, no ano anterior, mostrava que o partido era pequeno demais para eles e o governador.
Não querendo compactuar com o que imaginavam seria o restante de seu governo, preferiram sair. Estavam certos. Quércia foi tudo que temiam.
(Isso não impediu que, anos depois, um candidato tucano a presidente fosse cortejá-lo, obsequiosamente pedindo seu aval para outra aventura mal sucedida. Antes de falecer, em 2010, Quércia ainda teve tempo de se revelar um sincero e prestimoso aliado de José Serra).
Em São Paulo, o PSDB foi um sucesso. Mário Covas, seu candidato a presidente em 1989 - apenas um ano após a criação do partido -, ficou em quarto lugar e ganhou o respeito do país, pela campanha que fez e pela coerência de apoiar Lula no segundo turno.
(Isso não desencorajou alguns quadros tucanos paulistas a se dispor, alegremente, a integrar o ministério do adversário de Lula. Se não fosse o veto de Covas, o governo Collor teria tido, no mínimo, um tucano de alta plumagem no primeiro escalão. Convidado, havia dito sim).
Com pouco mais de cinco anos de existência, o PSDB paulista tinha feito o presidente da República, o núcleo de seu staff, vário ministros, e estava instalado no governo do maior estado da Federação. Uma trajetória espetacular.
Desde 1994, o PSDB administra São Paulo e bate todos os recordes de permanência de um partido à frente de um governo estadual – sem contar a República Velha.
Ao término do atual mandato, Alckmin completará duas décadas ininterruptas de ocupação tucana do Palácio dos Bandeirantes, coisa que nenhuma oligarquia contemporânea conseguiu em outro lugar do Brasil. Sarney e o finado Antonio Carlos Magalhães teriam muito que aprender com eles.
É verdade que, nesses 20 anos, o PSDB só governou a capital por 15 meses, na fase em que Serra fez uma rápida baldeação à frente da prefeitura - depois de perder a eleição presidencial de 2002, ganhar a municipal de 2004 e antes de renunciar para concorrer ao governo estadual em 2006.
Mas continuou representado na administração municipal, quando Kassab assumiu o lugar deixado por Serra e se reelegeu em 2008. São, portanto, oito anos de presença tucana na prefeitura.
Como entender que o PSDB paulista seja tão incapaz de definir o que vai fazer este ano na sucessão de Kassab? Justo na capital de seu reduto?
Consta que procuraram Serra para ser candidato. Ele disse que não queria – o que pode ser considerado normal em seu caso, pois nunca tem certeza de uma candidatura. Deram-lhe tempo e ele foi peremptório: não o seria em hipótese alguma.
Quatro nomes se ofereceram, todos qualificados. Era a situação clássica para uma prévia entre os filiados. Estão às voltas com ela - a primeira na história do partido -desde o ano passado e a data combinada para fazê-la se avizinha.
E agora? Ficou o dito pelo não dito. Serra fez saber que talvez queira. Os pré-candidatos estão sem saber o que fazer. E se Serra voltar a desistir – o que seria totalmente normal para ele? Aí aconteceriam as prévias? Entre quatro candidatos desmoralizados?
Uma forma de entender porque os tucanos paulistas batem cabeça é imaginar o que estaria acontecendo se Mário Covas estivesse vivo.
É difícil dizer com segurança, pois ele era imprevisível. Mas de uma coisa podemos estar certos: vexame, o PSDB paulista não estaria passando.
No estado, o partido tem hoje líderes demais e liderança de menos. Entre os solipsismos e as obsessões de seus principais quadros, o PSDB paulista não consegue dizer o que quer.



UBUNTU



Um antropólogo estudava os usos e costumes de uma tribo na África, e porque ele estava sempre rodeado pelas crianças da tribo, decidiu fazer algo divertido entre elas; Conseguiu uma boa porção de doces na cidade e colocou todos os doces dentro de um cesto decorado com fita e outros adereços, e depois deixou o cesto debaixo de uma árvore. 

Aí ele chamou as crianças
 e combinou a brincadeira, que quando ele dissesse “já”, elas deveriam correr até aquela árvore e o primeiro que agarrasse o cesto, seria o vencedor e teria o direito de comer todos os doces sozinho.

As crianças se posicionaram em linha, esperando pelo sinal combinado.

Quando ele disse “Já!”, imediatamente todas as crianças se deram as mãos e saíram correndo juntas em direção do cesto. Todas elas chegaram juntas e começaram a dividir os doces, e sentadas no chão, comeram felizes.

O antropólogo foi ao encontro delas e indignado perguntou por que elas tinham ido todas juntas, quando só uma poderia ter tido o cesto inteiro.

Foi ai que elas responderam: - “UBUNTU!!!” “Como um só de nós poderia ficar feliz se todas as outras estivessem tristes?“

UBUNTU significa: - “EU SOU, PORQUE NÓS SOMOS!” 

Blog do Charles Bakalarczyk: O que querem os policiais

Blog do Charles Bakalarczyk: O que querem os policiais: Marcos Rolim - Jornalista As greves das Polícias Militares (PMs) constituem um fato social que merece avaliação cuidadosa. Todos sabem...

Krishna x Cristo

Coincidências apenas ou algo mais?
Qual tua opinião?

Rede Globo é expulsa da Marquês de Sapucaí

Em clima tenso equipe da Rede Globo foi expulsa do Sambódromo do Rio de Janeiro. A cena é uma repetição do que ocorreu ontem à noite no Carnaval de São Paulo.

Por enquanto isso é só desejo de uma boa parcela da população brasileira. Mas, não demora muito e isto acontecerá.  Apenas, que não será o povo que vai expulsar os profissionais da empresa e sim a Rede Record que comprará o direito de transmissão do Desfile da Escolas de Samba de São Paulo e Rio de Janeiro.

Anotem.

Julgar por que? Que mania feia


Para você refletir



Lula: Senhor do carisma Pop

Para a psicanalista Tales Ab'Sáber, o ex-presidente encarna um produto midiático que pode simplesmente ser redesenhado.

por Mônica Manir

Era o X Congresso dos Metalúrgicos, 1979, Poços de Caldas, e o João Bittar ali, na porta do banheiro do hotel, na cola do Lula. Diz que o Lula saiu do banheiro e, entre irritado e desafiador, levantou a blusa: 

"Quer fotografar o meu umbigo também?" 

Estava tudo engatilhado, Bittar não pensou duas vezes. Clicou a foto mais importante da sua vida. Anos depois ele diria que, se Lula escorregasse numa casca de banana, o fotografaria do mesmo jeito. Bittar morreu em dezembro do ano passado e o ex-presidente continua surfando no próprio carisma. É hoje tema de escola de samba e articulador do PT na campanha para prefeito de São Paulo, que esquenta forte os tamborins. Continua>>>

Empreender é o negócio


A nova classe média satisfez boa parte de suas necessidades de consumo. Agora, 51% dos jovens querem ser donos de empresas
» VERA BATISTA
» GABRIEL CAPRIOLI


Luiz Henrique Bonvini, 14 anos, ainda está longe de entrar na universidade, mas já tem na ponta da língua o caminho que deseja seguir. Amante da gastronomia, faz planos de se especializar na área e ganhar muito dinheiro. No primeiro teste, ele já passou com louvor. Em parceria com os primos Laura, 13, e Vitor, 10, o jovem fabricou brigadeiros em casa para vender. O retorno foi tamanho que os três vão usar o lucro para bancar parte de uma viagem à Disney, com a família, programada para este ano. Com tino empreendedor, Luiz é o retrato fiel da nova classe média, que, depois de incluir na sua cesta de alimentos itens a que antes não tinha acesso, comprar a casa própria e eletrodomésticos e fazer as suas primeiras viagens ao exterior, será senhora quase absoluta dos micro e pequenos negócios no Brasil dentro de uma década.

Dados do Instituto Data Popular mostram que 51% dos jovens entre 18 e 35 anos da classe C querem abrir o próprio negócio. Desse total, 91% definiram que 2020 é o prazo máximo para concretizar o sonho. Não por acaso, a nova classe média — que ganhou 40 milhões de brasileiros na última década e, somente no ano passado, injetou de R$ 1,03 trilhão na economia em consumo de bens e serviços — é uma das armas mais poderosas da presidente Dilma Rousseff para aquecer a atividade econômica e proteger o país da crise que assola a Europa.

No caso de Luiz, o estímulo veio da mãe, a microempresária Ursula Bonvini, 37, que auxiliou os jovens em todos os preparativos da empreitada, desde o cálculo dos gastos com o chocolate até o transporte. "Fomos para a rua e vendemos tudo", comemora o jovem. Herdeiros da transição econômica vivida pelos pais, Luiz e os primos reconhecem que a sua realidade é bem diferente da vivida pela geração anterior. Sem desgrudar dos iPods, símbolos dessa mudança, eles querem se qualificar para fazer frente a um mercado cada vez mais competitivo. Luiz, que, além de gastronomia, quer cursar direito, também planeja ir para a Suíça com Laura para realizar um intercâmbio. "Será muito bom conhecer outras culturas, conviver com pessoas que falam outras línguas", aposta Laura.

Especialistas reconhecem que a nova classe média conquistou seu espaço após a estabilização da economia, o aumento da formalização do mercado de trabalho e o incremento na renda da população. Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil está muito próximo do que se pode chamar de pleno emprego, quando praticamente todas as pessoas que querem trabalhar estão contratadas. Em janeiro deste ano, a taxa de desocupação ficou em 5,5%, a menor para o mês desde o início da série histórica, em março de 2002. O salário médio ficou em R$ 1.672, também um recorde para o mês.

Apesar de tantos números positivos, manter esse contingente em condições tão boas é um dos desafios que o país terá que enfrentar nos próximos anos. Embora tenham se rendido ao consumo e sorvam até a última gota a possibilidade de levar para casa bens até antes impensáveis, os 56% da população ou 106,4 milhões de pessoas que estão na classe C — número quase igual ao de habitantes do México e duas vezes o da Colômbia — reconhecem que a conquista está apenas no começo. "Nós procuramos deixar claro para os nossos filhos que eles podem ter um futuro confortável, mas que é preciso batalhar", destaca Ursula.

Reformas
Na avaliação do economista José Márcio Camargo, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), uma série de fatores fez com que a classe média se tornasse tão importante para o país, mas ainda faltam reformas para que todo o seu potencial seja aproveitado. Entre elas, destaca-se uma profunda transformação no sistema público de educação, um dos principais entraves para o crescimento do país. Outro problema é a enrijecida legislação trabalhista brasileira. Um conjunto de nada menos que 2,4 mil regras compõe o emaranhado de leis na área. "São necessárias mudanças que induzam ganhos de produtividade", diz Camargo.

Para Rossano Oltramari, economista-chefe da XP Investimentos, a classe média vai transformar a economia brasileira e exigir contrapartidas, seja da iniciativa privada, seja do Estado. Uma das principais preocupações, diz ele, é garantir uma renda para a velhice. Hoje, o Brasil tem 20,5 milhões de idosos. Em 2050, eles serão 60 milhões e os problemas de agora, caso não sejam corrigidos, poderão fazer a terceira idade assistir ao colapso da Previdência Social, que amargou deficit de R$ 36,5 bilhões em 2011. "O Brasil passou, nos últimos anos, por várias fases. Tivemos um "boom" do frango, do iougurte, das passagens aéreas. O próximo será o dos produtos financeiros", afirma.

Oltramari não está isolado em sua avaliação. Economistas são unânimes em dizer que, se não começar a poupar logo, a classe média comprometerá, na velhice, a qualidade de vida conquistada com tanto suor. "A classe C tem noção diferente da elite. O foco é construir carreira do filho, abrir um negócio, comprar a casa própria. Aplicar recursos em aposentadoria exigiria reduzir o consumo imediato. Para parte dessa população, guardar esse dinheiro ainda é visto como luxo", explica Renato Meirelles, diretor do Instituto Data Popular. A antropóloga Luciana Aguiar, diretora do Instituto de Pesquisa Plano C, D e E, observa que a necessidade de comprar tanto é uma maneira de ser aceito na sociedade. "O consumo, antes de tudo, é uma forma de comunicação. É mostrar que é igual", analisa. (Colaborou Cristiane Bonfanti)