A bala de prata de Kadhafi que acertou np Ocidente ingrato e na mídia zonza
Tropas e tribos leais ao governo avançam sobre os buchas que pedem uma intervenção estrangeira
"Vemos com clareza que a preocupação fundamental dos Estados Unidos e da OTAN não é a Líbia, mas sim a onda revolucionária desatada no mundo árabe que desejam impedir a qualquer preço. É um fato irrefutável que as relações entre Estados Unidos e seus aliados da OTAN com a Líbia, nos últimos anos, eram excelentes, antes que surgisse a rebelião no Egito e na Tunísia”.
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Antes das revoltas nos países árabes, Sarkozi havia estado mais de uma vez com Khadafi, com quem assinou contratos bilionários |
E a Líbia, einh? Sumiu na poeira do terremoto nipônico. Nossa ínclita imprensa escrita, falada, televisada e internetizada, sem um grão de caráter, encontrou uma saída para muar de assunto na nova tragédia samurai.
Primeiro, porque, há três dias, conta centenas de mortos e feridos. E essa contagem macabra dá Ibope. Vende ainda mais jornais pelo elemento novo, o risco nuclear das usinas de que só agora ouvimos falar. Lembremos que nosso afetuoso Japão tem no histórico o trauma contaminante da terrível experiência atômica: as criminosas e desnecessárias bombas sobre Hiroshima e Nagasaki.
Segundo porque, com a fartura de imagens de uma tragédia injusta pela própria natureza, não se fala mais nos confrontos em que o coronel beduíno resiste “surpreendentemente”, retoma posições e, pelo que premoniza o general James Clapper, principal conselheiro militar de Barack Obama, vai ganhar essa intempestiva batalha, renascendo do caos cheio de si.
E olha que Kadhafi virou paz e amor
Bem feito. Bem que eu disse da outra vez que quando a mídia toma partido é um desastre à parte. Quando, não. Ela sempre toma partido e, em havendo petróleo e outras minas, estará sempre pautada pelos donos do mundo, eis que, petrolíferas e banqueiros são duas faces da mesma moeda sangrenta. (Até a Wikipédia, imagina, entrou na pilha e pôs no seu cadastro que a Líbia hoje está sem governo definido).
Pois veja o que arrumaram, na cauda dos sismos que abalaram Egito e Tunísia, onde, aliás, por enquanto, trocaram seis por meia dúzia. Embora as potências decadentes já tivessem se acertado com Kadhafi na intermediação da British Petroleum, seus mandantes viram na efervescência inédita que sacode até o decantado Bahrein dos sultões afrodisíacos e suntuosos, a oportunidade de livrar-se daquele que um dia foi tido e havido como o super-inimigo da pá virada.
Imbecis de pai e mãe e sabidos mais da conta (afinal guerras significam indústria bélica em alta), os senhores das armas e da mídia deram-se às mãos, e jogaram todas as fichas na ventania que parecia um tufão no deserto.
O Kadhafi do século XXI tinha se auto-enquadrado, mas continuava osso duro de roer. Com ele, as petrolíferas prospectam e exploram, mas não ficam com a parte do leão. Pior, nessa meia volta, o beduíno que aos 27 anos, como oficial teimoso, derrubou o rei servil, estava começando a entender que precisava atacar o cerne da questão: não adianta jorrar petróleo a granel, nem acolher quase dois milhões de egípcios e demais forasteiros, quando sua juventude permanece de mãos abanando, engrossando as estatísticas do desemprego, que, por lá, segundo as consultorias ocidentais, chega a 30%, isto é, um em cada três líbios está a ver navios.
E olha que desde os primórdios diz-se que tinha investido em educação, saúde e programas compensatórios – as prestações sociais e os auxílios para compra de alimentos.
O ponto de equilíbrio tribal
Naquele país tribal, o dito cujo não era bem um verdugo solitário. Filho e neto de brigões, ele tem o cheiro dos camelos e o gosto pela unidade pátria, que ali é questão sine qua non de paz interna.
Se se isolou foi por conta do vírus aromático dos podres poderes. Cercado de bajuladores, entre os quais o picareta que caiu fora do governo achando que ia se dar bem no saco de gatos adversário, o beduíno perdeu a noção da realidade e resvalou para o mito de si mesmo. Ou seja, pelo que sentia, se achava o próprio pai da pátria.
Estava tão vendido na fita que só um dos seus filhos ousava dizer-lhe as poucas e boas que precisava ouvir. Mas os puxa-sacos de plantão, principalmente os escribas chapas brancas, cuidavam de debitar a divergência a um conflito de poder entre os herdeiros necessários.
Mas até prova em contrário o país desértico dependia dele para safar-se da cobiça de sua riqueza maldita. Para o bem do seu povo, seria melhor dar continuidade ao processo de abertura reclamado pelo filho rebelde e manter o equilíbrio tribal, sua autoridade unificadora, sem a qual as primeiras vítimas foram exatamente os emigrantes das vizinhanças, que tiveram de bater em retirada, com medo do pior nas suas costas, caindo na dependência da ajuda humanitária das lágrimas de crocodilo, protagonizando uma desoladora tragédia periférica.
Buchas de canhão com asas de papel
Além disso, ao contrário do Egito, o conflito se internacionalizou com a alta do petróleo manipulada em todo o mundo, embora o óleo líbio seja quase todo destinado ao mercado europeu.
Agora, a coisa está feia. Os rebeldes ganharam armamentos e, ao contrário dos descontentes do Egito, mandaram bala a torto e a direito. Vários oficiais desertaram de olho no que parecia ser a inevitável contagem dos dias do coronel beduíno (logo no começo, dois pilotos fugiram com seus aviões para Malta) e a mídia lhes deu asas de papel, enquanto governantes irresponsáveis do tipo Nicolas Sarkozi e David Cameron puseram a boca na botija, usando os descontentes como buchas, ávidos pelo ouro negro que naquelas paragens dá que nem chuchu na serra por aqui.
O que começou com um estopim de imitação parecia uma chama invicta. Estabeleceu-se um código midiático segundo o qual os adversários eram do bem: podiam sair atirando e ocupando cidades, mas as tropas fiéis ao governo não tinham direito de dar o troco, sob pena de serem acusadas por massacres da população civil.
De imediato, os insurgentes foram colecionando vitórias maximizadas pela mídia, concentrada especialmente nas cidadelas dominadas por eles. Mustafá Abdel Jalil, serviçal que pulou a cerca ao ver a coisa preta, foi se juntar aos incensados pelo Ocidente e cantou de galo, ao ponto de dar 72 horas para Kadhafi fazer as malas.
Agora veja: esse cara serviu pianinho ao coronel durante anos a fio e só pulou a cerca ao ver que no outro lado não havia liderança, nem organizações, o que lhe permitia virar o chefe da revolta amalucada, com delírios de vitória no grito. No entanto, as petrolíferas e os governos mais dementes do Ocidente passaram a apontá-lo como a salvação da lavoura só por ter virado a casaca em cima do laço. Oh Deus, oh céus.
Nesse momento, os buchas de canhão estão orando mais de quatro vezes ao dia para ver se alguma força estrangeira vem em socorro, se a ONU manda fechar o espaço aéreo, se a Al Qaeda entra em campo com os petardos de Bin Laden para tirá-los do sufoco.
E ainda tramam a invasão da Líbia
Mas parece que os americanos, reis da cocada preta, pressentiram uma tremenda trapalhada e, como não conseguiram nada no susto; como o deslocamento de seus navios pelo Mediterrâneo não surtiu efeito, já arranjaram uma desculpa: no dia 2 de março, Hilary Clinton declamou sua dúvida atroz, o medo de que a emenda fosse pior do que o soneto, com a ascensão da Al Qaeda e a transformação da Líbia numa Somália árabe.
Como quase não se fala mais nisso no momento, estão racionando as informações sobre retomada das cidades pelos soldados, tribos e e brigadas de voluntários de Kadhafi, as “kataeb”. Admitem as fontes ocidentais que suas tropas já tomaram neste domingo a cidade petrolífera de Brega, a 220 km de Benghazi, base principal dos grupos rebelados.
Outros noticiam o início da evacuação de Ajdabiya, principal pólo de comunicação na região e última população importante antes de Benghazi. Em 24 horas, as forças de Kadafi avançaram 150 quilômetros, entre Ras Lanuf e Brega. Na capital da rebelião, segunda maior cidade do país, com um milhão de habitantes, há um clima de tensa expectativa.
Fontes locais disseram que Kadafi pode atacar primeiroa Tobruk, na fronteira com a Tunísia, para cortar as rotas de abastecimento dos grupos rebeldes e então mover-se sobre Benghazi. Se não vier socorro bélico das potências que prometeram tudo de bom aos insurgentes a rebelião acaba em 72 horas.
Por isso, neste exato momento, os chefes das potências ocidentais estão discutindo a possibilidade de invadir a Líbia, como denunciou o chanceler do Equador, Ricardo Patiño. O pretexto seria uma “crise humanitária” – isto é, o caos com a derrota dos adversários de Kadhafi. Com a intervenção estrangeira, pensa-se em matar dois coelhos de uma só cajadada: o coronel beduíno e a Al Qaeda, que apóia a insurreição, facilitando a posse mansa e pacífica das jazidas petrolíferas do país pelos invasores, tal como aconteceu no Iraque.
Para finalizar, por hoje, quero agradecer ao amigo que me enviou artigo inspiradíssimo escrito pelo octogenário Fidel Alejandro Castro Ruz. Lembra desse nome? Você pode até não gostar dele (o que não é meu caso) mas, se quiser realmente entender os acontecimentos da Líbia, tintim por tintim, vai ter que baixar a crista e dar uma lida criteriosa na análise do experiente analista cubano, recheada de informações consistentes e elucidativas.
Só com informações corretas você vai entender melhor o que acontece lá, no fundo, no fundo, por obra e graça de quem está de olho aqui.
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