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Um país nas mãos do ocaso

Entrevista da jornalista Maria Cristina Fernandes com o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos no Valor. Confira abaixo e tire suas conclusões cobre as ideias do entrevistado:

Wanderley Guilherme dos Santos tornou-se eleitor no governo Juscelino Kubitschek. Atravessou como adulto, portanto, o governo de 15 presidentes da República. Aos 82 anos de idade, o decano da ciência política no Brasil nunca assistiu a crise igual.
Vê o país imerso numa tragédia grega. Os personagens sabem que o papel desempenhado vai dar errado, mas, nem por isso, são capazes de mudá-lo. Ao contrário da tragédia grega, no entanto, o Brasil não está marcado pelo destino. Depende, mais do que nunca, do acaso para mudar o rumo da história.
Nenhum personagem da política brasileira fica em pé ante seu tirocínio. Wanderley Guilherme vê vulgaridade em todo lugar. Do vampiro da Tuiuti à intervenção no Rio, mas nada o impacienta mais do que a teimosia do PT em desqualificar uma disputa eleitoral sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Além de antidemocrática, a cegueira deliberada petista ignoraria a evidência de que a decisão será de uma maioria insatisfeita com este governo. É à clareza deste cenário que atribui o envolvimento do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na busca de um candidato improvável. Para Wanderley Guilherme, FHC tem a “lucidez desesperada” de quem sabe que vai perder e teme que as forças a serem derrotadas não se conformem com o resultado.
Casado com a ex-ministra da Cultura Ana de Holanda e muito próximo dos três filhos e três netos, Wanderley retomou, depois da colocação de dois stents no ano passado, os seminários no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp), os cáusticos artigos em seu blog (Segunda Opinião) e as pesquisas para um novo livro sobre a crise da democracia.
Não se lhe atribua o pessimismo, portanto, às contingências da idade. O pensador que previu o golpe no Brasil em livrinho de 1962 que virou um clássico (“Quem Dará o Golpe no Brasil?”, Civilização Brasileira), desta vez não se atreve a fazer prognósticos. O grau de imprevisibilidade da conjuntura política não lhe deixa dúvidas de que esta é a pior crise pela qual já passou o país.
O Brasil não se redimirá antes da eleição, mas a história não termina aí. Além de advogar a legitimidade das próximas eleições, com ou sem Lula, Wanderley Guilherme comprova sua afeição pela polêmica ao defender um plebiscito, depois da posse, para que o futuro presidente não se transforme num refém de um Congresso igualmente eleito. A seguir, a entrevista:
Valor: O senhor escreveu recentemente que uma eleição sem Lula não é uma fraude eleitoral e que a lei está a favor das expectativas dos desvalidos. O que pautará esta eleição?
Wanderley Guilherme dos Santos: Nunca me deparei com uma circunstância de crise política igual à atual. Nunca vi nada igual a isso e não apenas no Brasil. Há uma desestruturação tão grande no sistema político, uma multiplicação de centros autônomos de decisão arbitrários, que, todavia, não podem ser domesticados, ou enquadrados. Também não quer dizer que suas decisões sejam cumpridas, mas torna-se um fato a própria decisão, e não o cumprimento dela.
Valor: O senhor está falando do Judiciário?

O conto do vigário de acordo entre Lula e Fhc

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Seria bom que a esquerda oficial se curasse da atração pela direita, a que se entrega “por um corte de cetim”.
Basta um aceno de ocasião do carona FHC para sonharem com o conto de vigário de um acordo entre ele e Lula.
Personagem da mais espetacular e duradoura perseguição políitca por parte do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, Lula vai se transformando na mais desesperada alternativa dos conservadores para ultrapassar o lodaçal em que estão atolados.
Por mais que tentem, ainda não conseguiram demonstrar que Lula faz parte dessa lama e, justo por isso, os perseguidores contribuem mais do que ninguém para a consolidação da imagem de Lula.
Muito mais do que praticamente imbativel candidato à Presidência da República, em eleições normais, a Lava Jato e as Organizações Globo estão demonstrando ser Lula um dos raros homens públicos com biografia decente.
Com faro oportuno, é à sua sombra que FHC tentará se abrigar, fugindo da liquidação moral do PSDB.
FHC e o Banco Itau precisam de Lula, o que tem cacife eleitoral e moral, e que pode dispensar tanto FHC quanto ​o ​ Itau.
Só os estrategistas da esquerda oficial não percebem isso.
A Lula restará decidir se se imola a uma coalizão à direita, em nome da restauração, ou se assume a oportunidade de circunstancial falência da direita (que ela tem conseguido disfarçar) e dá um passo à frente: sem eleição e plebiscito, não há o que conversar.
O FHC talvez até tope.
Artigo do professor Wanderley Guilherme dos Santos

Wanderley Guilherme dos Santo - a moral de ontem e a política de hoje

Marcus Tullius Cícero concorreu à posição de Cônsul de Roma no ano de 64 antes de Cristo. Atribui-se a seu irmão mais novo, Quintus, a autoria de uma carta com recomendações de campanha. Em edição bilíngüe, a Universidade de Oxford republicou a Commentariolum Petitionis, em 2012, com tradução e introdução de Philip Freeman. Transcrevo o resumo de alguns de uma longa lista de conselhos.


  • De início, a trivial recomendação de construir sólida e larga base de apoio. Toda a arte da campanha consiste em identificar de quem devem ser os apoios e como conquistá-los. Desde logo, o candidato lembrará a todos a quem tenha prestado favores que chegou a oportunidade de retribuir. E que, se eleito, poderá ajudar outra vez no futuro. Prometa tudo a todo mundo, aos grupos de interesse, organizações locais, populações rurais, jovens eleitores, aconselha Quintus.
  • Aqueles com os quais nenhuma pessoa decente se associa em tempos normais contam como amigos próximos durante a campanha, se isso assegurar a vitória.
  • Eleitores odeiam a quem lhes nega promessas e perdoam com relativa facilidade um recuo posterior. Depois da campanha é possível explicar a todos que, desafortunadamente, circunstâncias além de controle surgiram, impedindo que as promessas sejam pagas. Dê esperança às pessoas; até os eleitores mais cínicos desejam acreditar em alguém. Adule a todos sem qualquer pudor – olhe os eleitores nos olhos, dê tapinhas em suas costas, diga-lhes que são muito importantes. Faça-os sentir que o mundo pode ser melhor para eles e eles se tornarão os mais devotados seguidores – pelo menos até depois das eleições, quando inevitavelmente ficarão desapontados. “Mas aí a eleição já terá sido ganha”.